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— Onde é que ele está? — Jéssica perguntou, andando em círculos pela enfermaria — O Bento já devia estar aqui.

Eveline suspirou pacientemente. Entendia o desespero da jovem, mas Miguel saíra havia pouco mais de quinze minutos. Sabia, contudo, que era impossível argumentar com Jéssica quando ela estava agitada, e que era particularmente mais difícil quando se tratava de Pedro. Ela passara os últimos minutos alternando entre voltas na sala, checar a janela e segurar firme a mão de seu parabatai.

Eveline não a julgava. Se Jurema, sua parabatai, ainda estivesse viva, e fosse ela naquela maca, ela provavelmente faria o mesmo. Levou a mão ao peito, onde a runa, quase desaparecida com o tempo, parecia ainda cravada em seus ossos. Não havia um só dia em que não sentisse falta de Jurema. Não desejava aquela dor nem ao seu pior inimigo.

— Tenho certeza de que eles... — ela parou seu discurso tranquilizador quando ouviu o som da porta do Instituto se abrindo — Olhe só. Chegaram.

Jéssica correu para fora antes mesmo que ela tivesse a chance de se mexer. Quando alcançou a porta, ela já voltava, praticamente arrastando Bento, quase irreconhecível em seus trajes femininos. Eveline já o vira travestido vezes o suficiente para não se surpreender, mas não pode deixar de notar o olhar de confusão estampado no rosto de Miguel.

— Muito bem, muito bem, onde é a emergência? — Bento disse, tentando soar casual. Jéssica, prostrada ao lado da maca apontou para o ombro ferido de Pedro.

— Ferida de demônio. — foi tudo que ela disse.

Bento se inclinou para enxergar melhor e torceu o nariz.

— Alguém viu o que aconteceu? Sabem que tipo de demônio foi? — perguntou, olhando de Jéssica para Eveline. A última assentiu.

— Havia uma garota com ele. Miguel... — ela chamou, um pouco mais alto — Pode chamar a Mariana, por favor?

— Não precisa. — disse uma voz, então, saída das sombras — Eu estou aqui.

Mariana saiu de um canto escuro da enfermaria, onde estivera camuflada por sabe-se lá quanto tempo. Eveline sequer a havia visto entrar; estivera tão ocupada com Jéssica e preocupada com o bem-estar de Pedro que acreditara que a garota ainda estava no quarto que Eveline havia separado para ela.

— Ele era grande. — ela prosseguiu, sem que ninguém precisasse perguntar — Parecia uma sombra no começo, e aí meio que foi... crescendo. Não tinha rosto, só cabeça, tronco e braços. Vários braços. As garras de um deles foi o que fez isso aí.

— Hm. — Bento bateu o indicador no queixo, pensativo — Isso restringe um pouco as coisas. Vou fazer uma lista do que vamos precisar.

— Miguel... — Eveline chamou, mas ele já estava se adiantando.

— Opa, pode deixar! — disse o garoto, correndo atrás de Bento como um cachorrinho.

Com tudo momentaneamente sob controle, as atenções de Eveline recaíram novamente sobre Mariana. Ela parecia perdida no meio da enfermaria, parada, encarando a movimentação, enquanto Miguel saía em disparada, Bento colocava-se a trabalhar e Jéssica andava impaciente de um lado para o outro. Quando Eveline se aproximou, ela tremeu de susto e tentou conter-se encarando o chão.

— Você já comeu? — Eveline perguntou, em voz baixa, para não atrapalhar o trabalho de Bento, que entoava encantamentos, as mãos sobre o peito de Pedro. Mariana balançou a cabeça — Eu também não. Vamos até a cozinha, que tal?

Cidade da Meia-NoiteOnde histórias criam vida. Descubra agora