Ficar sem vê-la

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Ficar sem vê-la

Eu conseguia perceber que aquela não era uma dor qualquer porque nunca tive um dessabor tão denso. A melancolia era muito profunda e ficava mais intensa a cada segundo que se passava, me espancando a cada instante com mais força. Quando eu já me encontrava esculachado no chão, acreditando que não tinha como as coisas piorarem, o sentimento sorrateiro voltava e me chutava com mais intensidade. Vivenciar esses sentimentos era algo péssimo, eu nunca havia experimentado uma dor tão forte. “Para que tudo isso? Com tantas pessoas e corpos pelo mundo por que essa desorientação arrebatadora tem que se instalar logo em mim?” - eu refletia durante nos raros momentos que minha mente estava clara.

Como aquela dor mental me causava um grande sofrimento, me deixando sem o raciocínio logico e a sobriedade, foi ficando evidente eu não estava bem. Eu não conseguia processar as coisas em minha mente com clareza e, sempre que eu desejava iniciar um afazer qualquer, distraidamente acabava por realizar outro que em nada se relacionava com o primeiro. Em um curtíssimo intervalo de lucidez eu me atentei ao fato de que essa mágoa roubava a minha capacidade de ver as coisas belas da vida. A tristeza vivida por mim era tão intensa e feria tanto a alma que fazia o meu cérebro entrar em um curto circuito, me impossibilitando de encontrar um bom caminho para sanar eventuais problemas. Como reflexo disso tudo eu ficava completamente desorientado, e os meus pensamentos confusos e embaralhados, o que me dava um certo desespero.

As vezes o meu corpo agia de uma maneira diferente, o que me fazia acreditar que eu estava diante de uma resposta fisiológica a essa dor sentimental. No começo algo segurava a minha garganta, tirando de mim a sede e a vontade de comer, me deixando enjoado com o estômago embrulhado. Acontecia então exatamente o contrário do que se passa comigo quando estou com fome: só de imaginar uma comida em minha frente eu já me sentia saciado. Em alguns momentos ao invés de me sentir saciado, eu ficava com um pouco de ânsia e, enjoado não conseguia engolir nem o mais saboroso dos alimentos. Sem nenhum motivo aparente o meu pescoço ficava febril e os meus olhos parcialmente dormentes piscavam involuntariamente várias vezes, como se eu estivesse tendo uma forte vertigem. Logo após passar pelo mal-estar me dava uma forte vontade de chorar. Os afazeres diários perdiam todo o sentido e eu não encontrava motivação para cumpri-los. Sem qualquer estrutura psicológica eu empregava um gigantesco esforço para realizar as minhas obrigações, sendo que só conseguia fazer o mínimo do mínimo, ou seja, com um grande empenho eu conseguia cumprir a parte que me era cabível.  

Eu sabia que os sentimentos e as tonturas, bem como tudo aquilo que passava, estavam exclusivamente em meu âmago, isto é, em minha mente. Constante era o esforço psicológico empregado para manter a sobriedade e não transparecer isso perante os olhos dos outros, pois eu mesmo não dispensava a possibilidade de estar fora do meu juízo perfeito. Acredito que por alguns instantes eu acabava tocando a loucura.  Aqueles que enxergavam meu semblante se deparavam com um ser tranquilo e sereno que chegava até a sorrir algumas vezes, mas que por dentro carregava a profunda tristeza, e o quase incontrolável desejo de ir atrás daquela moça. “Pouco me importa o local no mundo onde ela está agora, o que eu efetivamente quero é encontra-la” – eu pensava as vezes.

