"Você se lembrará quando isso acabar
e todas as coisas dessa maneira tiverem um fim."
(Love of my life ‒ Queen)
Acordar na minha cama provavelmente era uma das coisas que mais me fazia feliz em anos. Quero dizer, só acordar mesmo. Porque logo depois começaram a vir as memórias do dia anterior, tudo que eu havia feito, basicamente, parecia um verdadeiro desastre, talvez meu pai tivesse sua razão quando implicava comigo dizendo que eu não tinha o menor talento para ser Princesa de Álcatron, nem tampouco governar o reino dele algum dia. E para meu azar e, também, azar dele, eu era sua única opção.Eu nunca quis metade da vida que eu tive, eu não pedi para nascer nesta família, também não foi minha escolha não ter nenhum talento que pudesse me fazer sobressair aos demais, nem para dança, nem para lutas, nem nada disso, eu até tinha algum talento para costura e, modéstia à parte, um bom gosto para moda, diferente da moda do palácio, é claro. Mas o que eu faria com isso sentada num trono o dia inteiro esperando que outros povos nos invadissem, o que, até então, não passavam de lendas que aumentavam por gerações e gerações?
Chegava a ser engraçado como algumas pessoas pensavam que a monarquia era absolutamente privilegiada. Ser somente uma princesa em Álcatron nunca me atraiu, sempre tinha alguém para fazer coisas por mim, mas, na maioria das vezes, isso era sufocante e chato. Eu nunca podia usar a roupa que eu queria, como calça jeans e camiseta, nem andar descalça por aí e pasmem, eu nunca podia pentear meu próprio cabelo sem que tivessem duas ou três outras pessoas de prontidão para isso.
Foi então que comecei a pensar no Eric e naquela sensação de ver todas as coisas lindas que a natureza criou morrerem. Talvez aquele fosse meu jeito de dar o dedo do meio à sociedade, ou talvez eu nem tivesse mesmo feito aquilo, afinal, não fazia sentido algum o que eu julgava ter acontecido e, provavelmente, era só mais algum sonho idiota da minha cabeça.
Duas batidas firmes na porta ecoaram pelo meu quarto e eu soube que era Eric, tínhamos uma espécie de código para nos reconhecermos desde pequenos, principalmente quando queríamos pular os muros ou ele me ajudava a fugir de algum castigo. Levantei depressa para atender e apressei o passo até a porta, girando a maçaneta em seguida. Eric sorriu quando me viu, aparentemente, bem.
— Bom dia, Alteza. — Logo tomando sua postura habitual e erguendo seu corpo depois de uma longa reverência.
Passei por ele espiando do lado de fora e vi que não tinha mais ninguém no corredor, então o puxei para dentro, fechando a porta atrás dele.
— Uma ova — resmunguei. — O que está acontecendo?
Ele riu.
— Você é sempre tão perdida, não é An? — Então pigarreou. — Vim aqui exatamente para te dizer que alguns dos criados desapareceram. — Logo que me deu a notícia, ele pareceu fitar minhas roupas, baixei os olhos e percebi que ainda estava de camisola, senti minhas bochechas corarem um pouco colocando minhas duas mãos a frente do meu corpo, na tentativa de esconder algo dele.
Eu usava uma camisola bem comprida, a barra batia nos meus tornozelos, tinha alças extremamente finas e era toda de cetim, até marcava meu corpo mesmo sendo soltinha, no decote, uma pequena rendinha verde-água que combinava com a cor do tecido num tom de verde um pouco mais fechado.
— Sua camisola parece de uma velha de 80 anos, não tem mesmo como ver nada por baixo de tanto pano. — Eric debochou com o meu gesto.
— Ei... — resmunguei, mas logo me detive à frase de Eric. Não tínhamos mais criados, como assim? — Espera, o que aconteceu com os criados? — perguntei encerrando o assunto sobre a camisola constrangedora.
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A Maldição da Rainha • Série Demonangel (Degustação)
FantasiaSinopse: O mundo foi devastado pela terceira e maior Grande Guerra Mundial, agora, 200 anos depois, em algum lugar onde antes figurava a Hungria nos mapas, Álcatron se ergue sob o prisma de uma nação monárquica, em que o rei governa, além de homens...