Conforme o dia do presságio ia chegando, Nym tinha pesadelos com sua morte ou pior, com a morte de Hyka.
Como Nym era muito franco com seus sentimentos Hyka via e sentia tudo. Os medos e desejos. Ele sempre acabava indo pra cabana da floresta no meio da noite.
Nym, protestava.
- É perigoso vir no meio da noite! E mais, você tem que descansar.
Mas, Hyka percebia o alívio do companheiro toda vez que ele chegava.
- Cala a boca, Nym.
O cotidiano da aldeia não se alterava. Hyka já tinha marcado uma reunião do conselho com seu irmão mais velho e agora chefe do clã.
- Malloy, me escuta! Temos que preparar a defesa da aldeia. Essas décadas de paz nos deixaram despreparados. Guerreiros tornaram-se fazendeiros, caçadores. Me escuta!! Pelo amor dos Deuses!!!
- Você sempre foi exagerado, Hyka. E aquele Nym... Só quer aparecer. Nunca fui com a cara dele.
- Malloy, isso é sério!! Me escuta! Você nunca me levou à sério por eu ser seu irmão caçula, né?!!
- Chega, Hyka!! Eu não vou causar pânico na aldeia por causa de pesadelos e suposições!!
E saiu pisando duro.
- Que merda! Me escuta pelo menos uma vez, irmão! Disse num sussurro.
Numa manhã, Hyka estava na cabana de Nym e a floresta emanava tensão. De repente alguns animais passaram fugindo, revoada de pássaros que viviam perto do mar.
Olhando para o céu Nym disse:
- Começou! Hyka, você, como mensageiro, deve avisar as aldeias e pedir ajuda. Nós somos a primeira aldeia, os invasores terão que passar por nós, primeiro. Eu vou alertar Malloy.
- Malloy não vai dar ouvidos pra nada que você diga.
- Eu não vou precisar dizer nada. Agora, vai!! Não temos muito tempo.
Hyka pegou algumas coisas e saiu correndo. Nym pegou seu cajado, olhou em direção da aldeia, suspirou e correu.
Nym chegou junto com as primeiras flechas incendiárias
Nym chegou junto com as primeiras flechas incendiárias. Malloy olhava paralisado no meio da aldeia.
Nym tocou seu ombro e ele pulou.
- Malloy, evacue a aldeia. Mande as mulheres, crianças, velhos e doentes para a floresta. Diga para usarem minha cabana como refúgio. E junte os guerreiros. Vou segurar os invasores pelo tempo suficiente.
Malloy acentiu e saiu apressado organizando os aldeões e os guerreiros. Nym correu para a extremidade da aldeia. Levantou seu cajado e o fincou na terra dizendo:
- Ancestrais, venham em meu auxílio!!
No mesmo instante o chão começou a tremer e o solo a rachar.
Longe dali, Hyka via a fumaça vindo de sua aldeia e corria mais rápido.
- Tenho que voltar a tempo.
*******
Quando Hyka chegou na aldeia a batalha estava por todo lugar. Ele corria desviando, procurando, o coração acelerado pela ansiedade.
Por onde andava, para onde olhava era só fogo, sangue e morte.
Hyka se acalmou um pouco e se concentrou nos pensamentos e sentimentos de Nym.
- Achei!! Hyka correu para onde sentiu a presença de Nym. Na extremidade da aldeia onde fica o cemitério. A parte mais próxima do mar.
Quando Hyka chegou o local era um amontoado de corpos humanos e não-humanos. A luta estava no final. Ao longe, perto da parede de pedra ele viu Nym usando sua energia restante para segurar o golpe que descia sobre ele.
O olhar de Nym encontrou o de Hyka.
- Você está aqui. Eu queria te ver mais uma vez.
Foi o pensamento que Nym enviou.
- Nããoo!! Hyka começou a correr enquanto o golpe acertava Nym em cheio. E sorrindo ele tombava numa poça de sangue.
- Por que você não usou o seu talento. Como você usou quando era criança?
Hyka estava ajoelhado no chão com Nym nos braços. Nym tentava enxugar as lágrimas de Hyka.
- Não chore... Eu estarei sempre com você.
- Por que? Por que não usou? Por que eu tenho que ficar sem você?
- Quando eu usei aquilo, matei tudo e todos à minha volta. Eu aniquilei minha aldeia. Mas, eu não sabia... Foi instinto. - Disse Nym num sussurro.
Hyka sentiu a vida de Nym se esvaindo. Ele o apertou forte junto ao corpo. Respirou fundo sentindo tudo ao redor.
- Se isso não der certo... Vou me juntar a você mais rápido do que você imaginou.
De repente uma luz, como uma explosão, envolveu os dois numa cúpula brilhante.
Depois tudo era silêncio. Hyka deixava as lágrimas caírem sobre o corpo inerte de Nym, enquanto balança pra frente e pra trás, como se embalasse uma criança pequena.
Ele sentiu uma mão pousar em seu ombro. Malloy não sabia como consolar o irmão.
- Tivemos muitas perdas hoje, mas não existiria mais nada se não fosse ele.
Hyka não conseguia falar nada. Só acariciava o rosto de Nym.
- Hyka, eu sei como se sente. Mas, a aldeia precisa de você. Tem feridos para serem tratados, mortos a serem enterrados e sobreviventes que precisam de conforto.
Hyka balançou a cabeça. Levantou carregando o corpo de Nym nos braços. Agora ele era O xamã da aldeia.
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Luz e Sombra [Completo]
Short StoryToda tribo tinha dois xamãs naqueles tempos. Um cuidava das festas, nascimentos, casamentos e das histórias. E um outro. Que cuidava dos doentes, dos moribundos, dos enterros e da morte. O primeiro era chamado de xamã da Luz e vivia no meio da tribo...