Eliza

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Flávio me parecia tão criança as vezes, que mal tinha em me facilitar as coisas? Gostaria que ele entendesse isso ao menos uma vez. Argh!
Enfim, se ele quer que seja assim, então que seja. Não me interessa essas babaquices que ele faz.
A semana parece me passar depressa e não consigo bolar nada para ganhar o dinheiro extra. O trabalho se torna mais exaustivo a cada dia já que mais e mais empresas querem divulgações.
_Ei Eliza? Que tal almoço hoje? Por minha conta. – Jonas estava parado na minha frente, e foi ele quem me atraiu para a realidade: a droga do meu emprego.
_Ele tá nadando em dinheiro.- rebelou Silvia aparecendo ao seu lado. – Alguém ganhou o bônus de natal.

-Sério? Não acredito nisso. – digo incrédula.

_ Sim, mas vamos logo que eu já tô azul de fome.

_Na verdade muita gente já ganhou o bônus, ganharam ao longo da semana, e além do mais, faltam só dois dias para o natal.
_ Como você ganhou? – pergunto após uma garfada do meu almoço.
_ Ah, teve um jantar que eu participei. – responde e toma um gole de seu refrigerante. – na verdade todo a ano participo. Achei até que você estaria lá. Seu namorado tava.
_ espera, O jantar do centro comunitário? – pergunta Silvia que até então comia em silêncio.
_ Sim, por quê?
_ Droga! – Solto o garfo com força sobre o prato. – eu deveria ter sido mais esperta. Perdi meu bônus por causa daquele jantar.
_ Como assim? – indaga Jonas.
_ Nada não, Jo. Eu tô sem fome. Mas obrigada pelo almoço. – já me ponho de pé recolhendo minha bolsa.
_ Você já vai? – é Silvia quem  me segura.
_ Já. Vou no centro comprar algo. Não fiz minhas compras de natal ainda, e preciso bolar algo rápido se quiser uma grana extra.

☃☃☃

Depois de andar em tantas lojas eu já  carregava várias sacolas, por sorte deixaria todas no carro e voltaria logo para o trabalho. Caminho distraída quando um garoto desgovernado passa em disparada na minha frente levando-me a cair de cara na neve espessa.
_ Hey, seu moleque, olhe por onde anda. – esbravejo erguendo-me do chão frio.
_ Perdão. Não quis machucar a senhora, eu só estou atrasado. Desculpe. – um olhar sereno estava sobre mim. – a senhora está bem?
_ Claro que não garoto. Você me derruba, espalha todas as minhas sacolas na rua e espera que eu esteja bem? – Minha voz exalava irritação e sarcasmo.
_ Desculpa – repetiu o menino. – eu pego tudo, juro.
Embora estivesse irritada com a criança a sua frente, fiquei paralisada ao vê-lo juntar minhas sacolas, uma a uma, colocava-as no braço e sobre sua perna inerte na cadeira de rodas.
_ Calma, falta só mais essa...- ele se esticou ao máximo e conseguiu puxar a última sacola, mas derrubou o que tinha dentro. – ai. Espero que não seja de quebrar. – sua cadeira prendeu em um monte de neve acumulada na calçada mas conseguiu pegar a caixa pequena que havia caído.
_ O.K. Tudo bem. Obrigada. Vê se para de andar feito doido na rua menino. – Peguei rapidamente meus pertences da mão dele e virei-me de costas. – ah, e não me chame de senhora.
_Moça, espera. – a voz dele era alegre e terna.
_ O que é? – me voltei em sua direção abruptamente, ele estava com um panfleto estendido para mim.
_ Se puder, vai ver nossa apresentação na véspera de natal. Vão ter várias apresentações dança, teatro, coral. Eu vou dançar, aliás, prazer, Pedro.
_ Ah tá. Valeu, mas não tenho tempo pra essas coisas.

