Capítulo - 1

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Tinham a aparência de autênticos assaltantes de trens. Para Miranda, pareciam tão reais quanto Butch Cassidy e Sundance Kid, desde a aba dos chapéus empoeirados, até as tilintantes esporas das botas.

Para evitar uma colisão com uma barricada de toras empilhadas nos trilhos, a locomotiva freara bruscamente, soltando um guincho agudo e uma baforada de vapor. Os atores, desempenhando seus papéis à perfeição, haviam galopado para fora da densa floresta que ladeava aquele trecho da ferrovia, os cascos dos cavalos martelando o chão, e parado em tumulto, junto aos trilhos. Enquanto as bem treinadas montarias ficavam à espera, em prontidão, os "assaltantes" mascarados, empunhando revólveres, subiram no trem.

— Não me lembro de ter lido sobre isso no manual turístico. – Uma passageira comentou, inquieta.

— Claro que não, querida. Estragaria a surpresa! – O marido observou com uma risadinha. — Um show e tanto, não?

Miranda Price também achava. Um show e tanto. Digno do preço da passagem da excursão. A encenação do assalto teve um efeito arrebatador sobre os passageiros, principalmente sobre Scott, o filho de Miranda, um menino de 6 anos. Sentado ao lado dela no banco, ele assistia, encantado, ao espetáculo realista. Mantinha os olhos fixos no chefe do bando, que percorria o corredor estreito, enquanto os outros bandidos montavam guarda nas duas extremidades do vagão.

— Fiquem calmos, continuem sentados, e ninguém sairá ferido.

Devia ser um ator de Hollywood temporariamente desempregado, ou, talvez, um dublê em férias de verão, que aceitara aquele trabalho para aumentar sua renda instável. Fosse o que fosse que lhe estivessem pagando, era pouco, Miranda pensou. O homem era perfeito para o papel.

O lenço cobria-lhe a parte inferior do rosto, abafando a voz, que, ainda sim, alcançava todas as pessoas reunidas no vagão antigo. Trajado de modo bastante convincente, usava um chapéu preto que puxara para a testa, um sobretudo branco e, ao redor dos quadris, um cinturão de couro que sustentava o coldre, preso à coxa por uma correia. O coldre estava vazio, porque ele segurava o Colt numa das mãos enluvadas, enquanto se movia entre as fileiras de bancos, observando detidamente todos os passageiros. As esporas tilintavam a cada passo.

— Ele vai mesmo nos assaltar, mamãe? – Perguntou Scott num cochicho.

Miranda negou com um gesto de cabeça, sem desviar os olhos do fora-da-lei.

— É um assalto de faz-de-conta. – Explicou. — Não precisa ter medo.

Mas, no instante em que os olhos do ator pousaram nos dela, não teve mais tanta certeza. Prendeu a respiração. O olhar quente, brilhante como um raio laser, pareceu atravessá-la. O homem tinha os olhos de um surpreendente tom de azul, mas não fora isso que a deixara sem fôlego. Se a hostil intensidade daquele olhar não passava de encenação, o ator desperdiçava um grande talento dramático, fazendo shows em um trem turístico.

Os olhos perturbadores permaneceram fixos em Miranda, até que o homem sentado de frente para ela perguntou:

— Quer que esvaziemos os bolsos, pistoleiro?

Era o mesmo passageiro que tranquilizara a esposa momentos antes.

O assaltantes deixou de olhar para Miranda para fitar o homem.

— Claro. – Respondeu, dando de ombros.

Rindo, o turista levantou-se e enfiou a mão num bolso da bermuda xadrez. Retirou um cartão de crédito, que abanou diante do rosto do mascarado.

— Nunca saio de casa sem isto. – Informando em tom alto, tornando a rir.

Os outros turistas riram com ele. Miranda não riu. Observava o assaltante. Os olhos azuis permaneciam sérios.

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