Vida de uma Loba

União Inquebrável

Finalmente chego na gruta refúgio que a Carla está. A terra em frente a entrada da gruta revirada do jeito que está me da pista pra duas possibilidades: ou a Carla ainda esta furiosa e isso tudo foi recente ou isso foi ontem logo que ela chegou aqui e ela agora já está mais calma.

Me atento aos sons de dentro e fora da caverna. Fora, apenas os sons normais da floresta. Dentro, o corpo da loba que o ocupa respirando baixinho em sono leve. Tomo cuidado de não me anunciar com sons desnecessários entrando na gruta encontro a Carla aconchegada em cima do colchão ao lado da cama, ainda na forma lupina como imaginei que estaria. Como ela não treinou nem nada ela não sabe voltar pra forma humana.

'Carla?' Ela levanta assustada e por instinto se prepara pra um possível ataque.

'O que você está fazendo aqui?' ela ainda está assustada e irritada, ainda assim parece que ela já sabia que eu viria.

'Primeiro saber como você está...'

'Como você acha? Primeiro descubro que o maldito segredo que minha família inteira escondeu de mim é que podemos nos transformar em lobos. Segundo minha irmã gêmea que supostamente partilha absolutamente tudo se afastou de mim por quase três meses, que eu facilmente classifico como os mais infernais da minha vida, por conta desse maldito fato. Ah e sem contar que existem seres por aí que podem nos matar e de quebra nós temos que não só caçar esses seres como também mata-los. É Karolina, tirando isso eu estou ótima.' já esperava que ela ainda estivesse agitada mas não imaginei o quanto. A acidez irônica na sua voz já estava beirando o insuportável.

'O que fizemos foi apenas pra te proteger!' mostrei as mesmas memorias de ontem e mais algumas agora incluindo as vezes que cacei. Tanto o alce quanto o Spectro. Observo-a enquanto repasso tudo o que vivi até hoje. 'Era por isso que ele não queria que soubéssemos. Ele queria nos proteger dessa realidade.'

'O que são essas coisas?' ela pergunta se referindo aos Spectros

'Spectros, seres repugnantes que sugam toda a vida do que quer que esteja ao seu redor. Esse que eu matei estava prestes a atacar algo. Não me dei o trabalho de ver o que era. Esse é um dos seres que temos que lidar.' falo simplesmente é espero ela digerir a informação...

'Ainda assim! Por que? Nunca pedi pra me envolver nisso! NÃO. PEDI. POR. ISSO!' A mania de se tornar a vítima da história da Carla tá começando a me irritar muito!

'E QUEM DISSE QUE EU PEDI? QUEM DISSE PRA VOCÊ QUE EU PEDI PRA VIVER SABENDO QUE DE UMA HORA PRA OUTRA POSSO EXPLODIR NUMA MONTANHA DE PELOS E MÚSCULOS? QUEM DISSE PRA VOCÊ QUE EU PEDI PRA ME TORNAR UM SER CAÇADOR ASSASSINO?' não pude evitar e despejei tudo de uma vez... 'Tudo o que nossos pais fizeram por nos até hoje foi pra nos proteger disso! E tem mais você sabe tão bem quanto eu que o que ser humano desconhece ele teme e se tem medo destrói antes de se arriscar a conhecer!' repassei todas as vezes que sofremos na pele por ser diferente de todos no colégio, sempre as mais altas, mais fortes, reclusas, as estranhas... e do quanto estudamos pra saber que isso acontece desde sempre. Passávamos horas a fio analisando livros de história e antropologia na biblioteca pública pra entender como reagir a isso. Construímos um mini império depois de alguns meses de estudo. Tiramos proveito de todas as oportunidades de mostrar que éramos melhores que todos os outros.

Só agora, depois de desabafar, que consegui ver o quanto estive contendo meus próprios sentimentos quanto a isso tudo.

'Eu sei... Sei bem' sua voz finalmente mais calma. A realidade caindo sobre ela. Mesmo que ainda restasse mágoa em sua voz por algum fato que não pude ver em seus pensamentos.