Prólogo

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Mês 3 – Dia 17

O caneco bateu no tampo da mesa e um pouco da cerveja pingou na madeira. O homem alto e corpulento que bebia limpou a barba com as costas da mão, deixando o corpo relaxar na cadeira. Ao seu redor, o burburinho das conversas do bar preenchia todo o ambiente. O dono da taverna estava limpando copos atrás de um balcão de madeira, e saindo da cozinha do outro lado do salão, mulheres carregavam grandes canecos de madeira cheios de cerveja.

Sentado na mesma mesa do homem corpulento, um outro homem – mais robusto e menor do que o primeiro – virava sua cerveja de uma vez só, sorrindo satisfeito ao tirar a borda de madeira do copo dos lábios. Seu rosto estava vermelho, aquecido pelo álcool, e seus olhos dançavam pelas pessoas do ambiente.

- Eu ouvi falar que o Imperador enviou um regimento para o norte, em direção às Montanhas de Pedra. Uma missão de reconhecimento, pelo que me contaram – disse o primeiro homem, lambendo os beiços molhados.

O segundo, que parecia já estar meio alterado pela cerveja, demorou um pouco para responder:

- A tensão que antecede os períodos de guerra fazem um governador tomar decisões desesperadas. Parece que estão "recrutando" meninos de quinze anos para o Exército Imperial. O filho da minha vizinha foi levado por eles há duas semanas. A coisa está feia, Kell.

O primeiro homem, Kell, franziu o cenho, indicando sua indignação.

- Não existe nada ao norte após a muralha, essa missão de reconhecimento é besteira, o Imperador que está com medo. O Reino Norte está sendo muito pressionado pelos outros Reinos desde que a filha do Imperador do Reino Leste se casou com o filho do Imperador, mas isso não pode resultar em guerra.

Um terceiro homem, alto e loiro, com uma boa postura que fazia ele parecer um nobre, jogou o corpo sobre a mesa para aproximar-se de Kell.

- Não pode acabar em guerra? – ele falava quase com deboche – Olhe como o Reino Sul está, totalmente louco por causa do recente assassinato do Lorde Von. Essa tensão vai gerar atritos, e esses atritos vão gerar guerra.

Mês 3 – Dia 21

O regimento cavalgava da maneira mais rápida que podia, o que não era muito graças a neve. O Imperador não tinha tempo para esperar até o inverno acabar e mandou o grupo do Exército Imperial para as Montanhas de Pedra imediatamente. Eles precisavam andar depressa, pois em pouco tempo a nevasca iria impossibilitar a travessia até as altas montanhas do norte. Se eles ficassem presos naquela região, além das muralhas, onde nada humano vive, eles estariam muito encrencados. Esperar o desabrochar das flores na primavera não era uma opção, ou eles atravessavam a passagem até as Montanhas de Pedra ou morriam congelados.

O barulho monótono dos cascos dos cavalos açoitando o solo escorregadio era irritantemente repetitivo, e Jean tentava ocupar suas mentes com outras coisas, pensando em sua casa e na família que deixou para trás quando decidiu se juntar ao Exército Imperial. Suas mãos acariciavam as rédeas de seu cavalo distraidamente. Ele sabia que ainda era novo – afinal, tinha somente dezessete anos -, mas ele queria ser um soldado, queria ser lembrado por atos de bravura, por isso estava ali.

- Ah!

Um grito foi ouvido. Vinha de um ponto um pouco distante, dos cavalos que marchavam mais à frente. Jean já estava com a mão no punho da espada quando notou, no canto da sua visão, algo vindo das árvores que rodeavam a estrada.

Ao puxar a lâmina da bainha, o garoto nem ao menos teve tempo de brandi-la no ar. Um vulto negro pulou em cima dele e o derrubou de seu cavalo, que relinchava desesperadamente. Sua visão se tornou um infinito negrume e ele ouviu mais gritos. De repente, ele percebeu que um dos gemidos de dor vinha dele mesmo. E então, chorando, ele sentiu a vida ir embora de seu corpo.

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