Algumas amigas minhas achavam que o fato de ser negra e morar na periferia me faz uma coitada, ja pra mim nada disso importa, não importa a cor, nem onde você mora, se suas convicções são erradas você vai dar errado, mas não é o meu caso, acho mesmo que pra viver nesse mundo e vencer é preciso ter raça.
_Procurando emprego de novo?_ pergunta Carlos o meu vizinho fofoqueiro
_Você deveria fazer o mesmo não acha?_ falo sem sequer parar minha caminhada
Eu sabia que ficar desempregada mais de um mês estava começando a pesar nas costas da minha mãe, que tinha um bico de diarista. Ela vivia dizendo que eu devia parar de procurar emprego na minha área e aceitar o que viesse afinal não estava fácil pra ninguém, mas eu estava no último período de administração na faculdade e eu não estava estudando a toa.
Chego no ponto de ônibus e começo a me analisar, ver se a minha roupa estava boa, se meu cabelo estava no lugar, pra mim estava tudo ok, mas pelo que parecia não pra mulher que me entrevistou. Ela me olhava de cima abaixo como se tivesse algo de errado comigo, eu conhecia aquele olhar e sabia que estava perdendo mais uma ótima vaga de emprego.
Aquela não era a primeira vez que eu perdia uma vaga de emprego por ser negra ou não estar "vestida adequadamente". Minhas roupas não eram de marca, mas eu tentava andar o mais apresentável possível, mesmo assim, a menina branca do meu lado sempre era aceita. Mesmo me obrigando a não olhar por esse lado, era quase sempre assim que as coisas aconteceram._Cheguei!_ falo batendo a porta de casa desanimada
_Não conseguiu não é?_ minha mãe aparece e se senta ao meu lado
_Dessa vez eu realmente achei que ia conseguir, eu não entendo eu fiz tudo certo mas... _ falo decepcionada comigo mesma
_Minha filha, entenda uma coisa...
_Não mãe, esse papo de racismo hoje não, por favor!_ falo irritada
Eu sabia que minha mãe já tinha sofrido bem mais que eu nessa vida e que provavelmente ela tinha razão, mas era revoltante pensar que não fui escolhida por causa da cor da minha pele.
Minha mãe era como milhares de mulheres, uma mulher negra, sozinha com os filhos e tendo que trabalhar pra criar os dois como podia, de alguma forma em algum momento ela passou a aceitar, e dizer que as coisas eram assim mesmo._Ok, só cogite a idéia de trabalhar comigo, pelo menos pra ganhar uma graninha extra.
Sequer respondo, estava chateada demais pra isso. Entro no meu quarto, me jogo na cama e começo a pensar na última vez em que sai pra trabalhar com a minha mãe, eu devia ter uns 15 anos, estava de férias da escola e minha mãe não gostava de me deixar sozinha em casa, já que ela sabia que meu irmão levaria os amigos pra casa e os amigos dele eram estranhos demais, por isso pediu a "madame" se podia me levar.
7ANOS ATRÁS
_Ana, por favor, senta ai e não mexe em nada._ minha mãe disse enquanto passava as roupas
Como não tinha ninguém na casa ela colocou a tábua de passar perto da varanda, assim a gente conseguia aproveitar a vista.
_Ta_ falo entediada sentada em uma cadeira enquanto esperava ela terminar
Me levantei, arrastei minha cadeira para mais perto da varanda e me distrai olhando a praia, que ficava em frente. Fiquei olhando todas aquelas pessoas ricas e bonitas passando se divertindo e eu sabia que um dia eu seria uma delas e nunca mais minha mãe trabalharia de empregada pra ninguém. Todos pareciam tão felizes, andando em suas bicicletas na orla da praia, outros fazendo sua caminhada matinal, exceto um menino loiro sentado na beirada do calçada ainda com os pés na areia, me chamou atenção por que ao contrário de todos na praia ele parecia desanimado. É claro que de longe eu não conseguia ver o rosto, mas o jeito como os ombros dele estava arriados e como ele olhava pra baixo e parecia suspirar, me passou uma sensação triste.
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A COR DE ANA
RomanceAna uma menina que desde pequena aprendeu a lidar coma vida do jeito que ela é, e mesmo sendo de uma familia pobre ela nunca se deixou abater nem mesmo nos momentos em que sofreu preconceito. Ana vai nos mostrar que é preciso ter raça pra lutar cont...