Eu disse que não voltaria. Eu tentei não voltar, mas, eu não pude evitar. Talvez, eu não tenha tentado o suficiente. Mas eu não consigo mais evitar. Ou eu não quero mais evitar? Eu já nem sei mais distinguir as coisas.
Outra coisa que eu não sei é como vou fazer para pagar a dívida do jogo. Eu tô fodido! Outra surra igual àquela de semana passada e eu não sei se aguento. Também, quem mandou apostar demais, sabendo que não teria como arcar com o prejuízo?
Eu não sou um exímio jogador, muito pelo contrário. Nos últimos tempos eu só perco. Mas eu tenho essa mania de ficar apostando e apostando, mesmo sabendo que estou perdendo, e acaba que eu perco tudo na mesa, e ainda fico devendo.
Minha esposa me abandonou, pois não aguentava mais esse meu vício. Meus filhos também desistiram de mim e nem sequer me dirigem a palavra. Eu sinto falta deles, da minha família. Acho que foi por isso que eu prometi não voltar mais à casa de jogos, mas eu não pude. Ou eu não consegui? Não, espere, eu não quis. Eu posso ficar sem minha família, mas eu não posso ficar sem a jogatina.
Eu não sou um exímio jogador, mas, houve um tempo em que eu mandava bem. Eu saia da mesa de poker satisfeito por estar ganhando dinheiro e estar me divertindo. Mas, alguma coisa aconteceu. Tudo desandou e eu virei esse merda que não consegue mais jogar direito e que fica devendo. Talvez eu tenha perdido a sorte?
Eu estou devendo uma grana preta e eles ameaçaram a me dar outra surra. Outra dessas e eu não sei se aguento. Mas, também, não faz diferença. Eu já não tenho mais nada. Perdi meu emprego no banco por chegar sempre atrasado, afundei a família em dívidas... eu nem sei como eles conseguiram se reerguer, se é que eles fizeram isso. Eu não tenho notícias deles há algum tempo.
Bebo um gole do líquido que desce queimando pela minha garganta. Eu disse que não iria voltar, mas, eu não consegui. Ou eu não quis? Eu havia prometido não voltar, não havia? O fato é que agora as coisas estão se misturando em minha cabeça, e eu já não sei se não quero ou se não posso. E eu também não sei o motivo da confusão. Bebo outro gole.
Alguém ao longe acena para mim, me chamando. Eu me levanto, meio cambaleando e vou ao encontro do homem engravatado que havia me chamado. Ele me leva por um corredor, até uma sala que eu conheço muito bem. Todos já estão sentados à mesa prestes a começar o jogo. Há um lugar vazio para mim. Eu enxugo o suor da testa e me sento. Eles me olham com divertimento. Alguém sussurra algo sobre eu estar ali outra vez e o outro ri.
Eu disse que não voltaria, mas, aqui estou eu novamente. Alguém me pergunta se eu estou pronto para começar. Faço que sim com a cabeça, e então o jogo começa.
Conto feito para o desafio ''Relatos de um Viciado'' do perfil ''Assumimos A Culpa''.
Deixarei o link do desafio no link externo para quem mais quiser ver os contos maravilhosos que foram postados lá.
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Sobre O Amor E Outras Coisas
AlteleTodos os direitos reservados. Copyright © 2017 Natália Donatto Em ''Sobre O Amor e Outras Coisas'' eu trarei textos, frases e contos que escrevi e que quero compartilhar com vocês. Venham se aventurar comigo!