Prólogo

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"Are you insane like me? (Você é louco como eu?)
Been in pain like me? (Esteve sofrendo como eu?)
Bought a hundred dollar bottle of champagne like me? (Comprou uma garrafa de champanhe de cem dólares como eu?)"

Eu aumento meu fone de ouvido no volume máximo. O suficiente para não ouvir o som exterior. Que tipo de pessoa cria uma playlist com músicas tristes para se sentir ainda pior? Bem, eu crio. No mundo há diversos tipos de dor. Dores inimagináveis que causam todo tipo de tristeza, angústia e sofrimento. Mas garanto que, no momento, nenhuma poderia se comparar a minha intensa dor de cabeça. Eu afundo na cadeira escondendo minhas mãos nos bolsos do largo moletom que roubei de Ethan.

Estou tão farta de pensar em coisas que não deveria, mas meu cérebro me trai arrastando-me de volta a tudo que eu quero esquecer. Estou triste e inconsolável na mesa mais escondida que pude encontrar nos fundos da cafeteria que fica a três quadras do meu apartamento. Eu quero ficar sozinha. Eu estou cansada das tentativas falhas dos meus amigos em tentar me animar.

Sabe aquela sensação, quando você está em uma sala cheia de gente, mas ainda assim se sente sozinho? Eu não sei bem o que estou sentindo, mas sei que não é bom. Eu acabo de descobrir que há maneiras diferentes de morrer. Meu corpo respira, meu coração continua batendo. Mas eu não me sinto viva. Eu deveria ser forte, deveria ter aprendido a lidar com isso. Afinal, não é a primeira vez. E pelo visto também não será a última, visto que eu tenho um dedo torto para o amor.

Mas eu simplesmente não consigo lidar com meu sofrimento. A ironia da dor é que você deseja e anseia ser consolado por quem o feriu. Você cria expectativas e espera por algo que sabe que não vai acontecer, exatamente como estou fazendo agora.

Na noite em que deixei Christian, Kate apareceu como minha fiel escudeira e me resgatou da humilhação em massa que eu passara. Desde então, tenho sobrevivido durante três dias sem nenhum sinal dele. Eu sei que preciso acordar e seguir com a minha vida, porém meu ânimo e força de vontade ainda não são o suficiente. E enquanto estou literalmente no fundo do poço, Christian não fez nenhuma questão de entender minha partida ou sequer tentou me procurar.

Eu respiro fundo e o ar não consegue preencher o vazio em meu peito. Um vazio que está presente junto a lembrança dolorosa e oca da minha perda. Devo ressaltar que olhar para o anel que parece ainda mais reluzente em meu dedo não ajuda muito. Eu juro com todas as minhas forças que já tentei tira-lo, mas a cada vez que o faço minhas lágrimas me interrompem. É apenas mais um feito para a minha coleção de decepções amorosas, é o que eu tento me fazer acreditar, mas no fundo acredito que muita coisa ainda pode acontecer.

Forço minha garganta a engolir o gosto amargo de café quente e recém moído, torturando meu paladar. Eu odeio café! Só eu sou psicopata o suficiente para me torturar com música triste e algo que eu não gosto. Eu olho as pessoas através do vidro da janela, seguindo suas vidas normalmente. Algumas me notam distraidamente, outras nem reparam minha presença. Só mais um dia comum em Seattle.

— Olá, Steele, — um ser sorridente e animado se joga na cadeira ao meu lado, me fazendo perceber que a música acabara. — você parece péssima. — sem vontade alguma, eu ergo o olhar.

— Eu disse que você podia sentar aí? — arqueio uma das sobrancelhas, ao perceber quem é o ser. Richard Dawkins. Rich fazia faculdade de literatura comigo, eu não o vejo desde a nossa formatura.

— Não, e foi exatamente por isso que eu sentei. — aumenta seu sorriso impecável, me fazendo suspirar profundamente. — Mas o que está te chateando?

— Além de você? Minha vida. — me afundo ainda mais em minha cadeira.