A saudade trazia uma tristeza gigante, sendo ela algo maior que o meu peito. Apesar de parecer algo obvio para quem vê de fora, foi somente entre o confuso choro e a caótica confusão sentimental que eu consegui perder quanto sou dependente dela. Por causa do transtorno que se passava comigo, as vezes eu me encontrava desesperado, com uma sensação de medo arrebatadora, que simplesmente surgia. Era como seu eu pudesse perder o controle dos meus atos a qualquer momento, sendo capaz de tomar atitudes que considero dignas de um louco. Muitas vezes no transcorrer do dia, enquanto exercia uma atividade qualquer, eu começava a sentir uma falta de ar puxando o ar com dificuldade. Quase sempre, junto com a custosa respiração, eu sentia o coração disparar e a mão transpirar. Era algo extremamente desagradável que eu não havia tido contato até o momento onde eu fiquei sem ela. Assim que o desespero começava a me sondar, o pensamento que vinha em minha mente instantes antes desse grande desconforto era “lá vem ele novamente... todo aquele mal estar está chegando”. Confesso que nas primeiras vezes que eu passei por isso fiquei muito assustado e achei que eu poderia perder o controle dos meus atos, mas depois que tive contato com esse pânico meia dúzia de vezes a minha percepção foi outra. Assim que o mal-estar vinha, em poucos segundos chegava a conclusão de que eu deveria apenas ficar quieto e respirar fundo, pois eu sou capaz de controlar os meus atos. Mesmo sem saber ao certo qual era o gatilho propulsor dessa avalanche sentimental, aos poucos fui me conhecendo melhor e criando a certeza de que sou alguém forte e que não existe mal que possa durar para sempre. No momento que esses desespero surgia eu não entendia o motivo dele aparecer, muito menos assimilar ao certo o evento gerador do mal estar, mas em minha mente eu acreditava que existia uma ligação com a saudade que eu sentia por ela. No meu âmago eu acreditava que a dor era proveniente do espaço deixado pela moça mais bela que eu já havia conhecido. “Como eu posso driblar isso?” – eu pensava nos instantes onde eu conseguia teorizar isso. Em um desses momentos de desespero eu percebia que alguns pensamentos que se apropriavam de mim eram desconexos e que simplesmente apareciam em minha mente. Era como se eu pudesse tomar uma atitude que não tivesse o menor respaldo na sobriedade. Eu sentia que poderia talvez xingar algum desconhecido que passava pela rua, ou que eu pudesse deixar de fazer as minhas obrigações – algo inimaginável em minha mente -  bem como mandar o meu chefe para o inferno ou abrir o portão do vizinho para ver o seu cachorro que não parava de latir ia embora (mesmo levando em conta o fato de eu adorar os animais).

Tais pensamentos na realidade serviam apenas para mostrar que os meus sentimentos estavam confusos e que o meu cérebro não sabia o que fazer quando se deparava com a saudade deixada por ela. Se por um lado a loucura insistia em querer me encontrar as vezes, por outro lado que isso era proveniente do fato de eu ser humanos, já que não conseguia superar a dor de estar ao lado de quem eu desejava constantemente e incansavelmente.  Com ela distante, a minha mente ficava confusa e eu me encontrava sem saber ao certo o que fazer, o que pensar, para onde ir ou com quem conversar. Eu tinha a plena ciência de que esses pensamentos mostravam que distante dela a minha mente funcionava de forma irregular ou defeituosa. Eu sabia que pensamentos nunca ganhariam vida, mas como a dor era grande eu precisava tomar alguma atitude para afastar a melancolia de mim. Seria incapaz de fazer qualquer coisa  com qualquer animal, ainda mais eu que gosto muito do cachorro do vizinho. Não mandaria meu chefe para o infernos porque isso não faz parte do meu ser, embora as vezes ele merecesse, bem como eu continuava cumprindo minhas obrigações por acreditar que isso é o mínimo que um homem deve fazer, dentre outras.

Falar agora no momento que a saudade está mais amena é fácil, sendo difícil passar por toda aquelas sensações no momento que a tristeza se apossa, me encontrando com os sentimentos aflorados e feridos. Ao pensar que eu poderia estar ao lado dela mas que isso não era possível, a situação incomoda chegava e adentrava sem pedir permissão: a boca secava, a fome ia embora, a dor de cabeça surgia do nada, uma fraqueza tomava conta de mim e as vezes um descomunal sono que me fazia apenas querer dormir. O dia perdia o sentido, a noite não tinha razão para existir e a vontade de ir ao encontro dela ganhava força. No momento que eu me deparava com a realidade e percebia que não poderia encontra-la, a tristeza se encontrava com o peito solitário e me aplicava uma rasteira perfeita, como se a vida fosse uma luta, e eu estava sendo naquele instante espancado.

Era muito triste saber que eu não iria encontra-la nunca mais.

Te amo, mas por favor... comece a namorar.Onde histórias criam vida. Descubra agora