NOTA DE ABURGUESAMENTO

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sempre me uniformizaram

de capacete e macacão

só agora me vestiram

um terno (de madeira)

sempre fui um inquilino

andando de cortiço em cortiço

conheço todos da cidade

todos tem o mesmo cheiro

e o mesmo apetite sexual

agora jogarão na minha cara

um pouco de terra

mas ali não terei ameaças

de ser despedido

de ser despejado

sempre me empurraram

lotação a dentro, lotação a fora

agora me levam carregando

estão chorando

e eu sorrindo

sempre fui um inútil

para todos, menos para mim

e para a minha nega

nas noites de cio

e agora andam dizendo

que farei falta

e o padre que sequer sabia

que eu era fiel

rezará por mim no sétimo dia

agora que como

tuberosas pelas raízes antes da colheita

é que se lembra de acrescentar

uma cruz ao meu nome

agora não me pesam mais

agora não me medem mais

e nem me pedem exame de fezes

agora o que é perda

aos olhos dos que ficaram

é o que me enriquece

a morte é emancipatória!


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