Capítulo 2: A Marca da Morte

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A mesa estava farta. Mariah e William preparam um banquete de café da manhã. Eu estava faminto, então mal esperei que eles se sentassem e já estava atacando a comida. Eu parecia um animal, ou uma criança gorda na Fantástica Fábrica de Chocolates, tanto que pude ouvir Mariah rir, mas continuei comendo. Depois que matei minha fome, William resolveu me contar quem era o Recolhedor.

- Bem Josh, como você pôde ver, o Recolhedor é real. - Começou a falar William, com um semblante sério. - Ele vem apavorando as pessoas desta cidade já faz algum tempo. As autoridades não conseguem uma pista sequer sobre quem ou o que possa ser o Recolhedor. Ele simplesmente não deixa rastros por onde quer que passe. É um verdadeiro demônio.

- Ontem a noite quando ele nos atacou, me pareceu mais um animal selvagem. - Falei. - Mas por que esse nome? O que ele "recolhe"?

- Há algum tempo atrás, crianças começaram a desaparecer, sempre a noite enquanto todos dormiam. No inicio todos pensávamos que eram sequestradores, porém nunca houve qualquer pedido de resgate. A policia investigou o máximo que podia com o mínimo de pistas que tinham, famílias começavam a acusar vizinhos e houveram brigas por diversas vezes. Era um inferno, ninguém sabia dizer onde elas poderiam estar, se vivas ou mortas. Então aconteceu, num fatídico dia, era noite e praticamente a cidade inteira estava na capela, o pastor da época reuniu todos para rezarem pelas crianças, para que voltassem em segurança para suas famílias. E então ao voltarem para suas casas os familiares que haviam perdido seus filhos tiveram uma amarga surpresa. Todos encontraram seus filhos em seus quartos, mutilados. Foi uma imagem aterrorizante. Nunca havíamos presenciado tal acontecimento. A Policia se mobilizou fortemente para achar o assassino, mas nenhuma pista foi encontrada, nada nenhuma pegada, pedaço de tecido, havia apenas uma mensagem ao lado dos corpos das crianças...

- Limbo puerorum, salve. Avete reditus tui. Quae a Domino sunt quae in hoc mundo, in sanguine traiecit. - falei, lembrando-me da frase na parede do quarto na casa dos Grace.

- Como sabe? - Perguntou William surpreso.

- Foi o que eu vi na casa dos Grace.- William tinha um semblante sombrio ao falar do assunto, e ficou com o olhar perdido encarando o nada por um tempo até que Mariah o trouxe de volta.

Terminamos o café da manhã com uma certeza, mediante aos problemas que aquela cidade tinha eu deveria estar grato por ter escapado com vida. O que me levava a outra questão, de acordo com William, eu estava sofrendo de amnésia, por isso logo depois do café ele me levou até o consultório residencial de um amigo, o Dr. Louis.

- Então esse é o rapaz que conseguiu escapar do Recolhedor? - Perguntou, ele parecia ter a mesma idade que William, esguio e levemente encurvado. Estava com seu jaleco branco, meio encardido na verdade, cabelos grisalhos, usava óculos, olhos cinzas, frios como gelo. - Qual seu nome rapaz?

- Joshua - respondi meio sem jeito.

- Só? - Continuou o Doutor. - Nenhum sobrenome?

- Desculpe, só consigo lembrar disso.

- Entendo - ele escreveu alguma coisa em seu bloco de notas. Pegou algo parecido com um palito e veio em minha direção. - Abra bem a boca. Certo, quantos anos tem?

- Eu não sei ao certo, Dr. Louis - realmente não sabia sequer minha idade. - Mas acredito que não sou tão jovem quanto uma das crinças indo para a escola, ou mais velho que os senhores frequentadores do saloon.

- De fato, é difícil dizer com exatidão, mas acredito que não passe dos 17. Agora vamos examinar essa cabeça - Ele apertou exatamente no local que William me acertou na noite anterior. Fez outras anotações e prosseguiu examinando para ver se não havia algum corte mais sério.

