O velório silencioso com a capela repleta de rosas. Tom chorando ao ler a carta deixada por mim, arrancando lágrimas de todos, inclusive de quem eu nunca imaginei ver chorar. Familiares, conhecidos, mas foram nossos amigos que o afastou do caixão onde eu estava, o acompanhei com o olhar e desejei poder voltar e arrancar a dor que causava em cada um. Tentei abraça-lo de novo, mas era impossível. Tentei beijá-lo no rosto pela última vez.
- Vai ficar tudo bem, você vai conseguir viver sem mim. – Conclui e parti de vez.
Os segundos finais da minha existência retornaram com os últimos dois meses, fechei os olhos e me deixei ser levada pelas minhas últimas lembranças antes desaparecer...
O Sol que entrou pela janela começou a me despertar daquele sono profundo que me embalava. Demorei até resolver abrir os olhos vagarosamente, alguma coisa estava diferente, aquele lençol vinho não me parecia familiar.
Esfreguei os olhos, que ardiam um pouco pela luz forte, que passava através da cortina e vinha diretamente no meu rosto.
Virei para o lado, tentando sair daquele foco e, antes que fechasse os olhos novamente, me deparei com um homem sem camisa na minha cama. O susto foi tamanho, que cai de costas no chão, antes de gritar assustada ao reparar que estava apenas de calcinha e sutiã. Naquele momento não tinha a menor ideia do que estava acontecendo.
- Anne, você está bem? – Questionou ao acordar assustado com o barulho.
- Tom? – Reconheci o rosto do moreno que era meu melhor amigo de infância, apesar de agora não ter mais dezesseis anos, seu semblante aparentava ter quase trinta.
- Você achou que ia ser quem? Machucou? – Debochou rindo e saiu da cama para me ajudar.
Livre do lençol, vi que ele estava só de cueca, então recuei um pouco.
- Aconteceu alguma coisa e eu não sei? – Falei, pegando uma camisa de botão, que estava jogada ao lado da cama, e a vestindo para me cobrir.
Observei rapidamente o cômodo amplo e arejado que tinha uma cama de casal enorme e uma TV na parede da frente, um guarda-roupa embutido com um espelho nas duas portas centrais e uma porta que dava no banheiro.
Assim que vi meu reflexo no espelho e notei que não tinha mais quinze anos, entendi que já haviam se passado vários anos, mas eu não me lembrava de nada do que havia me acontecido.
"Eu enlouqueci ou isso não passa de um sonho?! Um beliscão deve me acordar.", pensei logo apertando meu braço. Foi apenas um gesto infantil, que costumava fazer quando tinha um pesadelo, mas a dor me confirmou, não era um sonho.
Tentei me acalmar e processar tudo devagar, enquanto era observada. A aliança dourada na minha mão esquerda significava que eu era casada e a foto na cabeceira indicava que Tom era meu marido.