Capítulo 02

72 9 5
                                    


Becca não conseguiu acreditar. 

Ela já estava tentando não surtar com o fato de que ele havia, provavelmente, trocado a roupa dela. A ressaca também amenizava o constrangimento por isso, fora a dor de cabeça lancinante. Porém, jogar o seu vestido novo no lixo era uma coisa bem diferente. Mais grave até.

Como ele se atreveu?

Ela seria capaz depular naquele pescoço bonito e esganá-lo até a morte. 

— Você fez o quê? — a voz dela saiu esganiçada.

O sorriso sumiu do rosto dele.

— Olha... Você não iria dormir na minha cama suja de vômito, falou? E você estava suja pra caralho. Eu não queria, mas tive que te dar banho e...

— VOCÊ TEVE QUE O QUÊ?

— ... eu não iria lavar o seu vestido no estado em que ele estava, então apenas joguei fora — ele concluiu.

Isso já era muito para ela aguentar. Olhou-o com descrença. 

A raiva superou a vergonha por ter sido lavada e trocada por um completo desconhecido. Um desconhecido gato, diga-se de passagem. E ainda ela nem sabia quem diabos ele era.

Becca segurou um travesseiro com força e, soltando um grito de raiva, arremessou bem no meio da cara dele.

— QUAL É O SEU PROBLEMA, GAROTA? — ele desviou do segundo travesseiro e foi em direção à porta, rindo.

Rebecca pulou da cama. Agarrou o abajur que estava no criado mudo e levantou o braço. Ah, ela iria quebrar o abajur bem na cara perfeitinha dele. Ah, como ela iria.

Só precisava se aproximar o suficiente para fazer isso.

Ela avançou fuzilando-o com o olhar, mas sentiu o braço ser puxado para trás de uma vez. Ela havia se esquecido de tirar o abajur da tomada. Por Deus, será que nada dá certo pra mim?

Ainda lançando um olhar fulminante para o desconhecido, que estava escorado na porta olhando-a, ela voltou para puxar o do abajur.

— Você precisa de ajuda? — ele tentava sufocar uma risada.

Becca o ignorou.

— Algum problema? Ouvi gritos.

A voz delicada fez com que Becca olhasse para a porta. Uma garota ruiva, alta, mais parecida com uma modelo, estava ao lado do homem, observando-a. O corpo malhado dela ficava à mostra com a curta camisola preta que usava. Preto outra vez. Os olhos verdes da recém-chegada demonstravam uma ligeira curiosidade.

Será que estão juntos? Provavelmente.

Becca colocou o abajur de volta ao seu lugar e se endireitou para encarar a ruiva. 

— Eu me chamo Katrina — a ruiva começou. — Espero que você esteja melhor. Ficamos preocupados ontem. Você vomitou muito no banheiro da boate e desmaiou logo depois — Becca continuava em silêncio. — Te trouxemos para cá e eu te dei um banho. Espero que você não se importe — e deu um sorriso como um pedido de desculpas.

— Você me deu banho? — Becca franziu o cenho, visivelmente confusa.

— Sim. O Chris não te disse? — a ruiva olhou para ele, interrogando-o com o olhar.

— Ele deve ter se esquecido desse detalhe — Becca respondeu amargamente, fuzilando Chris com o olhar.

Ele nem piscou, apenas lhe deu um sorriso sacana. Babaca.

— Olha, Katrina, me desculpe pelo transtorno e obrigada pela ajuda. Estou muito grata, de verdade. Garanto que não costumo desmaiar em banheiros públicos e acordar em casas de desconhecidos — Becca ofereceu um sorriso, tentando amenizar o clima. — Eu só preciso de uma coisinha antes de ir embora. Você pode devolver a minha bolsa e os meus sapatos? 



• • • ☾ • • •



Becca calçou o salto fino preto e pegou os óculos de sol da sua bolsa vermelha. Olhou rapidamente no espelho da sala – adivinhe? Também preta. – e ajeitou o longo cabelo escuro. Seus olhos castanhos fitaram a palidez da sua pele com descrença. Ela estava horrível. Completamente horrível.

E foi assim que ela saiu da casa do cara – do Chris -, consciente de que a blusa cobria somente a metade das suas coxas e estava exageradamente folgada.

Ela percebia os olhares nada discretos em sua direção.

Após recuperar os seus pertences, ela recusou a carona do Chris (que foi oferecida sarcasticamente pelo mesmo), apesar da insistência de Katherine. Ela não precisava passar nem mais um segundo na presença dos dois. Principalmente na presença dele.

Toda a situação foi embaraçosa e fora do comum.

Não era nem meio-dia e as ruas já estavam lotadas. Ela só torceu para não encontrar nenhum conhecido pelo caminho. Que Deus me ajude. Não via a hora de chegar ao apartamento e poder tomar um banho.

Por sorte a casa do Chris não ficava muito longe da sua. Essa era uma vantagem de morar em uma cidade pequena.

Quando chegou à sua kitnet, ela suspirou. O lugar era simples e básico, mas servia bem. Havia apenas uma sala com cozinha embutida, um banheiro e um quarto. As paredes e o piso eram brancos, com pouca decoração.

Lar, doce lar.

Becca colocou o celular para carregar e foi tomar um banho. Largou a camisa do Chris no chão. Depois seria a vez dela de jogar a roupa no lixo. A vingança é doce.

Após o banho, já deitada na sua cama, ela ficou surpresa quando ligou o celular e não viu nem mesmo uma chamada perdida da sua melhor amiga.

Ela havia desaparecido da festa e não merecia uma ligação de preocupação?

Bela melhor amiga você, Jenny. Becca resmungou enquanto ligava para a amiga.

— Oi, Becca — uma voz alegre a cumprimentou após alguns toques.

— Ei, Jenny. Você não va... 

— Sua safada. Quem era aquele cara? — Jenny a cortou, totalmente empolgada.

Becca franziu o cenho levemente. Não queria acreditar que Jenny a deixaria ir embora de uma boate, visivelmente alterada, com um completo desconhecido.

— Cara? Qual cara?

— O cara da voz rouca que você transou, Rebecca. Já me esqueci do nome dele.

Becca respirou fundo algumas vezes.

— Por um acaso o nome dele é Chris?

— ISSO — Jenny gritou, animada. — Eu te liguei algumas vezes no final da festa. Você simplesmente sumiu e eu fiquei de-ses-pe-ra-da, com medo de você desaparecer também. E se você fosse morta? Como eu iria suportar a faculdade sem você?

— Calma, Jenny. Respira.

Jenny a ignorou.

— Aí quando eu estava quase desistindo e cancelando a chamada, o tal do Chris atendeu e explicou que você estava na casa dele, com a boca muito ocupada naquele exato momento.

— COM A BOCA O QUÊ? — Becca surtou. Aquele desgraçado.

— Na hora eu pensei "essa é a minha amiga" e desliguei.

— Eu não transei com ele — Becca torceu para encontrá-lo mais uma vez. Iria socá-lo até quebrar o nariz.

Ou alguns dentes.

— Como assim? — a voz da Jenny soou desanimada.

— Bom... — Becca levantou da cama, indo em direção à cozinha. — Enquanto te explico o que aconteceu, vou preparar algo para comer. Estou faminta e com uma puta ressaca.

Devora-meOnde histórias criam vida. Descubra agora