- Algum hematoma mais grave na cabeça dele? - Perguntou William que assistia sentado em uma cadeira no canto da sala.

- Na verdade, fora o hematoma ocasionado por você, não consigo achar mais nada aqui. - Ele então pegou o estetoscópio. - Vamos verificar os batimentos.

Os exames corriam normais, testou meus reflexos, alguns pequenos testes psicológicos, e então pediu para que eu tirasse a camisa para podermos fazer a pesagem, foi então que eles repararam em alguma coisa estranha nas minhas costas. Eu não fazia ideia do que poderia ser, pois não sentia dores nas costas, mas o Dr. Louis e William estavam intrigados. Mesmo sem saber exatamente o que eles viam, senti apenas um incomodo quando William tocou em uma região da minha coluna, próximo a nuca.

- Isso dói, Joshua? - Perguntou Louis, tocando no mesmo lugar.

- Não sinto nada - respondi - Por que a pergunta?

Ele não disse nada, apenas gesticulou para Willam, que após verificar o que o doutor apontava, foi até a janela com o semblante sério, ficou ali refletindo. Foi Louis quem resolveu quebrar a tensão daquele silêncio.

- Joshua - começou - Você possui uma marca, gravada na carne como se alguém tivesse usado uma faca em brasa, que forma este símbolo - Ele começou a rabiscar no papel e quando pareceu satisfeito me mostrou o que tinha desenhado. - No fim das contas eram três triângulos entrelaçados formando uma linha continua. Eu nunca tinha visto aquele símbolo, mas algo naquele desenho parecia querer me dizer algo e saber que aquilo estaria marcado em minha carne, como uma cicatriz só me fazia querer saber mais sobre quem eu sou e de onde eu vinha.

Enquanto eu encarava o desenho no papel, Louis continuou explicando o porquê de sua preocupação.

- Acredito que William não tenha lhe contado sobre o que aconteceu no passado com essa cidade.

- Na verdade, ele contou bem resumidamente - falei ainda pensando no desenho, William permanecia olhando pela janela, perdido em seus pensamentos.

- Muito bem - continuou Louis - o que ele não deve ter dito, é que alguns dias depois de aparecerem as crianças mutiladas, outros 3 corpos foram encontrados, mas esses não foram terrivelmente mutilados. - Louis se levantou e abriu uma das gavetas do arquivo em busca de algum documento. - Achei! Eu fiz algumas anotações, na época eu era assistente do meu pai que era o médico local.

Em suas anotações, Louis descrevia o estado dos corpos quando foram encontrados, eram anotações de um legista ainda inexperiente como ele mesmo disse, mas isso facilitou no meu entendimento. O primeiro corpo era de uma criança:

Frederico Albertini, onze anos, sexo masculino, órfão. Encontrado pelos cães da fazenda de Igris Madsen. Possui hematomas por todo o corpo, principalmente nos braços e no rosto. As roupas e cabelos estão chamuscados, e existe um forte odor de enxofre. Em consultório, foram encontrados marcas de arranhões ainda não identificado de qual animal. Nas costas, além dos hematomas já descritos, encontramos uma marca curiosa. Três triângulos entrelaçados, aparentemente gravado em carne antes da morte. Causa Mortis; Asfixia por inalação de fumaça.

- Essa primeira vítima deixou o delegado irritadíssimo - falou William, voltando para a conversa. - Os arranhões não pertenciam a nenhum animal que havia na fazenda, as roupas chamuscadas poderiam sugerir que o garoto foi até zona de queimadas que Igris fazia quando pretendia revitalizar alguma parte de suas terras, porém não havia queimadas desde o desaparecimento da primeira criança levada pelo Recolhedor, e temos a questão do enxofre. Não temos nessas terras qualquer caverna ou vulcão adormecido para emitir tal odor.

- O caso do pequeno Fred foi arquivado, após 3 meses de investigações que não levaram em nada. - Continuou Louis já me mostrando as fotos das outras duas vítimas


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⏰ Última atualização: Jul 13, 2020 ⏰

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