— É, a vida é uma droga para algumas pessoas. — diz mais pra si mesmo do que pra mim e por um momento eu questiono a necessidade de sua existência.

— Por que exatamente você esta falando comigo? — pergunto sem me importar realmente com sua resposta, torturando minha garganta outra vez com um novo gole de café enquanto ele observa o próprio reflexo na tela de seu celular.

— É que eu estou feliz. — olho-o transparecendo toda a minha falta de interesse. — Você não vai perguntar o por que?

— Eu não quero saber.

— Eu vou fazer parte de um programa de Traineer Literário Europeu. — ele continua empolgado, ignorando meu descaso evidente.

— Que legal. — sorrio sem mostrar os dentes, esperando que seja o suficiente para que ele vá embora.

— Eu vou pra Paris no fim de semana. — continua e eu tenho uma súbita vontade de arrancar meus ouvidos e enfia-los no copo de café quente.

— Que bom pra você. — digo sem emoção, quando meus olhos são atraídos como ímãs novamente para o anel que pesa o dobro em minha mão.

— Vou ficar dois anos por lá, e sabe o melhor? — pergunta esfregando as mãos em um claro sinal de animação.

— Não, eu não sei. — respondo em tom de obviedade, obrigando minha atenção a sair da joia.

— Eles me pediram uma indicação. — olho-o sem entender, então ele continua: — Você está trabalhando?

— Não...

— Então o que acha? — arqueia uma de suas sobrancelhas escuras, roubando o copo de café da minha mão e tomando um gole. Richard tem cabelos escuros, olhos negros e uma postura natural de 'bad boy'. Ele seria até bonito, se não fosse tão desagradável.

— Espera... — penso em reclamar mas logo o peso de suas palavras me atinge. — Você quer me indicar?

— É o que parece.

— Por que? — pergunto suspeitosamente enquanto ele sorri como se fosse o senhor incrível .

— Porque eu não iria indicar ninguém mesmo, e parece que você estar aqui hoje e agora foi obra do destino. Você tem a mesma faculdade que eu, e é exatamente isso o que eles estão procurando. Então, hoje é seu dia de sorte, Steele. — dá de ombros tomando mais um pouco do meu café.

— Isso é sério? — digo calmamente, e eu tenho quase certeza que estou encarando-o como se fosse algum tipo de aberração. E eu espero que as aberrações não se sintam ofendidas.

— Dois anos em Paris, mademoiselle. — ele força a voz em um péssimo sotaque francês.

— Tem certeza de que você não está me zoando? — um sorriso de escárnio se abre em meu rosto, mas um pingo do que eu acho ser felicidade se espalha dentro de mim. Meu cérebro trabalha em frações de segundos. Se ele estiver falando sério, essa pode ser a chance da minha vida. Mas se ele não estiver eu posso aguentar alguns anos de cadeia por assassinato, não posso?

— Por incrível que pareça, não. Eu gostaria, mas não. — balança a cabeça parecendo realmente chateado com o fato de não ser zoação. — Só tem um porém.

— Por que eu não estou surpresa? — suspiro me preparando mentalmente para receber a bomba que provavelmente vai estragar meus sonhos. — Diga.

— Eu preciso indicar alguém até as seis da tarde de hoje, então preciso de uma resposta sua agora. Nesse exato momento. — me olha esperando minha reação e flashes de tudo que aconteceu comigo até aqui passam pela minha cabeça.

"Eu olhei para Christian, e vi a fúria mal contida em seus olhos. Eu poderia jurar que ele estava a beira de um surto.

Então é isso? Agora você quer a porra de um filho? Quer a merda de um casamento também? É isso que você quer?
Eu respirei fundo e enxuguei meu rosto com o dorso da mão afastando as lágrimas.

Não, Christian, eu só quero deixar tudo pra trás, esquecer. — falei com amargura, e a tristeza crescia em meu peito. — Tudo isso foi um grande erro."

— E então? — a voz de Richard me traz de volta a realidade.

Eu direciono meu olhar a ele, certa do que devo fazer.

Cinquenta Tons Mais Escuros - INEVITÁVELOnde histórias criam vida. Descubra agora