Nathaniel pegou seu grande casaco, entrou dentro de seu carro e se pôs na estrada, em busca da mansão dos Putkins. Na noite anterior, depois do relato de Thomas Putkins, em comum acordo, todos decidiram deixar a casa, abdicando do jogo da Casa da Lenda.
Buzinou diante do grande portão da mansão e foi recebido por um porteiro desconfiado. Por uns segundos, ao ver o porteiro falando num interfone, achou que o velho idiota declinaria seu pedido para entrar. Entretanto, foi agradavelmente surpreendido pelo rangido do velho portão de ferro se abrindo diante dele.— Obrigado. — Balançou sutilmente a cabeça em agradecimento.
Vladimir recebeu Nathan melhor do que se esperava de um assassino que estava diante de uma investigação policial e levou-o pelo salão central até um aposento reservado cheio de livros antigos, quadros esotéricos e amuletos pendurados. De fato, aquele velho caquético, enfiado naqueles trajes roxos com uma grande margarida branca no peito, era muito bizarro. Não era de se duvidar que fosse mesmo louco, bem como Thomas o havia acusado de ser.
— Veja só como o mundo dá voltas, caro inspetor Buckers. Você aqui no meu escritório, depois de todos os dissabores que me fizera passar em suas investigações passadas.
— O que o senhor chama de dissabores, eu chamo de ilegalidades, Vladimir. Às vezes, milionários como vocês se veem como deuses que estão acima do bem e do mal. Acham podem fazer tudo que quiserem. Mas felizmente homens como eu existem para lembrá-los de que são cidadãos sujeitos a lei como todos nós.
Vladimir riu.
— Águas passadas, inspetor Buckers. Creio que sua presença em minha casa se dá por outros motivos. Estou certo?
— Está. Quero ouvir bem suas motivações sobre os assassinatos na velha casa dos Etrius antes de leva-lo daqui para uma cela que o senhor desfrutará até o fim da vida.
— Ora, ora. És muito ousado, inspetor. Vem à minha casa... sozinho, para fazer ameaças e acusações infundadas à minha pessoa? Onde está a consideração do senhor pela nossa velha amizade?
— Não somos amigos. E... infundadas? Faça-me o favor, Vladimir. Você organizou o jogo, colocou seus inimigos na casa, começou a matar pessoas e ainda acha que vai sair impune?
O semblante de Vladimir mudou, mas não foi para um de medo como Nathan esperava. Foi para um de comiseração, o que deixou Nathan profundamente surpreso.
— Seria bem mais fácil para todos nós se essa sua versão da história fosse a verdadeira.
— Existe uma outra versão que queira me contar?
— Sim. Não sou eu o assassino. Preferia até fosse, mas o verdadeiro culpado de todas as mortes na casa é outra pessoa.
— O que você quer dizer com isso?
— Meu filho e Kristen, aquela rameira vulgar. Eles organizaram isso tudo, inspetor. Se aproveitaram da minha velhice e do meu gosto por histórias de fantasia para me fazer parecer louco perante a sociedade.
— Me desculpe, Vladimir, mas essa mentira não vai colar. Por quê seu próprio filho faria isso?
— Pelo dinheiro, inspetor. Por quê mais? — Vladimir girava o grande anel de prata no dedo — Thomas começou a namorar aquela vagabunda da Kristen. Quando aconselhei-o sobre ela, por pura afronta, decidiu noivar e anunciar um casamento. Deserdei-o então. Foi quando os dois tramaram contra mim para me fazer parecer louco e me tomar tudo que tenho sob a alegação de demência, acionando um dispositivo judicial de interdição por prodigalidade.
— Vai precisar mais que uma historinha para me convencer, Vladimir.
— Vo... — Vladimir arregalou os olhos e agarrou com violência seu peito. Alarmado, Nathan colocou a mão em seu coldre, imaginando que ele o atacaria. Mas antes que pudesse tirar de lá seu revólver, viu que o velho começou a babar, revirar os olhos e tossir com tanta força, que parecia a Nathan que iria cuspir seus órgãos.
— Vladimir?
Largou a arma e se aproximou do velho para socorrê-lo, mas Vladimir parou de se contorcer. Balançou o velho para tentar obter dele alguma resposta. Era tarde demais. Vladmir Putkins não falava, não reagia e não respirava. Estava morto.
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Etrius
Short StoryUma casa, uma lenda, um magnata obsessivo e uma fortuna. Os perigos podem ir além da compreensão de cada um dos diferentes participantes daquele jogo. Muitos segredos e um culpado. Quem será o vencedor?