O carpete cor de creme do consultório parecia áspero demais sobre os pés de Seokjin. Suas mãos se contorciam nervosamente enquanto lembrava de sua primeira consulta há anos atrás.
"Fique à vontade, Seokjin", ela havia dito.
Sem hesitar, o menino tirou os sapatos e deitou no sofá (não divã) de couro. Não observou a reação da doutora e não se importou com ela, só queria terminar com aquilo e voltar pra casa para dormir em paz. Tinha apenas 10 anos naquela época. Novo demais para carregar um peso tão grande nas costas e velho demais para ignorar o problema até que ele se dissipasse como poeira.
Agora, uns bons anos depois, Seokjin ainda tinha a mesma urgência antes de toda consulta: falar, assentir, esperar a conclusão arrastada da mulher e voltar para casa. Enquanto sentava ali e encarava as prateleiras abarrotadas ao seu redor para criar uma ilusão de conforto, ele balançava os pés e batia as pontas dos dedos na coxa, ansioso para se livrar daquilo.
A questão das sessões é que a ansiedade se dissipava quando a consulta começava de fato. Quando a mulher abria seu caderninho com capa de couro marrom e o abrupto clique da caneta podia ser ouvido, Seokjin se sentia entrando em um campo de batalha e finalmente entendia que a ansiedade só incomodava até o problema ser encarado. Era tudo sobre a maldita antecipação. Esse processo se repetia toda semana, e toda semana ele tinha a mesma epifania.
O diálogo das consultas também era sempre o mesmo. Era uma dança na qual ambos passavam na ponta dos pés pelos assuntos mais rotineiros até chegar ao motivo pelo qual estava ali.
"Então, Seokjin... Como andam seus amigos?"
O garoto segurou a risada. Ela ainda tinha a coragem de fazer essa pergunta.
"Inexistentes, aparentemente." Respondeu, seco.
A mulher tentou mostrar compaixão, mas ela sempre falhava. Ela não entendia. Ninguém parecia entender.
"Os viu novamente?" Ela perguntou, usando os rabiscos em seu caderninho como distração.
"Não. Não os vejo há 5 anos, doutora."
"Parece-me que sim. E se recusa a acreditar que..."
"Sim, doutora."
Seokjin odiava ouvir aquela frase. Odiava sequer pensar nessa possibilidade. Como ela ousava sugerir aquilo? Ele não estava louco, ele sabia do que estava falando.
Percebendo o desconforto do menino, a mulher suavizou a voz.
"Seokjin. Isso aconteceu há 5 anos atrás. Eu sei que eram muito próximos, mas está na hora de seguir com a sua vida, não acha?"
O menino encarou o carpete creme e sentiu os olhos encherem de lágrimas novamente. Sabia que não era justo ser rude com a doutora. Não era culpa dela, estava apenas fazendo seu trabalho. Um trabalho que significava remexer nas caixas empoeiradas de lembranças que haviam sido bruscamente chutadas para um porão escuro. Ela estava sendo paga por sua mãe, paga para entendê-lo (o que na verdade só significava deixá-lo dócil). Reunindo forças, esboçou um sorriso que não convenceria nem a mais ingênua das crianças.
"É o que estou tentando fazer, doutora."
⋆
Kim Seokjin tinha 7 anos quando seu pai morreu. Nessa época, lembrava ter uma certa fascinação por lírios. Sua mãe gostava de espalhá-los pela casa antes que ele voltasse da escola, então se acostumou a sentir aquele aroma doce ao passar correndo pela porta da frente.
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somnium ⋆ 화양연화
Fanficsomnium (s.) - /ˈsom.ni.um/ 1. sonho, visão; 2. fantasia, sonhar acordado.