Capítulo 1: O Recolhedor

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Desperto, e me dou conta de que estou em um quarto deitado sobre uma cama macia e cheirosa. Ao lado da cama, próximo a janela, uma escrivaninha empoeirada e uma cadeira de madeira, onde repousam meus pertences. Esse lugar parece ser mais uma choupana humilde. Olho pela janela e vejo que o dia já havia raiado, colinas no horizonte são banhadas por uma grama verde clara. A brisa leve me surpreendente e de súbito, uma dor na nuca me desorienta. Sento-me na cadeira para não cair. Pego o diário e recordo-me da noite perturbadora em que passei.


Logo após ter visto a criatura de asas negras, uma coisa aconteceu. Por um instante tive uma lembrança de antes de cair no vazio. Lembrei-me do meu nome, Joshua. E me veio um rosto em minha mente vaga. Mal pude me recuperar da lembrança, a garota voltou a me chamar.

- Quem é você? Responda logo não temos muito tempo!

- Tempo de que? Por quê? E para o quê? - Foi tudo que consegui dizer.

Uma série de perguntas, que talvez fossem respondidas depois. Pois não demorou e ela me agarrou pelo braço me puxando morro a cima em direção a capela.

- Precisamos chegar na capela. Lá estaremos seguros. Eles não podem entrar lá. - dizia olhando por cima do ombro, com olhos atentos vasculhando o vilarejo - Temos que correr.

Mas então o som dos sinos badalando ecoaram pela noite. Ela parou de correr. Senti sua mão apertar a minha e começar a suar.

- O que houve? - perguntei. Mas não houve resposta.

Olhei de volta para a torre onde badalavam os sinos. Os ponteiros do relógio apontavam o número doze. Ecoava a décima badalada. E ainda estávamos parados. Enchi o peito de ar para perguntar à garota o que estava acontecendo. Mas ao soar da décima segunda badalada, um grunhido gutural rasgou a noite. Tão medonho e assustador que fiquei paralisado de medo. Fui arrastado novamente. Dessa vez mais abruptamente, que parecia que ela iria arrancar meu braço direito fora. Íamos em direção à porta da capela, quando aquela coisa apareceu. Ela surgiu do alto, caindo agachada diante de nós. Não pude ver sua face, apenas era possível ver seus olhos vermelhos dentro da penumbra. A coisa se pôs de pé, em resposta eu recuei um passo, e a garota me seguiu. Eu não sabia o que era aquilo, parecia um homem alto, de quase dois metros. Forte com ombros largos e braços longos. Vestia um sobretudo de couro velho e surrado e um chapéu que, fazendo sombra, ocultava a face. Era um homem, não fosse o fato de que ele grunhia feito um animal.

Ele avançou em direção a nós. Instintivamente começamos a correr e a gritar por socorro. A garota se postava logo atrás de mim, eu podia ver o medo em seus lindos olhos azuis, agora enormes e lacrimejantes. Voltamos para o vilarejo com a intenção de conseguir abrigo em uma das casas, mas a garota tropeçou e caiu. Eu me virei um pouco a frente e já me preparava para ajuda-la, mas era tarde, quando olhei para ela a coisa já estava a dois passos de nos alcançar. Minha reação foi instintiva. Peguei a bolsa de lado, e esperando pelo momento certo, a girei com toda a força que tinha nos braços. A bolsa acertou o rosto da coisa em cheio, que soltou um urro de dor. Isso deu tempo o suficiente para que eu e a garota pudéssemos fugir para um lugar em segurança. Encontramos uma casa que tinha a porta aberta, e sem pensar duas vezes ali entramos. Fechamos imediatamente a porta. Permanecemos em silêncio, prendendo até mesmo a respiração. Só quando vimos que estávamos a salvo, foi que respiramos.

- O que era aquilo? - perguntei ofegante.

- Antes de mais nada, qual é o seu nome e de onde veio? - me perguntou ela, seus olhos iam dos meus sapatos velhos até meus fios de cabelo empoeirados.

- Bom, meu nome é Joshua e é tudo que sei a meu respeito. - respondi o melhor que eu consegui - E qual é o seu nome?

- Me chamo Mariah - respondeu ela, tirando a poeira do corpo - Agora me diz o que você tem na cabeça para ficar perambulando na rua depois do por do sol? Quer morrer?

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