4 | Coletiva

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I thought I saw your face today
But I just turned my head away
Your face against the trees
But I just see the memories
As they come
- I thought I saw your face today, She & Him

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— Querida, você precisa ter uma coisa em mente — Erick disse, com o olhar firme no meu. — Existem dois tipos de pessoas na imprensa: os jornalistas que vão publicar sobre seu trabalho e os que vão querer saber o que você pediu na Starbucks, com quem você saiu, qual batom está usando. Aqui só estão os jornalistas do primeiro grupo, mas qualquer coisa que você falar para esse grupo pode chamar a atenção do outro. Então, você precisa tomar cuidado com os dois. Eu sei que parece assustador, mas só quero garantir que você possa sair na rua tranquilamente durante o próximo ano.

Enquanto Erick falava incansavelmente, eu apenas assentia com a cabeça. Meus olhos mal piscavam. Nos últimos tempos, eu havia dado muitas entrevistas, todas em pequenas salas, com um discreto aparelho gravando a conversa. Agora, eu estava prestes a falar para dezenas de jornalistas e, mesmo com Erick tentando me tranquilizar, eu estava apavorada. Respirei fundo e olhei à minha volta. Erick, Cris e eu éramos os únicos em uma pequena sala, que contava com algumas poltronas e uma mesa cheia de frutas e aperitivos. Faltavam quinze minutos para a coletiva começar, já conseguia ouvir o burburinho dos jornalistas do salão e a única peça que faltava naquela cena era a mais importante das peças: Judd Moroni, produtor-executivo da série e pessoa responsável por eu estar ali.

A primeira vez em que falei com Judd foi por telefone, em uma breve ligação de menos de dez minutos, onde ele oficializou seu interesse em comprar os direitos do livro para transformá-lo em uma série. Na segunda vez, nos encontramos pessoalmente em Los Gatos, na sede da Netflix, para assinar os contratos. E aquela seria a terceira vez na vida em que o veria. Apesar do pouco contato, sua experiência de mais de vinte e cinco anos como produtor em Hollywood me transmitia uma segurança imensurável. Naquele momento, só queria eu Judd aparecesse pela porta da pequena sala.

Eu estava especialmente quieta naquela manhã. Era como se precisasse redobrar minha atenção em cada detalhe de tudo ao meu redor.

Concentrei minhas forças em vigiar a porta. Se eu olhasse fixamente para ela, sem piscar, Judd chegaria mais rápido? Certamente não, mas era tudo o que eu poderia fazer àquela altura.

Meu coração se acalmou exatamente às 10h55. Judd estava sorridente e vestia um terno azul marinho, com uma leve estampa xadrez, e uma gravata da mesma cor. Ele era alto e tinha uma barba cheia e curta, seus cabelos grisalhos e finos estavam penteados para o lado. Acima de tudo, nada em seu rosto chamava mais atenção do que suas olheiras; Judd parecia sempre ter passado por uma noite com duas horas de sono, no máximo. Ele sorriu ao me ver e eu sorri de volta, mais de alívio do que por qualquer outra coisa.

Estávamos prontos. Era hora de entrar no salão da coletiva e tentar colocar em prática todos os conselhos que ouvira nas últimas vinte e quatro horas.

— Vamos nos divertir um pouco — Judd disse, segurando em minha mão, para que subisse o pequeno lance de degraus que dava acesso a um palco.

O palco era pequeno, com menos de um metro de altura. Havia duas poltronas giratórias vermelhas bem ao centro e uma pequena mesa com água e microfones; no chão, um tapete felpudo também vermelho; e, ao fundo, um backdrop com o logo da Netflix.

Percebi uma primeira fileira com uns dez fotógrafos e, logo atrás deles, muitos jornalistas. Erick me disse que eram cinquenta, mas pareciam muito mais. Por último, consegui avistar uma grande câmera apontada para o palco – provavelmente da editora, que faria uma transmissão ao vivo da coletiva em sua página no Facebook. Então, eu certamente estaria falando para um número de pessoas muito maior que meus olhos conseguiam ver. Não é preciso falar que me senti mais amedrontada ainda, preciso?

Acesso L.A.Onde histórias criam vida. Descubra agora