Capítulo 12

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Jessica

Flashback on

-Então, Jessica, como te sentes hoje?

Estremeço ao ouvir a pergunta. Não sei bem porquê... já se tem tornado uma rotina. Estou sentada num cadeirão velho de cor amarela desgastada, e para aliviar o stress, vou arrancando pequenos pedaços de espuma que saiem do buraco no braço do cadeirão. Tenho o coração a bater a mil à hora e tenho de respirar fundo várias vezes para me tentar acalmar. Mantenho o meu olhar fixo nas minhas mãos, não tenciono encarar a pessoa que está à minha frente e que tem sido o meu pior pesadelo nos últimos tempos. Porém, ele não tenciona pressionar-me e mantém-se calado até eu me sentir à vontade para responder.

-Igual.

Engulo em seco com dificuldade. Sei que tudo isto que estou a sentir é psicológico, mas de certa forma também me começa a afetar fisicamente. Sinto-me doente, sem força para fazer nada. Não saio de casa, mal como, não consigo dormir uma noite seguida com pesadelos... Estou destruída por dentro e por fora.

-Ora- o homem torna a falar e eu ouço o clic de uma caneta- E consegues descrever-me esse teu "igual"?

A sua pergunta quase me faz rir. Apetece-me levantar-me e sair porta fora, porque é evidente aquilo que eu sinto. Não percebo a necessidade de ter de vir aqui 3 vezes por semana para falar com um estranho acerca dos meus sentimentos. Pra quê tanta regularidade? Os meus sentimentos não mudam e eu receio que nunca irão mudar. Faço um esforço para manter a compostura, arrancando os pedaços de espuma com mais força. Cerro os dentes e volto a respirar fundo para evitar que as lágrimas comecem a cair.

Ouço-o a mexer em alguns papéis, mas não me atrevo a levantar o olhar. Mordo o lábio inferior para evitar que ele o veja a tremer incontrolavelmente. Meu deus! Porque é que eu não me consigo controlar?! Porque é que eu não posso ser como os outros e apenas seguir em frente?! Porque é que eu tenho de levar com estes fantasmas constantemente a assombrarem-me e eles não? Será que eles também têm pesadelos como os meus? Será que eles também sentem que vão morrer de um momento para o outro, apesar de saberem que é apenas mais um ataque de pânico? Pois... duvido. Apesar de não parecer, eu sempre fui assim... sempre fui de ficar a remoer num assunto durante muito tempo, por mais insignificante que ele fosse. Os meus amigos não. Sempre foi fácil para eles perdoar e esquecer. Às vezes gostava de ser mesmo a Jess que eles tanto dizem que conhecem... meu deus... se ao menos eles me conhecem realmente...

-Da última vez que cá estiveste, começaste a narrar alguns dos acontecimentos daquela tarde.- ele declara, mantendo a voz baixa e tranquila- Queres tentar recomeçar onde acabaste de narrar?

Sinto o meu corpo irrigecer e paro de respirar por uns momentos. Imagens daquele dia invadem a minha cabeça e eu quase entro em colapso. Vejo o corpo da Alice estendido no chão, brutalmente abraçado pela aquela armadilha de caça. Vejo as suas costelas serem penetradas, não conseguindo distinguir o corpo da armadilha. Vejo o sangue dela jorrar pela relva fora. Lembro-me de me aproximar, ainda em choque e de tocar na sua cara. Quase que ainda consigo sentir a frieza da sua pele... E os seus olhos... Os olhos mais bonitos que eu já vi na minha vida... Paralisados, estáticos e sem cor. Levo as mãos à minha cabeça e encosto-a aos meus joelhos abanando-me para a frente e para trás, na tentativa de afastar estes pensamentos.

-Jessica, está tudo bem...

-NÃO, NÃO ESTÁ!- grito de repente, pondo-me em pé e apontando o meu dedo indicador na direção do homem.- Não se atreva a dizer que está tudo bem, porque ESTÁ TUDO MAL!!

O homem também se levanta, erguendo as mãos em sinal para que eu me acalme. Mas não, não dá para me acalmar.

-Não está tudo bem quando a nossa melhor amiga morre... PIOR, quando nós a vemos ali, estendida, sem vida. E como se não bastasse, ainda somos acusados pela aquela... ATROCIDADE!

The SuspectsOnde histórias criam vida. Descubra agora