As Duas Pedras

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Henrique corria como atleta profissional quando queria. Adorava sentir o vento no rosto, o corpo se deslocando cada vez mais, as árvores dos lados levemente se transformando em um redemoinho verde. O corpo magrelo parecia voar nas curvas daquele caminho barroso e empoeirado. Os cabelos, negros e longos, esvoaçavam em contraste com um sorriso que, enquanto não parasse, não saía dos lábios. Não corria para chegar mais rápido, não corria contra o tempo, não corria por nada - somente por gostar de correr. Correr para ele era como voar. Nunca tropeçava, nunca. Mas aquele dia era um dia diferente, então Henrique tropeçou. Tropeçou e caiu. Mas não resmungou (como a maioria faz), riu-se, levantou-se, sacudiu a poeira da bermuda azul que, de tão desgastada, já adquirira uma cor esbranquiçada e pensou em correr novamente. Nesse exato instante olhou para baixo, e viu, viu o objeto que ocasionara sua queda rebrilhando com a luz já forte de um sol de dez horas.

- O que é isso? - indagou alto para si mesmo, no instante em que se abaixava para apanhar o tal objeto, uma vistosa pepita de ouro. Sem muita cerimônia, depositou a pedra no bolso e recomeçou a correr. Mas à frente se deteve mais uma vez e, encontrando uma outra pedra normal (que não possuía valor algum), abaixou-se, pegou-a e a pôs em companhia da pepita de ouro. Correu. A estrada agora parecia maior. Henrique se esforçou como nunca. De longe se ouviam gritos, não gritos apavorados: gritos de quem está se divertindo e não consegue manter oculta a alegria de tal diversão. Henrique foi se aproximando do rio rapidamente e, da ribanceira mesmo, deu um salto e caiu dentro da água. Ali já se encontravam Lazinho, Panheco e Vedson - seus amigos mais queridos. Por baixo d'água, Henrique foi nadando até pegar na perna de um dos amigos e este se assombrou. Mas logo em seguida ele deixou a cabeça à mostra e tudo se transformou num sorriso coletivo. Na hora do Pega-pega foi que complicou, Henrique sentiu que as pedras que pesavam em seu bolso o atrapalhavam e que não havia chance de nadar bem com todo aquele peso junto ao corpo. Resolveu se desfazer das pedras. Enfiou a mão no bolso enquanto Lazinho tirava Ímpar ou Par com Vedson, puxou as duas pedras e as atirou no meio do rio.

Panheco, vendo tudo, quis saber:

- O que era aquilo?

- Peso. - respondeu Henrique, sorrindo. E a brincadeira começou. É! Não percebemos oque perdemos quando não sabemos que isso faria diferença.

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