☃☃☃

A véspera de natal havia chegado, e eu não tinha nenhuma companhia para a noite. Meu namorado não dava as caras fazia dias, minha família morava longe demais para viajar em cima da hora, e todas as minhas amigas estavam viajando. A ceia seria macarrão instantâneo e sorvete, pois não estava com o menor ânimo para fazer comida, embora a geladeira estivesse lotada de material para uma avantajada ceia natalina.
Olhei de relance para o meu criado mudo e vi o panfleto do garotinho que me derrubara outro dia. "Seria melhor ver várias crianças órfãs cantando do que ficar em casa sozinha."
Após tomar um banho quente demorado, me visto e pego meu casaco, as chaves do carro e a bolsa. Saio para o local indicado no papel, por sorte, ou azar, sabia exatamente onde seria a apresentação, uma semana atrás tinha estado no mesmo lugar, ao ver onde era penso seriamente em dar meia volta com o carro e ir para casa, mas desisto da ideia.
Resolvo parar em uma panificadora e comprar um bolo, não sei porque tinha feito aquilo, na verdade, acho que estou agindo por impulso. Aqui estou eu novamente, no Centro Comunitário, de onde estava pode ouvir uma euforia vinda de dentro do recinto, e também muitos aplausos. Provavelmente acabaram de apresentar algo, tomou coragem e saiu do carro, pegou o bolo no banco de trás e foi para porta da frente.
O ambiente estava lindo e aconchegante, isso me fez lembrar de casa, das festas de quando era apenas uma menininha banguela. Caminho discretamente até uma mesa lateral onde tem uns doces e entrego o bolo para uma moça que estava trabalhando voluntariamente. Passava um pouco da vinte e uma horas quando uma nova parte da peça apresentada terminou. Mais aplausos e gritinhos de alegria e incentivo.
Eu o avistei do outro lado da sala, Flávio, ele estava com um sorriso magnífico. Ele também me viu e veio em minha direção. Não queria falar com ele, não queria brigar. E provavelmente era isso que aconteceria.
_ Oi, Liz. – ele me cumprimenta
_ Oi. – respondo em tom ríspido.
_ Então resolveu deixar o orgulho de lado?
_ Escuta aqui, Flávio. – eu falava entredentes e o mais baixo que minha raiva permitia. – você some do nada, não atende minhas ligações e em as retorna e agora vem falar que EU sou orgulhosa? Ah, faça-me o favor.
_ Eliza você é tão meiga e tão grossa que isso chega a me assustar. Enfim, faça bom proveito da noite, todos são bem vindos. Você vai adorar a dança. – ao terminar de falar isso ele se virou e voltou para seu lugar tão rápido quanto havia chego até mim.
_ Babaca. – murmuro em resposta.
Nas mesas eram servidos bebidas e petiscos. Houve mais apresentações, coral, peça, uma jovem tocando violoncelo, o que de fato me emocionou, a música era linda.
_O auge da nossa noite chegou. Nossa última apresentação antes da meia noite. - avisou o interlocutor.
Era a dança.
Crianças e jovens deficientes físicos entraram e se posicionaram no centro do salão. O tal garoto, Pedro, estava lá. Ele deu uma piscadela para mim e então a música começou a tocar.
Estava perdidamente encantada, como era possível se ver algo tão magnífico assim? Essas crianças não tinham ninguém na vida, e eram esquecidas por Deus. E mesmo assim estavam ali, perfeitamente coreografadas, dançando por todo o salão, com sorrisos tão grandes e olhares brilhantes que contagiava o lugar.
Lágrimas brotaram no canto dos meus olhos, ao término da apresentação, todos se postaram de pé e aplaudiram fervorosamente. Pedro guiou sua cadeira até ficar na minha frente, mesmo não sabendo meu nome, ou quem eu sou, estava feliz em me encontrar alí.
_ A senhora veio. – seu sorriso era contagiante. – quer dizer, você.
_ Sim, meu Deus, vocês foram lindos, você foi lindo, Pedro. Desculpe pela forma que te tratei outro dia.
_ Você realmente gostou?
_ Sim, muito. – sem que nenhum de nós esperasse eu o abraçei forte.
Flávio observava ao longe aquele momento de carícias.
_ Fico feliz de que tenha gostado. – Pedro afastou-se um pouco para olhar diretamente em meus olhos. – você é muito linda, sabia? Seu namorado tem muita sorte.
Antes que eu pudesse falar qualquer coisa, um grupo de crianças apareceu e arrastou Pedro para longe. Foi aí que vi Flávio vindo em minha direção, e saio em disparada para encontra-lo.
_ Você entendeu o que é o natal não é mesmo?
_ Sim. Desculpe. Natal não são só boas ações, ou presentes, ou uma ceia grandiosa. São pessoas. Pessoas comuns, unidas num só gesto. É tão lindo. Desculpa ter tratado você tão mal e dizer que isto...- aponto para o ambiente a nossa volta. – é besteira, por que não é, nem de longe.
Ele me agarrou ali mesmo, na frente de todos, seu beijo era ardente, apaixonado, intenso.
_ Finalmente você entendeu.
_ Eu te amo, Flávio. – digo ao beijá-lo novamente.
_ Eu também te amo, mesmo você sendo tão cabeça dura.
_ Hey... eu já estou melhorando. – falo em tom de protesto.
_ Está mesmo. E eu adoro isso. Você mudar por você. Aquele vindo em nossa direção não é seu chefe?
_ Ai meu Deus. Sim. – a inquietação toma conta sem nem mesmo que eu permitisse.
_ Eliza. – era um homem alto, seus cabelos grisalhos estavam perfeitamente penteados.
_ Oi, chefe. – respondo.
_ Ah, deixe disso, não estamos no escritório. Bernardo. – ele esticou a mão para ambos e se dirigiu novamente a mim – Você fez uma boa ação de natal pelo visto.
_ Como? Eu não fiz, não senhor. – ela parecia confusa.
_ Claro que fez, para você mesma. Você entendeu o verdadeiro espírito de Natal.
_ Isso quer dizer que eu ganho o bônus? – pergunto atônita.
_ Na verdade não. Você tinha só até as dezoito horas para isso. Já passam das...- ele olhou para o relógio no pulso. – onze e meia. Sinto muito.
_ Não tem importância, eu acho. – foi Flávio quem falou olhando em minha direção.
_ Não, não tem. Boa noite senhor Bernardo.
_ Boa noite, Eliza, feliz natal.
_Para o senhor também.
Nós nos afastamos​ do homem e fomos para o estacionamento.
_ Sinto muito por não ganhar o bônus, amor.
_ É, eu também, mas sabe de uma coisa? Não estou com raiva ou chateada, estou bem.
_ Bem, eu posso te recompensar com outra coisa?
_ O que? –  o encaro sem entender nada, até ele lhe lançar aquele olhar.
Quinze minutos depois eles estávamos a sós na minha casa. A iluminação fraca era só o que precisávamos.
Jogo Flávio no sofá e subo em cima dele, beijou-o arduamente enquanto ele começa a despir-me, primeiro a blusa, depois o sutiã, e pouco a pouco já estávamos sem nada, e o calor de nossos corpos esquentavam a noite.

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Este é o terceiro e último capítulo do meu conto. Espero que tenham gostado, não se esqueçam de Votar  e Comentar.
Grata a todos que leram e peço que leiam também as histórias de LarahRodrigues::: Incertezas do Amor; Noite de Luar e De Repente Princesa

Grata a LadyCheck que me deu todo apoio para escrever e publicar. <3

Maldito Bônus NatalOnde histórias criam vida. Descubra agora