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Sair da cama foi complicado, pois meus ombros latejavam e minha cabeça estava prestes a explodir. Peguei meu celular na cabeceira e chequei mensagens e coisas do tipo. Nada. Era 7:06 da manhã, e isso me fez resmungar. Raramente estava acordado naquele horário, mas o sono havia se dissipado.

Tomei um banho e joguei uns analgésicos para dentro, torcendo para que fizessem efeito. De certa forma, fizeram. Minha dor de cabeça passou rapidamente, mas meus ombros e coluna não queriam dar trégua. Era como se minha mente não compreendesse que eu já tinha acordado, e que ela podia se desviar daquele maldito pesadelo.

Fiquei no sofá, pulando os canais na TV até dar a hora de sair. Quando o despertador gritou, me avisando que eu deveria me arrumar, senti um desânimo avassalador. Mas, dei umas tapinhas na cara e levantei. É só ignorar a dor que ela passa, meditei. Mas não era tão simples. Passei o início do dia quase gemendo de tanto que meus músculos doíam.

No ônibus, todos me lançavam olhares esquisitos, e uma senhora ofereceu seu lugar para eu sentar. Não sinto orgulho, mas aceitei. Minha visão estava turva, e eu senti que poderia desmoronar a qualquer momento.

— Deve estar voltando da balada — ouvi alguém dizer no banco de trás. — Essa cara de drogado.

— E ainda senta no lugar da senhora — outro resmungou. — Essa juventude...

Eu ignorei. Não tinha forças para discutir. Tentei me concentrar em melhorar antes de chegar no meu destino. Mas o mundo parecia girar cada vez mais rápido, e eu estava preocupado se o vômito viria sem ser convidado. Felizmente não veio, e eu consegui permanecer de olhos abertos durante o trajeto.

Ainda bem que meu trabalho é bem simples. Tudo que tenho que fazer é pegar os tickets e entregar os comprovantes aos motoristas. Alguns clientes do supermercado me olhavam com uma cara estranha; uma mistura de pena e confusão. Devo estar destruído por fora da mesma forma que estou por dentro, pensei.

Passei o início de meu expediente com a sensação de estar sendo observado. Não que eu tivesse visto algo, mas eu sentia de alguma forma que tinha alguém vendo minhas ações. Isso me deixou paranoico. Alguns dos meus amigos afirmam que essas empresas grandes, como supermercados, possuem câmeras e microfones em todos os lugares. Eu estava quase acreditando nisso.

Quando deu a hora do intervalo, fui até o lugar onde os funcionários esquentam suas marmitas, bebem seus cafés, fumam seus cigarros e fofocam sobre qualquer coisa. O lugar estava vazio, e eu agradeci por isso. Peguei um copo de água e despenquei no sofá, ainda me sentindo monitorado. As dores nos ombros estavam ainda mais fortes, mas eu já estava conseguindo domá-las. Ou era isso que eu queria acreditar.

A porta se abriu em um escândalo de vozes e murmurinhos. Franzi o cenho ao ver que era Bruno e Paula que entravam. Meu cunhado e sua namorada. Na verdade, uma de suas namoradas. Eu o desprezava por iludir as mulheres e, mais ainda, por ser um cuzão. Ele é o típico "playboyzinho da Barra", um misto de gírias cantadas e sorrisos tendenciosos. Eu simplesmente odeio esse tipo de gente. O pior de tudo é que, além de trabalhar com ele, ainda tenho que aturar essa cara de merda toda vez que vou visitar Amanda.

— Fecha a porta — eu falei, sem ao menos olhar para ele.

Ele estacou e me olhou.

— Fala direito, mané — fechou a porta e abriu um de seus sorrisos.

— O que você tem? — Paula sentou do meu lado, tocando minha testa com as costas da mão. Ela me olhava como uma enfermeira olha um bebê febril. — Você tá com uma cara horrível.

Sobre os OmbrosOnde histórias criam vida. Descubra agora