Capítulo 2

144 19 105
                                    

Toco a tecla central e fria do meu telefone celular checando a hora: 23:42. Desde que decidi deixar de fumar, qualquer espera é torturante, a ansiedade toma conta do meu corpo e não consigo parar de pensar no cigarro. Tomo o último gole do uísque, já em temperatura ambiente e aguardo Sol voltar enquanto tamborilo o balcão do bar com os dedos, extraindo um som percussivo que lembra a batida de uma música cantada por ele há pouco mais de uma hora.

— Hoje ele demorou um pouco mais na sala do administrativo. - Josias analisa com seus olhos claros minhas mãos inquietas.

— Tudo bem, - Sorrio com cordialidade para o bartender corpulento de cabelos castanhos e procuro minha goma de mascar com sabor de menta no bolso no casaco, ouvi dizer que ajuda a tirar o foco do vício. - não estou com pressa. - Complemento e ele me abre um meio sorriso que o deixa com uma face desagradável.

— Sei que já fechou sua conta, mas vou organizar o bar para encerrar meu turno. - Ele levanta a garrafa de vidro com o líquido âmbar pela metade e afrouxa a gravata preta - composição do seu fardamento preto e branco formal - de seu pescoço com a outra mão. - Aceita mais alguma dose?

Passos fortes e marcados no piso de madeira ressoam atrás de mim. O rapaz desvia a atenção me induzindo a acompanhá-lo.

— Fico feliz que tenhas me esperado! - Sinto a animação por trás do tom de voz do Sol e levanto-me para encontrá-lo. Tudo isso por minha causa? Caminho confiante em sua direção dando-lhe um abraço e recebendo um beijo rápido em cumprimento no canto da boca. Sinto meus olhos escuros esconderem-se com o arqueamento das minhas maçãs do rosto quentes e possivelmente coradas.

Confesso que esperá-lo não foi um grande sacrifício, encontrei nele algumas características que me chamam atenção com certa facilidade: Peitoral largo, altura e rosto harmônico são atributos físicos que geralmente chamam minha atenção inicial em um homem. Mas o ponto chave para eu esperá-lo foi sua ousadia. Convidar-me para ficar foi uma surpresa bem agradável. Não que eu não seja flertado nos bares da vida, mas geralmente isso acontece com números de telefones tímidos em um pedaço de papel ou apresentações formais através de amigos em comum e que sabem da minha orientação sexual.

— Me acompanha em uma bebida? - Convido-o reaproximando do balcão, tocando suas costas.

Me respondendo com um sorriso expansivo, ele assente com a cabeça e chama a atenção do bartender:
— Josias, manda o de sempre para mim e para o Ricardo... - Aponta-me com a mão.

— Outra dose. - Solicito e ele confirma com a cabeça o entendimento sem nos olhar de volta, apenas puxa o canto da boca discretamente, aparentemente incomodado. Acredito que por estendermos um pouco mais sua hora de saída.

— Jô, - Sol o chama novamente com simpatia e o rapaz, agora carrancudo, aloca uma garrafa de vodka no suporte, que faz um barulho seco quando toca seu peso no balcão voltando-lhe sua atenção. - Capricha que hoje é um brinde especial. - Brinca abrindo um sorriso sem perceber a irritabilidade do funcionário do bar.

— Você não prefere beber em outro lugar? - Sugiro sussurrando próximo ao seu ouvido para que o rapaz não perceba, sentindo seu perfume, amadeirado e levemente apimentado, invadir minhas narinas quando ele inclina o pescoço mais para perto dos meus lábios. Seu corpo responde a suavidade do meu toque e um leve espasmo de susto toma conta do meu quando sua mão acaricia discretamente minha perna, longe da vista do outro rapaz.

Levanto minhas sobrancelhas e arregalo os olhos encarando-o com um sorriso prestes a saltar da minha boca, seu toque é bom, mas me sinto constrangido com a possibilidade de outra pessoa ver-nos.
— Ah... - Ele se aproxima do meu rosto e completa baixinho: — Podemos, mas queria brindar um momento importante de hoje antes de sair. Pode ser?

Ruídos no Amor (LGBT) Onde histórias criam vida. Descubra agora