Norman
20/12/2017
A noite caia devagar junto com o meu andar para casa por uma estrada de terra vermelha e molhada pelo orvalho. Eu morava na Cidade da Ponte, uma cidadezinha no interior de São Paulo com 122.354 mil habitantes.
A cidade da Ponte era pequena, calma e pouco conhecida e isso era perfeito, mas por não ser muito populosa todos se conheciam, isso não era uma vantagem para mim, eu não queria chamar atenção, mas quem iria se interessar por um velho professor de cabelos brancos usando uma bengala e morador da região mais afastada na cidade?
Minha casa ficava na parte rural e eu só tinha três vizinhos e eles não incomodavam muito: os Mesquita, os Fontes e os Gonçalves. Eu sei, eu tinha que parar com esse hábito americanizado de me referir aos outros pelo sobrenome, mas velhos hábitos nunca morrem, ainda mais os hábitos de sua terra natal.
A cidade tinha apenas uma entrada projetada com uma ponte de 78 metros de cumprimento. Do outro lado da ponte a cidade parecia uma ilha com os verdes de suas árvores e o azul do rio que passava em baixo da ponte. Os motivos para eu ter escolhido a Cidade da Ponte eram vários, mas o principal motivo iria ser enterrado junto comigo no dia que eu morresse. Não haveria como eu ser encontrado ali, eu tinha que acreditar nisso.
Eu tinha dois empregos, pela manhã eu dava aula em uma escola infantil como professor de ciências e logo mais surgiu uma vaga para professor em uma faculdade, aliás, a única faculdade da cidade.
Naquele dia meu carro tinha me deixado na mão e eu tive que ir para casa a pé.
Lembrei-me de quando eu residia e trabalhava em Washington, os grandes trajetos que fazíamos para chegarmos ao laboratório que era bem afastado da cidade. Era inevitável não comparar a paisagem de ambos os lugares, por mais patriota que eu fosse as terras do Brasil e suas matas eram mais bonitas e ricas, seus verdes enchiam meus olhos e o cheiro da terra entrava pelas minhas narinas prazerosamente. As cores de sua bandeira não tinham sido escolhido atoa.
Ouvi uma zoada de motor, olhei para traz e vi uma camionete cinza se aproximando muito rápido e ela parou ao meu lado espalhando barro vermelho e poeira para cima e para os lados.
— Vamos Sr Norman, entre aí!
Uma garota de pele morena e cabelos acaju falou abrindo a porta da camionete e descendo em um pulo. Eu ajeitei os óculos e meu coração palpitou com as lembranças misturadas com dejavu.
Ela ensinuou com as mãos para que eu entrasse no carro e me ajudou a subir e sentar no banco da camionete. Eu sentei no banco de traz junto com ela e com outra moça branca de cabelos castanhos claros , que me olhou e me deu um sorriso tímido, me cumprimentando. No banco da frente estavam o pai e o irmão da moça dos cabelos acaju: os Mesquita.
Os homens no banco da frente conversavam algo sobre raças de cavalos, os Mesquita possuíam um sítio e criavam alguns animais. No banco de trás pairava um silêncio, a moça de cabelos castanhos lia um livro atentamente e nem parecia se incomodar com o balanço do carro; a moça dos cabelos acaju estava com a cabeça encostada na janela pensativa, eu sempre tive curiosidade de saber o que se passava na cabeça dela.
Eu queria dizer algo, mas saiu:
"Então... Vai voltar mesmo para a faculdade não é Emilly?"
Ela me olhou automaticamente sem expressão facial, parecia ainda está processando a pergunta. As pessoas dentro do carro também pararam de fazer o que estavam fazendo para ouvir a resposta de Emilly.
— Eu...
Ela começou a falar, então parou quando percebeu que o carro tinha diminuído a velocidade e olhou pela janela com um movimento rápido, voltou a olhar para mim e falou com a voz mais gentil que conseguiu:
— Esta em frente de sua casa Sr Norman...
Ela abriu a porta da camionete e desceu para que eu pudesse sair, esticou os braços pequenos para me ajudar e eu aceitei sua ajuda de bom grado, a vi voltar para o carro, acenar com um tchau para mim e sumir junto com a camionete na estrada engolida pela poeira.
Já estava escuro e eu me vi andando com dificuldade o pequeno caminho de pedras até chegar na porta da minha casa, ajeitei os óculos, peguei a minha chave no bolso da minha calça e a enfiei na fechadura com um esforço, que eu nunca imaginei que teria, enfim consegui abrir a porta, entrei para dentro e a fechei fazendo o mínimo de barulho possível, tateei na parede até encontrar o interruptor de luz, estreitei os olhos sentido eles arderem quando o ambiente clareou e então eles focaram na figura sentada no centro da minha sala de estar, na minha velha poltrona.
Um homem de cabelos e barbas grandes de aparentemente quarenta e poucos anos, com olhos cinzas e muito expressivos, meio maltrapilho, me olhava.
"Ele de novo não!"
Pensei comigo mesmo enquanto processava tudo aquilo.
Aqueles olhos, eu já o tinha visto antes, a exatamente um ano ou menos, se não me engano, o que tinha me rendido uma perna fraturada por atropelamento na minha tentativa de fuga. O estranho é que ele tinha sumido do nada e depois reaparecia em lugares que eu frequentava quando eu estava morando no Rio de Janeiro. O mais estranho ainda é que sua aparência não mudava...
De início não tive muita reação quando o vi, apesar de ter levado um susto. Eu não podia deixar que ele me pegasse... imaginei quais métodos de tortura ele usaria para me fazer falar tudo o que eu sabia, então eu decidi fugir e virei as costas para ele indo em direção a porta de saída, mas ele foi mais rápido que eu.
O homem me impressou na parede fazendo as prateleiras estremecerem
— Não me mate... Eu... — Minha bengala caio no chão.
- Eu não vou machucar você...
Falou o homem que me esmagava contra a parede. Sua voz era grave e firme, o que me fez confiar menos ainda nele.
— Por favor...— Implorei.
Ele tirou as mãos grandes dos meus ombros e as apoiou na parede ainda muito perto de mim.
— Eu estou atrás de você a anos... precisamos da sua ajuda...
Eu olhava para ele incrédulo, aquele homem era um louco, eu poderia ver isso em seus olhos.
— O que você quer?!
— Sabemos o seu segredo... e precisamos dele para salvar o mundo.
Eu já não tinha mais dúvidas que aquele homem era um lunático. O meu segredo não poderia salvar o mundo... O que poderia ser salvo já estava salvo e o mundo? Bem, o mundo caminhava para o seu destino que já estava traçado.
— O mundo não pode ser salvo...
— Olha — O homem começou a falar e ele parecia enfurecido e surtado — Coisas ruins vão acontecer nos próximos anos e... o mundo estará um verdadeiro caos...
— O mundo já está um caos! — gritei com ele.
— Daqui a 20 anos 90% da população estará extinta, o Brasil, os Estados Unidos e outros países deixarão de existir...
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Quem Matou O Mundo?
General FictionPerto do fim, as forças do mal lutam para dominar o mundo infiltrados na política, na mídia, e nos demais poderes que tentam controlar suas massas. Mas ainda há uma esperança para o povo? Alguém surgira em meio ao caos que os maus trouxeram e dará f...