Quatrième Chapitre

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É impressionante como basta um segundo para mudar todos os outros. Tudo o que me resta são lembranças do que eu não deveria lembrar. Como posso eu ser o homem mais sortudo do mundo ao mesmo tempo em que sou o mais azarado? Há dias não a vejo e a espera me corrói como um câncer. Todos os dias, na volta da universidade, passo em sua casa para sempre ouvir o seu pai dizer que ela está a não se sentir bem, já me esqueço dos detalhes de sua feição. Teria sido esse apenas mais um dos incontáveis amores de primavera? Os meses se arrastam e não mais passo em sua casa, parece-me que o tempo é o meu melhor amigo.

Mais um dia de aula, conheci novas meninas e voltei à vida nas tabernas. Numa delas, aliás, fui apresentado ao ópio. Droga fascinante, penetrante e extasiante. Me esbanjo por Paris quase como se me tornasse parte dela nas noitadas.

A ressaca é rotineira, mas hoje há algo a mais, minha cabeça lateja na ausência de ópio e isso é um mau presságio. Tornaria a me dedicar integralmente aos estudos, mas nessa manhã recebi uma carta com o selo real. Ela diz que devo retornar à Rússia, estamos em guerra contra os germânicos. Bom, devo admitir que essa correspondência tem lá o seu teor dialético, afinal, não há porquê estudar economia se não existe mais um país para constituí-la.

Prontamente faço as malas e tenho um insight, o que poderia ser? Mas é claro, a Débora. Já deveria tê-la esquecido. Me sento à escrivaninha e escrevo uma carta para a mesma.

Meu amor,

Você me deu o inconcebível. Nem mil e uma cartas expressariam o que sinto por ti. Entendo que queira o seu espaço na mesma medida que entendo que talvez seja esse o certo para nós, mas quero que saiba que nunca a esquecerei pois sempre estarás viva em mim enquanto eu viver. Te amei desde o primeiro dia e a amarei até o último deles.

Com amor, Bernardo.

Ajeito minhas malas e as ponho na carruagem em frente a casa mais tarde. Há um menino vendendo maçãs ao longo da calçada e lhe dou alguns francos para que entregue a carta no determinado endereço. Ele sorri como todo bom menino e corre velozmente em direção à casa da Débora. Logo subo na carruagem e sigo em direção à velha Mãe Rússia.

Assim que a Débora recebe e lê a minha carta, corre tão velozmente quanto o menino até a minha casa, mas não mais me encontro nela. Ela senta na calçada e chora o tanto que evitou durante todos esses meses.

Multiverse : Le bonheur d'un monde qui compense la tristesse de l'autreOnde histórias criam vida. Descubra agora