Capítulo 1 Voltando A Fazenda

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O pior não é estar presa numa fazenda nos confins do mundo.

O pior é começar a desejar aquele peão fedido, com aquele cheiro de feno que entra pelas narinas, aquele peitoral definido, que ele insiste  em mostrar para mim.

João é um homem alto, dois metros de pura safadeza e arrogância, quando ele passa por mim mascando capim minha vontade é matá-lo. Ele é praticamente tudo que detesto.

Caipira, musculoso e cheio de si. E na última semana começou a me olhar diferente, quando me pego estou olhando também, prestando atenção nos seus cabelos castanhos, na sua boca de dentes perfeitos, na pele queimada pelo sol.

Culpa do meu pai, a última coisa que necessito é me envolver com um peão.

Fazia três anos que eu não vinha para a fazenda do meu pai, três maravilhosos anos em que vivi em São Paulo cursando administração, em breve teria minha carreira promissora, por mim teria ficado lá sem voltar para aquela microcidade no interior, mas meu pai exigiu que eu voltasse para casa por um ano para me dar um apartamento e um carro.
Sem outra chance voltei.

A fazenda era imensa, tinha pasto a perder de vista, e meu pai contratou João para cuidar disso, o peão era responsável por cuidar do gado.
Eu nem preciso dizer que detestei, ele era diferente de tudo que eu via na cidade, era forte, bronzeado e mascava capim.

E por alguma ideia louca, meu pai decidiu me colocar para trabalhar com ele.

Eu não preciso dizer que detestei né?
Eu detestei, João era um homem que atraia olhares demais, toda hora alguma moça vinha oferecer um cafezinho, um pedaço de bolo, tudo que chamasse a atenção dele. Um dia andávamos a cavalo buscando um novilho desgarrado e não foi diferente, ele desceu e caminhou até uma moça que estava parada na cerca, os dois flertaram abertamente e ele voltou mastigando alguma coisa, enquanto eu o esperava montada no Safira, meu mangalarga.

— Você não precisa parar toda vez que uma de suas moças vem trazer alguma guloseima para você, João.

— Dona eu faço meu serviço, isso não atrapalha em nada, e não vou fazer desfeita não.

— Claro né? Você tem que ser uma espécie de garanhão reprodutor, tem que engravidar todas as moças da região para que seu sangue se perpetue pela terra.

— Eu acho...

— A dona me desculpa, mas eu sou contratado pelo seu pai e ele não se importa, ele quer mais que eu esteja disposto para tocar o gado, a dona é só filha dele.

— Olha como você fala comigo seu peão nojento — o empurrei com o pé e ele me olhou como se eu contasse uma piada, o detestei naquele momento.

— Seu pai enfrenta tanto problema com você, e a dona é só uma potranca que precisa ser domada, eu domava a dona fácil.

—Eu sou o que? — a furia me dominou, desci do cavalo e parei na frente dele.

— Uma potranca que precisa ser mimada, seu pai te dá muita ousadia, mulher minha não tem ousadia assim não.

— Ponto um, eu sou sua patroa, ponto dois não se meta na criação do meu pai, ponto três e não menos importante, eu não sou  sua mulher.

— Claro que não — os olhos castanhos sorriram antes da boca — Minha  mulher terá educação.

— Você é um machista.

— E você é feminista de Facebook, nunca vi ajudar sua mãe a levar uma louça para a pia, ou arrumar os seus cabelos.

— Feminista do que traste?

—Dê Facebook, acha que por que eu moro na roça, não tenho acesso a tecnologia?

— O que você tem ou não acesso não me interessa, só não quero você com conversa na hora do expediente.

—Vamos fazer o seguinte patroinha? Vamos conversar com o seu pai, se ele não se importar, você vem a noite no celeiro e ficamos um pouco a sós, se seu pai não gostar e me der uma bronca, eu juro que proíbo todas essas meninas de se aproximar daqui.

— Fechado, mas eu poderei falar com meu pai antes se falar com você?

— Pode contar a história que você quiser, seu pai não vai mandar o peão mais aplicado da fazenda embora por causa de un pedaço de bolo.

—  Escuta se por acaso você não tomar nenhuma bronca, eu vou estar segura naquele celeiro?

— Nunca peguei mulher a força, não seria você a primeira!

— Grosso!

— Diga a seu pai que o peão ficou procurando o terneiro.

Montei de volta ao cavalo e fui direto a sede da fazenda, sabia que eu como a princesinha do papai  faria aquele peão entrar nos eixos.

Entrei na casa e meus pais tomavam o café da tarde:

— Já acharam o novilho?

— João está procurando, papai está acontecendo uma coisa muito chata.

— João está te fazendo mal, filha?

— Não, papai é desagradável demais eu estar trabalhando e ter que parar por causa das moças que vem na cerca  ver o peão toda hora.

— O que elas fizeram? — Meu pai tomou um gole de café.

— Trouxeram bolo, café, papai as moças deviam se dar ao respeito.

— Minha filha você nem parece uma jovem moderna da cidade, nem as meninas analfabetas da ribeira tem esse sei pensamento, as moças vem trazer café e bolo, como um carinho, elas não se deitam com ele. João é um excelente partido, e eu acho que a moça que casar com ele vai ser muito feliz.

— Pai ele é um bruto.

— O melhor homem da fazenda — meu pai ia dizendo quando mamãe o interrompeu.

— Sou eternamente grata ao peão. Ele fez o parto da Isa, Amanda minha filha, olha a sua irmã — a nenê de um ano e meio dormia no carrinho — Sem esse bruto ela não estaria aqui.

— Mãe, você não entende!

— Amanda seu pai não vai dar uma bronca no João, muito menos demitir o homem, você só vai ficar um ano aqui, aprendendo as coisas, pra caso a gente falte, João vai ficar aqui para sempre.

Mal terminaram de falar e a peste entrou, estava suado, trazia o chapéu escuro amassado entre as mãos, parecia tenso.

— Achou o novilho? — meu pai perguntou como se aquilo pudesse mudar o destino de todos nós.

— Sim —João torceu o chapéu — Mas tenho uma péssima notícia.

— O terneiro morreu?

— Não, a péssima notícia é que esse aí ainda vai dar muito trabalho e comer muita ração ainda, senhor, a dona Amanda estava incomodada, ela falou com o senhor? O senhor quer ralhar comigo?

— Não, você está fazendo seu trabalho, já expliquei para ela os costumes daqui e ela entendeu.

— Perfeito. Era pedir muito eu poder falar com ela a sós e pedir desculpas? Eu não vou deixar as coisas se repetirem e nem a patroinha com raiva de mim.

Papai fez sinal para qu eu seguisse o peão, e fomos só nos dois até a porta da fazenda em silêncio.

— Te espero quando a noite for alta lá no celeiro, vamos ver se você tem palavra.

João girou nas suas botas e foi embora antes de eu responder, mas provavelmente já sabia que eu iria, minha palavra valia muito.

Louca pelo peão Onde histórias criam vida. Descubra agora