Capítulo 2

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No meio daquela confusão de pensamentos rápidos, uma parte de mim gritava "pula, não deixa ela se afogar! ", mas então eu percebi que ela não estava se afogando. Ela estava tão tranquila, que parecia estar numa parte rasa do mar.

A moça deitou sobre a água, como se fosse nadar de costas ou boiar. Só então eu juntei as peças. A cauda comprida que eu tinha visto era parte dela! Olhando rápido, eu pude enxergar algumas nuances verdes no meio do laranja de suas escamas. Ao mesmo tempo em que ela se destacava no meio de todo aquele azul do oceano, ela parecia fazer parte dele.

Estava pasma. Peguei a câmera devagar, tentando não me mexer bruscamente; como se a sereia fosse um passarinho assustado. Quando ergui o braço para fotografar, ela viu. Deu um mergulho rápido entre as ondas; a perdi no meio de tanta espuma.

Parte de mim talvez nunca tenha entendido direito o que foi aquilo. Apenas de olhar para ela, eu já fiquei deslumbrada. Foi um sentimento muito intenso para um momento tão rápido. Era algo inexplicável.

Fiquei fora de mim por alguns instantes. Gelei, ainda em pé, em cima das pedras. Encarando o mar. Imaginando todas as coisas que podem existir ali e ainda não conhecemos. Uma imensidão inteira, todo um mundo novo a descobrir. É, acho que mamãe ganhou a assistente que tanto queria.

Cambaleei até minha mãe, tentando não errar meus passos entre as pedras.

—Ei...

­—Oi, filha! — Ela estava distraída, observando o céu, escrevendo sobre os pássaros — O que foi? Conseguiu achar alguma coisa?

—É, consegui. Uma coisa bem interessante, digamos assim.

—Oh, sério?! — Parou tudo o que estava fazendo e correu para perto de mim. Seus cabelos escuros estavam bagunçados num rabo de cavalo baixo. Ela estava tão focada em sua pesquisa, que parecia não se importar. — Tirou fotos? Sabe o que é?

—Mais ou menos. Seus livros estão lá em casa?

—Tenho poucos específicos sobre biologia marinha ainda, mas tem uma biblioteca boa no centro da cidade! Já viu?

—É, já fui com meu pai. Bom, vou correndo, então. Te dou detalhes mais tarde.

—Tá bem, faz um macarrão quando chegar em casa! ­— Nesse ponto, ela já estava olhando para o céu de novo. Ajeitei sua única mecha grisalha para trás de sua orelha e parti sem dizer mais nenhuma palavra.

De lá até o centro não era muito longe; foram só alguns minutos de caminhada. Quando cheguei na biblioteca, a última coisa que se passou pela minha cabeça foi procurar algo que envolvesse biologia marinha. Quase que ataquei tudo o que envolvia mitologia. Queria estudar ao máximo sobre sereias.

Claro, muitas coisas que li não se pareciam com quem eu vi. Li teorias de que elas pareciam um bicho horrendo, vi fotos de coisas que eram praticamente monstros - azuis, sem cabelos, o corpo inteiro coberto de escamas, dentes afiados. A moça que eu vi não era um monstro nem de longe. Ela era linda. Tinha a pele bronzeada que, contra o sol, parecia até dourada. Seus cabelos eram longos e tinham uma tonalidade escura de castanho. Ela parecia até um elemento da natureza.

Os livros que melhor descreviam aquele momento eram os fantasiosos ou didáticos, sobre mitologia. Descreviam as sereias como ilusão dos marinheiros, que ficavam muito tempo em alto mar e começavam a imaginar coisas interessantes para se distrair. Essa teoria fez sentido para mim. Eu estava olhando para o mar há um tempo, esperando um milagre surgir. Já estava sem esperanças, prestes a mergulhar para tentar encontrar algo e, do nada, um ser maravilhoso aparece.

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