Saudações sobrinho!
Tenho muitas coisas para lhe contar, mas essa é a 104ª vez que envio esse depoimento. As demais vezes foram interceptadas pela idiota da sua mãe (Se você estiver lendo isso novamente Sra. Mary, ignora o insulto, você é uma graça!). Por isso estou desmotivado, resumi em duas laudas o que inicialmente - na primeira carta - trazia doze laudas distribuídas em quatro envelopes numerados para não confundi-lo. Não tenho mais paciência para escrever tudo novamente. (Não gosto de fotocopias).
Vamos ao depoimento.
Parabéns! O escolhi para ser minha testemunha, pois me disseram que você é doente como eu - não somos doentes, é uma farsa que as pessoas inventaram sobre nós sofredores.
Irei explicar os quatro motivos pelo qual me internaram quatro vezes no hospício. Os motivos me destruíram, e não quero que façam o mesmo com você, por isso se atente a conclusão.
1º Motivo: A futilidade das pessoas normais.
Não entendia - nem suportava - por que as pessoas são tão fúteis? Depois entendi e lhe digo. As pessoas preferem bens materias a bens da alma e do coração. Preferem status e vanglória a humildade e ocultação de suas conquistas. Preferem o erótico e pornográfico a o ingênuo e quase extinto Amor verdadeiro. Preferem invejar a conquistar. Preferem copiar a criar. Por isso são insignificantes, pois tudo o que almejam é insignificante.
2º Motivo: Musica clássica de manhã no almoço e na janta. Todo o tempo.
Pesquisando descobri que nossa família tem uma obsessão em coloca nomes de compositores clássicos nos homens da família. Seu nome veio de Haydn, o meu de Mozart, do seu pai de Handel, do seu avô de Bach, do seu bisavô Bethoven - ele tinha um cachorro que se chamava Chopin.
Por isso somos obrigados há ouvir o tempo todo as sinfonias, minuettos, quartetos, tercetos e etc - e todas essas obras de artes - do nosso "padrinho" - compositor clássico na qual comungamos do mesmo nome.
É uma forma que usam para sermos controlados e manipulados.
3º Motivo: O sumiço do meu pai.
Meu pai sumiu porque cansou desse mecanismo repetitivo e torturante na qual somos submetidos. Viajou para um lugar sem essas coisas, creio eu.
4º Motivo: A loucura.
Fiquei louco, pois para onde olhava eu via Mozart, ouvia Mozart, sentia o cheiro de Mozart, ansiava ouvir Mozart, pensava em Mozart, queria Mozart.
Essa é a alienação que nos deixa em depressão Joseph meu sobrinho. Somos idealizados a sermos dessa forma, mesmo não querendo. Siga o conselho que irei te dar agora:
FUJA DESSA OPRESSÃO MANIPULADORA ENQUANTO PODE.
Não quero que internem você como me internaram. Por isso mandei junto com essa carta um peixe em um saquinho para que você entenda. É uma analogia:
Esse peixe sabe nadar e sobreviver no rio, mas dentro desse saquinho nunca saberá disso.
Até mais sobrinho!
Com amor, do seu tio Johannes.
Joseph estava assustado com todas aquelas informações e revelações. Olhou para a caixa de correios que balançava com mais frequência, já sabendo o que tinha ali.
Ao abrir viu um saco transparente, embaçado pelos fluidos de um peixinho vermelho e olhudo que ficou parado movendo suas nadadeiras e sua calda para um lado e para o outro.
"Minha vida é uma farsa! Sou como esse peixe. Cheio de potencial, mas sem oportunidades. Preciso fugir como ele disse, antes que...".
O peixe fez força para nadar e voou junto com seu saquinho opressor direto para o chão, ocasionando uma explosão. A água se espalhou sobre a calçada, o peixe ficou desesperado se debatendo a procura do oxigênio que dissolve da agua.
Joseph correu para dentro de casa. Não enxergava nada só ouvia as notas tensas da Sinfonia nº45 em fá sustenido menor (Farewell) - I. Allegro Assai de Joseph Haydn vindo do quarto de sua mãe. "Minha mãe acordou. Merda, vamos logo Joseph".
Foi até o saguão pegou um balde, encheu até a metade com água. Voltou correndo para a calçada. O peixe estava parado.
- NÃOOOO! - gritou apavorado pegando o peixe pelo o rabo e o jogando no balde.
Ele ameaçou boiar, mas com muito mérito começou a nadar pelas extremidades do balde.
- Ufa! - disse com um falsete desafinado. - Agora vou fugir não perderei mais tempo. Vamos procurar nosso rio Peixinho.
- Claro! Não aguento mais esses sacos, e nem esse balde.
- Você precisa de um nome. Hum... Vejamos... Brahms!
E lá se foi Joseph com seu casaco demoletom-azul, pantufas peludas e o balde com o seu peixe feliz, oBrahms.
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Joseph e o Peixe
Short StoryAtravés da correspondência do seu tio Johannes, Joseph descobre a verdade sobre tradição estranha da sua família. A tradição que tanto o oprime e o deixa depressivo. Mas além disso, Joseph possui um dom - ou uma loucura - que o permite ouvir a voz...