1ª História - O dia em que eu nasci

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Antes de começar, imaginemos uma música tocando ao fundo. Pode ser aquelas músicas de abertura de filme dramático como Forrest Gump ou de um comercial fofinho que você viu na TV. Caso não tenha assistido, deixe sua mente reproduzir o primeiro som que vier na cabeça, pois precisaremos de imaginação para concluir esta história.

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Apesar de escrever bastante coisa sobre mim, eu não lembro nada ou quase nada do dia em que nasci. Minha mãe tem uma mania de sempre me falar sobre esse dia nos "encontros de família'' que geralmente acontecem apenas entre nós dois. Mas levando em consideração fato de eu ter uma imaginação fértil demais, juntei todas as histórias que ela me contou e imaginei o dia do meu nascimento de uma forma na qual vou tentar ilustrar pra você. Só posso adiantar que se você me conhece ou ainda vai me conhecer pessoalmente um dia, não se assuste se eu nunca ou quase nunca chorar.

Segundo o que li na internet, em 1993 acontecia algumas coisas ao redor do mundo, como um Explosão nuclear numa fábrica de produtos químicos na cidade siberiana de Tomsk (Rússia) em 6 de abril, a jamaicana Lisa Hanna foi eleita Miss Mundo em 27 de novembro e aos 44 anos, morre Pablo Emilio Escobar Gaviria, em 2 de dezembro. A lista é enorme e eu jamais encontraria meu nascimento nas páginas dos sites em que pesquisei. Mas como eu costumo repetir, o dia 10 de setembro de 1993 tornou-se uma data bastante importante para a humanidade. O motivo já foi citado com mais detalhes em outro texto, mas você consegue adivinhar que trata-se do dia em que eu nasci. O que tem de importante nisso? Vou responder pedindo para que olhe para toda a sua história e faça uma análise de quantas pessoas precisou conhecer até chegar onde está hoje e quantos momentos viveu com inúmeras pessoas que por um certo motivo vieram ao mundo. Isso quer dizer que cada ser humano traz consigo a importância na vida de outra pessoa, assim como para o resto da humanidade. Logo, consideramos que meu nascimento foi essencial para o nascimento de outras coisas e futuramente, de outras pessoas descendentes de mim. É como um ciclo vicioso.

Minha mãe diz que pra ela, o dia anterior ao meu nascimento foi tão importante quanto ao próprio. Ela teria chegado durante a tarde ao hospital onde passara um pouco mais de 24 horas até dar a luz através de uma cesariana. Posso imaginar sua ansiedade, como qualquer outra mãe prestes a dar a luz. Imagino também que ficara numa sala de paredes de cor azulada que refletia a cor em toda matéria viva ali por perto. As enfermeiras que auxiliavam no processo estariam nervosas ou agitadas com alguma coisa que ocorria no dia. Passavam rapidamente pelos corredores fazendo gestos obscenos e deixando as coisas cair. Parecia uma discussão sobre algo sério. Mamãe, deitada numa cama, observava pelo canto do olho aquela cena que se repetia e a deixava confusa.

Meu pai não cabia em si, pois era seu primeiro filho. Ainda mais sendo um menino que ele tanto quis. Posso falar aqui dos sonhos dele pra mim que já tivera planejado antes mesmo de eu nascer. O principal deles era de me ver fardado como militar do Exército Brasileiro, coisa que se realizou depois que completei meus 18 anos. Inclusive, hoje com 23 eu escrevo este texto na seção onde trabalho num quartel de Recife. O segundo sonho seria me ver num relacionamento. Acho que ele já previa que eu seria o cara tímido e enrolado que sou hoje, portanto, demorei muito pra me envolver com meninas, mas isso não é culpa minha e espero poder explicar um dia. Esse outro sonho se realizou no segundo ano do ensino médio, quando conheci minha primeira namorada aos 17 anos de idade.

No dia 10, antes da cirurgia, enquanto o médico colocara as luvas cirúrgicas, ainda comentavam sobre o ocorrido do dia anterior que teria deixado as enfermeiras nervosas. A vida parecia me preparar para o sol, então vim ao mundo por volta das 13h. Pode parecer impossível de acontecer, mas lembro que o Dr. Jonas me pegou no braço, levantou os óculos, me olhou com uma cara confusa e respirou fundo 3 vezes com os olhos fechados. Você pode achar que é conversa fiada, mas meus olhos estavam bem abertos e eu até lembro da fisionomia do rapaz alto de cabelos grisalhos que apresentara um tremido estranho na boca. Baseado no que mamãe falou, nasci mudo e azul. Não chorei pelo fato de meus pulmões não se abrirem, não causando dor ao respirar pela primeira vez. E azul por conta da cor das paredes que refletiam em toda matéria viva ali no ambiente, acredito eu. Isso se resolveu de forma fácil e rápida depois de umas tapas que o médico me deu. Depois disso meus pulmões se abriram e eu caí no choro que durou por mais de duas ou três horas. Chorara como se não houvesse amanhã, nem hoje, nem ontem. Analisando as coisas que vivo no presente, encaro essa tapa como uma representação de todas as coisas ruins que me acontecem e o choro como as vezes em que as lágrimas não caem. É como se tivesse esgotado meu limite naquele mesmo dia. Quando alguém não sabe disso, pode-se acreditar que sou frio ou insensível, mas não aceito que digam que não sinto as "tapas" pelo fato de não chorar.

Ali estava eu, berrando como quem olhava pra uma assombração ou foto da Jocelyn Wildenstein numa das paredes. Depois do parto uma das enfermeiras me levou direto pra uma incubadora que tinha um cheio desagradável de éter. Foi o primeiro cheiro que senti na vida, o que explica o fato de eu não gostar de ir em hospitais hoje em dia. Não sei por quantos dias ou horas fiquei ali, mas quase foi suficiente para que eu me apaixonasse pela guria da incubadora ao lado. Começava assim a minha paixão pelas mulheres, das quais tenho uma missão particular de cuidar e protege-las. E assim foram surgindo outras coisas na minha vida, como o enjoo ao andar de ônibus, por exemplo.

Os parentes logo souberam do rapaz que nascera. Talvez o cara mais diferentão da família ou o mais comum da terra. O que importa é que a cada ano que se passa eu descubro uma coisa nova sobre aquele dia. Inclusive, no dia 9 Ás 14:40 as enfermeiras ainda não haviam almoçado por conta de um atraso na troca de postos, causando revolta em algumas delas.

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