Um nome para Ulisses

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Dia 1                     página (5 até 17)

      Gostaria de dizer que não estou com medo.

      Gostaria de dizer que isto é uma brincadeira, meu irmão.

      Gostaria muito mesmo de dizer que um dia, quando você estiver com os mesmos catorze anos que eu tenho hoje, a gente vai ler este texto e dar muita risada.

      Lucas, se a gente estiver lendo este texto no computador, é porque estou vivo.

      E eu não queria morrer, Lucas. Mas, se você estiver lendo sozinho, é porque aconteceu.

      E você nem vai saber como eu sou. Como era, o que eu queria, o que pensava... e veio assim uma vontade grande de mudar isso. Por isso, escrevo aqui.

      Aqui é o laptop do papai. Quer dizer, ele diz que é dele, mas quem usa mais é mamãe, para as suas aulas. Nunca-que-nunca eles deixaram a gente mexer no aparelho, mas hoje era um dia especial, então fiquei com ele. A TV ligada estava chata, abri o Meus Documentos...

      A maior parte dos arquivos era coisa de serviço, do papai ou da mãe. Mas aí vi o Fotos da Família. Abri. E me deu assim uma sensação tão estranha, Lucas!

      A primeira foto era de uns meses atrás, de seu aniversário de quatro anos, mamãe segurava você para assoprar a vela, e eu, do seu lado, fazia careta.

      Fui para outra foto, era da família de mamãe. Vovó Lurdes, toda bonita e alta, com roupa de ginástica, e o vovô Homero com copo de chope na mão, no clube da cidade deles.

      Vi depois a foto de um dia em que botei uniforme de Super-Homem e estava com um vizinho vestido de Homem-Aranha, a gente devia ter uns sete anos... Depois vi uma foto sua, de quando você era bem nenê e foi a primeira vez a praia! Você queria comer areia e estava com cara de choro, porque não deixaram, e eu fiquei do seu lado, metido numa máscara de mergulho e em um pé de pato, parecia tão heroico, assim, um aventureiro e mergulhador, caçador de tesouros!

      Aí eu parei de olhar. Parei porque estava doendo demais, Lucas! Porque percebi mesmo que, se acontecer o pior, é isso que eu vou ser pra você. Fotografia. Só isso. Você não vai lembrar de mim, com quatro anos de idade, você vai esquecer.

      E o pai ou a mãe, o que vão contar? Talvez falem só que você teve um irmão e que ele morreu de cancêr, coitadinho, aos catorze ou então com uns quinze anos de idade.

      E deu um medo, Lucas! Um medo enorme. Porque não quero ser só isso. Não mereço ser tão pouco!

      E eu quis chorar. Quis gritar, muito. De raiva. De revolta. E de medo, sabe?

      E aí, ah, meu irmão, aí aconteceu uma coisa estranha. Que arrepia e dá coragem, que faz a gente engolir o choro e dar risada, porque parece coisa do Além.

      Quando pensei em medo, olhei sem querer para Meus Documentos. Vi que tinha um arquivo exatamente com esse nome, medo. Parecia até uma resposta (do anjo da guarda, de Alguém que cuida da gente, será, na hora das dores grandes?) e foi com o coração desse tamanhinho que abri o arquivo. Sabe o que tinha lá?

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⏰ Última atualização: Aug 04, 2017 ⏰

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