Escutando aquelas inesperadas palavras que o chamavam para a mesma posição emque ele tinha colocado as quatro moças, Augusto voltou-se de repente e viu no fundo dagruta a interessante Moreninha, que enchia o copo de prata.
- Minha senhora!... balbuciou o estudante, confuso.
D. Carolina respondeu-lhe primeiro com o seu costumado sorriso, e depois assim:
- Não se dirá que um homem zombou impunemente de quatro senhoras; uma outratoma o cuidado de vingá-las. Sr. estudante, eu também sou adepta ao culto desta fada e vouinvocá-la em meu auxílio.
A menina travessa bebeu em seguida a estas palavras o seu copo d'água e depois,imitando o estilo de Augusto, que se achava junto dela, disse:- Quereis que vos fale do passado, do presente ou do futuro?
- De todas essas épocas... ao menos para ouvir por mais tempo os vaticínios e palavras de tão amável Sibila.
- Pois então principiemos pelo passado. Oh! que belas revelações me fez a fada!Sim, eu estou lendo no livro da vossa vida, estou vendo tudo, estou dentro do vosso espíritoe de vosso coração!
- Oh! sim, eu juro que isso é verdade, atalhou o estudante.
A menina fingiu não entender a alusão e continuou:
- Senhor, vós amastes muito cedo... creio... sim, foi de idade de treze anos.
Augusto recuou um passo; ela prosseguiu:
- Amastes, sim, a uma menina de sete anos, com quem brincastes à borda do mar.
- E quem era ela? como se chamava? perguntou Augusto com fogo, talvez pensandoque D. Carolina estava, com efeito, adivinhando e podia dizer-lhe o que ele mesmoignorava.
- Posso eu sabê-lo? respondeu a Moreninha; a fada só me diz o que se passou emvosso coração e vós, por certo, que também não sabeis quem era essa menina e só aconheceis pelo nome de minha mulher.
- Prossiga, minha senhora!
- Poderia eu contar-vos uma longa história de velho moribundo, esmeralda,camafeu, mas basta de vossa mulher; permiti que vos diga que mostrava ser uma criançadoidinha, que cedo começava a fazer loucuras.
- Que cruel juízo!
- Oh! não vos agasteis; eu a respeito também, em atenção a vós, porém, vamosacabar com o vosso passado. Houve um tempo em que quisestes figurar entre os amigoscomo galanteador de damas, e por justo e bem merecido castigo fostes desgraçado: todaselas zombaram de vós!E a menina interrompeu-se, para rir-se da cara que fazia Augusto.
- Ora, por esta não esperava eu, disse o estudante.
- A primeira jovem que reqüestastes foi uma moreninha de dezesseis anos, quejurou-vos gratidão e ternura, e casou-se oito dias depois com um velho de sessenta anos!não foi assim?
E a menina, de novo, desatou a rir.
- Minha senhora, de que gosta tanto?
- Ora! é que a fada está-me dizendo que ainda em cima vossos amigos, quandosouberam de tal, deram-vos uma roda de cacholetas!
- Então a Sra. D. Ana lhe contou tudo isso?
- Juro-vos, senhor, que minha avó não me fala em semelhantes objetos. Consentique eu continue. A segunda foi uma jovem coradinha, a quem em uma noite ouvistes dizernum baile que éreis um pobre menino com quem ela se divertia nas horas vagas, não foiassim?
- Prossiga, minha senhora.
- A terceira foi uma moça pálida, que zombou solenemente, tanto de um primo quetinha, como de vós. Eis alguns de vossos principais galanteios. Exasperado com o infelizresultado deles e vivamente tocado das leras e da música de certo lundu que se vos cantou,tomastes outro partido e desde então vós pretendeis fazer-vos passar por borboleta de amor.
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A Moreninha (JOAQUIM MANUEL DE MACEDO)
عاطفيةUma história de Joaquim Manuel de Macedo com 23 capítulos mais o Epílogo. Augusto é um namorador incorrigível. Até que conhece Carolina, a Moreninha. A partir daí, o rapaz é seduzido pelo encanto da moça e, pela primeira vez, descobre o real signif...