O despertador arrancou-me de um sono profundo às cinco e meia da manhã. O sol ainda não havia vencido as montanhas mas o céu já havia clareado, a leste, as nuvens já recebiam um tom rosado como algodão-doce.
Como de costume, abri os olhos mas não quis me levantar, fiquei deitada e vi que horas eram, e caí no sono de novo deparando-me novamente com aquela figura horripilante de silêncio persistente com seus longos braços estendidos. E meu despertador soou mais uma vez e me levantei abruptamente e verifiquei mais uma vez o relógio e são seis e quinze, eu vou me ferrar.
Corri para o chuveiro e esperei que o mesmo ficasse quente e o banheiro a todo vapor, entrei no boxe e deixei a água quente bater contra o meu corpo frio. A água escorria pela minha pele em filetes, levando para longe as imagens do sonho. Resisti a vontade de contar a Wendy o que havia sonhado, mas do jeito que ela é frouxa, de nada adiantaria. Depois de esfregar todo o meu corpo, saí do chuveiro me enrolando na toalha e tentei me concentrar na tarefa à frente.
Enquanto secava meu rosto não pude deixar de notar os círculos profundos ao redor dos olhos e afastei uma mecha de cabelo castanho escuro que caía sobre meus olhos amendoados de mesmo tom, e comecei a me maquiar, quando terminei, tentei ver se parecia melhor e meus olhos me encaravam de volta como se dissesse-me, se melhorar estraga.
Sai do banheiro e me vesti o mais rápido que pude. Coloquei minha calça jeans branca e vesti a minha blusa favorita do Led Zeppelin, joguei por cima uma jaqueta de couro preta, escovei meus cabelos, pegando a minha mochila, pois dormiria lá por alguns dias, e saí do meu quarto pegando meus saltos. Tudo isso me tomou uns vinte minutos. Desci as escadas e deparei-me com Wendy deitada no sofá com uma coberta assistindo a sessão de desenhos do canal aberto. Sem olhar pro café despedi-me de Wendy dando um tapa em sua testa e a mesma resmungou em protesto esfregando o lugar onde havia batido.
- Porran...! Bom dia, pra você também, pessoa. Não vai tomar café?
- Não vai dar, estou atrasada. Me deseje sorte!
- Boa!- disse Wendy.
Peguei as chaves do carro e atravessei a porta de casa em disparada, preparada para fazer um viagem de duas horas em uma.***
Não me restou tempo para fazer uma parada no mirante, mas o pouco que pude ver de relance da janela do carro foi um lugar que parecia não ter fim, delineado de verde escuro por pinheiro e abetos. Os pinheiros davam lugar a penhascos que caíam a grandes profundidades antes de se tornarem planos. Eram montanhas belíssimas, mas duras, não perdoariam erros. Quando a paisagem mudou e pinheiros deram lugar a um longo gramado verde-vivo, cercado por barras de ferro negro, soube que havia chegado no meu destino.
A estrada de terra que levava ao St. Mungus subia uma pequena colina. Era rodeada de árvores e grama baixa, que se estendia por centenas de metros, até ser interrompido por um muro de tijolos cor de laranja que parecia acompanhar todo o contorno das rochosas. Alcançando cerca de três metros de altura, era encimado por um único fio elétrico. Senti uma pequena piedade pelas pessoas do outro lado do muro, que sabiam o quanto o mundo queria vê-las confinadas.
A visão era sombria e pouco agradável, ao lado de cada um dos muros, havia uma torre, e sobre elas, pelo menos três atiradores, trazendo nos braços rifles. Ao lado dos portões, ainda havia mais quatro guardas, todos também munidos de armas. No mesmo instante que parei o carro e mostrei minha identificação, minha entrada foi autorizada e dois guardas abriram o portão, que por si só dava boas vindas. As dobradiças provocaram um rangido mórbido que me causou arrepios.
O caminho de cascalho me levou até um espaço amplo com uma placa branca, maltratada pelo tempo com letras padrões, informando que ali era o estacionamento. Quando desci do carro e fui em direção do St. Mungus notei três prédios brancos que havia uma construção em estilo gregoriana, cada um deles tinha quatro andares, mas as colunas eram altas dando a impressão de que o número de andares era o dobro.
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Embora Seja Tão Vívido
Misteri / ThrillerCeleste Bittencourt, é doutora do manicômio judiciário St. Mungus, no alto das montanhas rochosas de Estes Park no estado de Colorado.No local, ela descobre que os médicos realizam experiências radicais com os pacientes, envolvendo métodos ilegais e...