Capítulo 2

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Morávamos no décimo andar de um prédio em Copacabana. Logo que entramos no elevador e as portas se fecharam, percebi um olhar angustiado no rosto da menina. Achei normal, pois ela nunca havia entrado em um elevador. Porém, ao passarmos pelo quarto andar, ocorreu um forte baque na porta, como se alguém tivesse dado um chute ou atirado alguma coisa. Achei que devia ser bagunça das crianças do quarto andar. Ali moravam uns quatro "capetinhas".

Quando chegamos em casa, as duas entraram e eu fiquei colocando a bagagem para dentro. Entrei e fechei a porta. Ainda não tinha dado três passos em direção à sala, quando ouvi duas fortes pancadas na porta de entrada, como se tivessem batido com um martelo ou coisa parecida. Voltei rapidamente e abri a porta. Não havia ninguém. Quando olhei para o chão, vi duas pedras do tamanho de uma mão fechada caídas sobre o capacho ao pé da porta. Corri pelo corredor para ver se ainda pegava alguém fugindo, sem obter sucesso. Volte, entrei em casa e disse que no dia seguinte me queixaria com o síndico. Vitória foi abrir a porta que dava para a varanda da frente. Safira sentou-se no sofá da sala, com as pernas bem juntas e as duas mãos entre os joelhos. Estava encolhida e assustada, como se tivesse culpa de alguma coisa.

– Você não quer tomar um banho? – perguntou Vitória estendendo uma toalha à menina.

Safira entrou no banheiro, abriu a torneira, mas deixou a porta entreaberta. Vitória foi até lá e deu duas batidinhas na porta.

– Aqui nós tomamos banho com a porta fechada – disse minha mulher. – Fecha você mesma, por dentro. Está bem? – e puxou a porta.

Ouvimos lá de dentro um "não", rápido e baixinho.

Vitória entrou no banheiro e explicou à menina que, na nossa, casa ninguém tomava banho de porta aberta. Fechou-a e foi se sentar ao meu lado, no sofá. Cinco segundos depois, três pancadas idênticas às da porta da frente, ocorreram na porta do banheiro. Pensamos que a menina havia caído de encontro à porta e corremos para acudi-la, porém, paramos estarrecidos diante da porta do banheiro. No chão, ao pé da porta, estavam três pedras, cada uma maior do que uma laranja e, na altura do nosso peito havia três marcas de amassados na pintura da porta, deixadas pelo impacto das pedras. Como poderia aquilo ter acontecido? Estávamos no décimo andar, e a porta do banheiro ficava voltada para a parede do corredor. Não havia nenhuma janela por perto que justificasse as pedras terem sido atiradas de fora. Por onde, então, entraram aquelas pedras?

Percebemos que Safira chorava baixinho dentro do banheiro, assustada.

– Pronto! Fique calma. – disse Vitória abrindo um pouco a porta. – Termine seu banho. Nós vamos ficar aqui esperando. Eu vou deixar entreaberta, está bem? – completou, tentando acalmar a menina.

Eu sabia que Vitória estava percebendo alguma coisa. Ela tinha certo "faro" para coisas para-normais, e fez um sinal com a mão para eu me acalmar e aguardar a solução.

Quando Safira saiu do banheiro, Vitória pediu para ela se sentar no sofá ao nosso lado.

– Você quer falar alguma coisa? – perguntou Vitória.

Com poucas palavras e muitas reticências, a menina começou a contar que, desde muito pequena, antes dos três anos de idade, seu pai a prendia em um quarto escuro como castigo, deixando-a lá o dia inteiro ou a noite toda, sem comer, por mais que ela chorasse e batesse na porta. Às vezes adormecia com fome e frio. Muitas vezes só era libertada pela manhã. Foi em uma dessas noites que as pedras começaram a bater contra portas e janelas.

– O que a sua mãe fazia nessas horas? – perguntei.

– Minha mãe tinha medo dele.

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A MENINA QUE ATIRAVA PEDRASOnde histórias criam vida. Descubra agora