Capítulo 2 - Medo

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Tudo estava silencioso quando cheguei em casa. Minha mãe estava sentada no sofá, mas seus olhos não se moveram quando abri a porta e um arrepio subiu por minha espinha quando entendi que ela estava me esperando.

– Você deve achar mesmo que sou muito ingênua, não é?

Sua voz não estava alterada, estava acusadora. O choque percorreu minhas veias, mas tentei parecer calma.

– Do que você está falando?

Ela cerrou os punhos e manteve sua voz ameaçadora.

– Você realmente achou que eu não ficaria sabendo de mais uma das suas tentativas patéticas de ser cantora? Eles transmitiram o evento ao vivo na televisão!

Agora minha mãe estava gritando.

– Mãe...

– Onde você pensa que vai parar? Você sabe muito bem que as cantoras que dão certo são as que transam com os famosos. É isso que você quer ser? Uma vadia? Isso se você der certo. Porque é isso ou morrer de fome!

Ela me seguiu até o quarto enquanto esbravejava ofensas sem filtro algum. Queria me trancar no armário, e tampar os ouvidos como fazia quando era criança e não queria ouvir as discussões dos meus pais.

– Posso até ver você daqui a alguns anos morando numa quitinete, contando moedas para comer, sendo uma assalariada fracassada, gorda e sem marido. Porque é exatamente isso que vai acontecer se você não parar com isso!

Funguei tentando segurar o choro.

– Helena, se você não desistir dessa merda de sonho, juro que vou quebrar aquele violão e você vai ficar de castigo até terminar a faculdade!

Eu chorava caminhando pelo quarto arrumando qualquer coisa que parecesse fora do lugar. Ao ouvir isso, meu corpo congelou.

– Você não pode fazer isso. Não sou mais criança. – consegui dizer.

– Então, pare de agir como uma! Encontre uma profissão de verdade. Você não tem mais doze anos para ficar sonhando essas coisas. – ela arfou por dois segundos antes de me dar o golpe final. – Nunca pensei que fosse ter uma filha que me desse tanto desgosto. Você é igualzinha ao seu pai!

Seus olhos refletiam nojo. Eu era o fracasso do seu projeto perfeito de como sua filha deveria ser.

Ela me olhou de cima abaixo antes de sair do quarto. Corri para o banheiro e desmoronei no chuveiro. Meus pesadelos estavam ali, estavam vivos. A voz ecoando meu fracasso em minha mente.

Achava que tudo tinha acabado, mas enquanto eu fazia nosso jantar na cozinha ela me fitava. Não conseguia encará-la, então a ignorei. Mas não é assim que funciona com a Doutora Luísa.

– Você precisa crescer! – ela berrou em um momento. – Pare de achar que vive num conto de fadas e que tudo é fácil. Pare de achar que você vai acordar e puff! Todos esses seus sonhos ridículos se tornarão realidade, porque adivinha? Não vão!

– Ah, é? – eu tinha que responder aquilo. – Não foi isso que os produtores disseram hoje à tarde. Eu tenho talento! Você só tem medo porque não sou como você. Eu sou uma artista. E sou boa nisso.

– Tão boa que nunca conseguiu um contrato. – Aquela punhalada era baixa demais, até para ela. – Não importa quantos testes você faça. Você só é mais uma menina gorda que sonha em ser famosa.

Devaneios de uma famosa em apurosOnde histórias criam vida. Descubra agora