Retorno às Raízes

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Nova Orleans continuava encantadora, afinal. Ao menos, a quem não erguesse os panos. E Baltazar estava há alguns passos de rasga-los com as unhas. Miguel, aparentando ter seus 17 anos, observava o pai, tentando entender o motivo de sua irritação.

-Escute... Está zangado com meu pai outra vez?-O ruivo tirou os olhos do volante, voltando-os ao garoto.-Sabe, papai... Já não acha que é o bastante? Sei que está sofrendo, e que não quer contar ao pai... Mas não acho que isso seja certo. Somos uma família. Não me deixa cuidar de você, mas essa é uma obrigação do pai. Com a qual ele não está cumprindo.

-Isso é coisa de adultos, Miguel. Não fique pensando na relação complicada que eu e seu pai temos.

-Coisa de adulto? Pai... Eu tenho 745 anos. Já sou adulto há mais de 600 anos...

-Tudo bem... Você tem razão, filho. Me desculpe.

O homem se inclinou, colocando a testa no volante, suspirando de forma pesada. O rapaz ao lado acarinhou-lhe as costas delicadamente.

-Não peça desculpas, papai. Eu estou faminto. Podemos almoçar algo?

-Claro, filho.-O ruivo lhe ofereceu um sorriso, antes de beijar sua testa com carinho.-Vou à loja voodoo, pede algo pra mim?

-Sim, senhor. Vou te esperar para almoçar.

Pai e filho deixaram o Impala, que foi devidamente travado e enfeitiçado pelo mais velho. Miguel se dirigiu ao restaurante que há mais de um século pertencia a família Deveraux, e foi onde pediu o almoço, recebendo um olhar desconfiado de Sophie Deveraux. Apesar da imensa necessidade que sentia de interrogar a mulher, Miguel se limitou a sentar longe do balcão, enquanto observava a movimentação do lugar. Além, claro, de exercitar a excelente audição que herdara da outra parte de seu sangue: sua audição incomparavelmente aguçada.

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O sininho da porta anunciava a chegada de um cliente, mas não havia ninguém para atendê-lo. Não que Baltazar precisasse de quaisquer auxílio para encontrar o que pudesse vir a procurar naquele lugar.

-Celeste, minha cara.-A negra estancou, antes de se tornar o alvo dos olhos azuis.-O ódio e o desejo de vingança lhe caem bem. Sinceramente, aquela atuação de bruxinha doce e devotada... Para alguém da sua linhagem chega a ser nocivo. Aliás, eu tinha apreço por Sabine, era uma garota inteligente. Como foi que a vadia cadavérica a convenceu a doar-lhe o corpo?

-Não convenci.

O ruivo deu um riso irônico, antes de voltar a dar as costas à bruxa, enquanto olhava as pedras que estavam dispostas nas prateleiras.

-Isso é tão típico de você. Tenta tomar tudo o que quer, para, no fim do conto de fadas, entender que nunca teve. Que sempre armaram pra você. Lembra-se de quando a afoguei, há 300 anos? Eu adorei ver a sua expressão. Adorei ouvir seu espírito gritar quando Elijah ficou visivelmente aliviado em não ter mais que mentir e agradar você.

-Elijah me amava!

-Não. Acredite, minha cara. Elijah pode ter sido um bom amigo e um amante espetacular, mas ele nunca amou você.

Os olhos da bruxa acenderam em ódio, enquanto o ruivo estava adorando toda aquela tortura. Sempre fora sua parte favorita: fazer com que as "Amadas de Elijah" sentissem como ele desfazia cada uma de suas tolas ilusões.

-Você é uma praga... Um mentiroso!

-Claro, Celeste. Tem toda a razão. Eu sou uma verdadeira praga, e um grande mentiroso. Assim como meu Elijah é um excelente ator. Não há espião melhor do que um homem cortês, gentil, e com um sorriso que consegue mexer com os corações mais duros.-Ele capturou uma pequena safira com a ponta dos dedos, deixando-a na palma de sua mão, onde passou a analisa-la.-Bom encontrar com você, querida. Agora, estou atrasado, tenho um encontro. Nos veremos em breve.

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