39-Texto 9

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(…) que perdoar não é apagar, que perdoar não é esquecer. Então, é o quê? É cessar de odiar, e é essa de fato a definição da misericórdia: ela é a virtude que triunfa sobre o ressentimento, sobre o ódio justificado (pelo que ela vai além da justiça), o rancor, o desejo de vingança ou de punição. A virtude que perdoa, pois, não suprimindo a falta ou a ofensa, o que não é possível, mas cessando de, como se diz, ter raiva de quem nos ofendeu ou prejudicou. Não é a clemência, que só renuncia a punir (podemos odiar sem punir, assim como punir sem odiar), nem a compaixão, que só simpatiza com o sofrimento (podemos ser culpados sem sofrer, assim como sofrer sem sermos culpados), nem enfim a absolvição, entendida como o poder – que só poderia ser sobrenatural – de anular os pecados ou as faltas. Virtude singular e limitada, pois, todavia bastante difícil e bastante louvável para ser uma virtude. Cometemos faltas demais, uns e outros, somos miseráveis demais, fracos demais, vis demais, para que ela não seja necessária. 


André Comte-Sponville

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