Capítulo 1 - Vício em cafeína

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  CPOV:  

  Assim como em todas as outras manhãs, eu tive que promover um debate interno comigo mesma antes do trabalho. Um tipo de incentivo, ou auto-afirmação. 

Eu estava sentada na cabine da minha picape Chevrolet 1953, com um copo de café fervendo em uma mão, já estacionada na minha vaga do estacionamento na Corporação Internacional Jauregui, murmurando para mim mesma como uma verdadeira louca. 

  "Karla Camila Cabello Estrabao, você é sortuda de ter este emprego. Então, grandes coisas se sua chefe é sensual como o diabo em pessoa e não faz ideia que você existe. Contente-se com o fato de poder ao menos pagar o aluguel."  

  Este era um argumento válido. Minhas amigas de infância, Ally Brooke e Dinah Jane, haviam escolhido um apartamento particularmente caro para nós todas dividirmos. Eu teria ficado feliz em morar sozinha, mas Ally havia feito um pacto - aos cinco anos de idade - de morarmos juntas, um pacto muito sério. E quando Ally levava algo a sério, ceder às vontades dela era a melhor opção.  

  Nós três tínhamos vinte anos, e enquanto as duas estavam em seus últimos anos de estudos, meu curso de administração exigia um ano de experiência - como um estágio - entre o segundo e o ultimo ano de faculdade. Minhas notas eram altas o suficiente para que eu conseguisse uma posição medíocre de secretária na Corporação Jauregui. Eu passei os dois primeiros meses de experiência lá como a terceira secretária de Lauren Jauregui, correndo de um lado para o outro, para pegar café para ela, buscar as roupas dela na lavanderia, e sem qualquer contato direto com os chefes, além de olhares ocasionais no corredor.  

  Enquanto isso podia ser suficiente para algumas pessoas, especialmente se considerar o generoso contracheque, me deixava frustrada saber que nada do que eu havia estudado era realmente colocado em uso. A empresa Jauregui estava passando por um período de transição do comando; o CEO, Michael Jauregui, estava deixando o cargo, dividindo as responsabilidades entre seus três filhos, Lauren, Kylie e Normani. Com cada filho implementando novas estratégias de negócios, alterando equipes de alguns setores, e de uma forma geral trazendo a companhia para a idade moderna, eu sabia que podia ter um impacto maior do que fazer o café expresso duplo da Sra. Jauregui toda manhã.  

  Entretanto, qualquer ideia que eu dava para Selena Gomez, a segunda secretária de Lauren, era ignorada, então eu escolhi ignorá-la também. Instalei um programa para filtrar e-mails, contatos e cronogramas com extrema eficiência sem a permissão dela.  

  Não é preciso dizer que Selena levou todo o crédito por isso, mas quando houve um problema com os computadores, e a primeira secretária, Ariana, pediu auxílio para Selena reinstalar o programa, a verdade apareceu. Não demorou muito até que Selena fosse despachada para o décimo andar, e Ariana e eu nos tornamos um time.  

  Ela fazia todo contato pessoal com Lauren, e eu passava meu tempo mexendo nos sistemas e organizando as informações. Ao fim de mais um mês, eu havia aumentado a produtividade do escritório em 45% e Ariana estava em seu terceiro trimestre de gravidez, pronta para tirar sua licença maternidade.  

  Quando descobri que ela não somente havia dado a sugestão para Lauren de que eu ficasse no seu lugar, como a secretária principal dela sem me avisar antes, e que ela havia "concordado prontamente", eu cuspi café por cima de toda a minha mesa.  

  E agora, sentada dentro da minha picape depois de 4 meses trabalhando para os Jauregui, um mês depois de ter me tornado a secretária de Lauren Jauregui, e duas horas depois de ter um sonho vívido da minha chefe me imobilizando sobre a cama onde ela planejava tirar minha virgindade, eu sabia que estava encrencada.  

  Eu passava o dia todo como uma sombra dela, não apenas pelo fato de que ela era linda, mas também muito inteligente - a mulher tinha vinte e quatro anos, se formou três anos antes do normal e já era mais do que capaz de comandar uma companhia de um bilhão de dólares - e até onde eu podia dizer, era extremamente justa e educada.  

  Mas, minha paixonite era ainda pior porque, claramente, não era requisitada por ela. Lauren nunca havia me tratado com nada além de formalidades profissionais. Ela era uma chefe justa, porém, exigente, e apesar de jogar um pouco de conversa fora, sempre mantinha o assunto dentro dos parâmetros profissionais.  

  Minha conversa íntima de como eu era sortuda por ter um emprego já havia escapado da mente, e eu bati minha testa contra o volante da picape em desespero. Isso não ajudava em nada, claro, exceto agora eu tinha quase certeza de que teria uma bela dor de cabeça. Aparentemente, nem de ficar brava de modo apropriado, eu era capaz. 

"Patética", eu repetia para mim mesma, acomodando minha testa dolorida entre as mãos. E como que para provar meus argumentos, ouvi uma batida na janela do carro. 

"Sra. Cabello?" A voz aveludada de Lauren parecia preocupada, possivelmente se perguntando por que eu estava curvada feito uma idiota com as mãos na cabeça.  

  Mais um dia perfeito começando perfeitamente. 

  Endireitei minha postura e pude vê-la usado um terno marinho, um camisa imaculadamente branca sob a gravata vermelho-sangue, enquanto ela franzia a testa, ainda que polidamente, numa expressão confusa. 

  E sensual como o diabo, não esqueça disso, Camila - lembrei a mim mesma sarcasticamente. Como se fosse possível esquecer. Ela estava apoiada em seu Volvo, na sua vaga do estacionamento, exatamente ao lado da minha, com uma pasta muito elegante em uma das mãos.  

  Só mais uma demonstração de como Lauren era a chefe perfeita - ela havia distribuído as vagas do estacionamento ao lado da dela assim como o uso de seu elevador privativo, para mim e minha assistente - a segunda secretária -, baseado na lógica de que nós passamos a maior parte do tempo organizando o escritório dela.  

  Eu rapidamente peguei meu café e minha pasta em uma mão, movendo a outra para abrir a porta. Lauren já estava nisso antes que eu pudesse pensar, abrindo a porta para mim. Eu me contorci internamente pelo ranger da lataria, mas sorri timidamente para ela.  

  "Obrigada, Sra. Jauregui."

Ela sorriu abertamente em resposta, embora de que jeito ela conseguia ser tão alegre às 6:45h da manhã - não apenas hoje, mas em todas as manhãs - era algo além da minha compreensão; em seguida, ela esperou que eu a acompanhasse até o elevador. Lauren caminhou mantendo um metro de distância entre nós, e o único som que havia era dos meus saltos sobre o concreto até que chegamos ao elevador.  

  "Há algo de errado com... a sua cabeça?" Ela perguntou educadamente, enquanto apertava o botão que nos levaria ao último andar do edifício, olhando-me sorrateiramente pelo reflexo das portas do elevador.  

  Esse era o modo como ela sempre olhava para mim - educadamente, sorrateiramente, suavemente e indiferente. Não era à toa que meu subconsciente conjeturava uma Lauren possessiva e dominadora nos meus sonhos - porque a ideia dela me olhar com algo mais do que esse tom distante e profissional nos seus olhos verdes seria um verdadeiro milagre.  

  Eu corei ao pensar no meu sonho, grata por ela presumir que era uma reação à pergunta dela, e rapidamente formulei uma resposta. "Não, não, é só assim que eu fico mesmo antes de tomar minha dose diária de cafeína."  

  "Hmm, bom, eu imagino que haja substâncias mais fortes para se viciar do que cafeína," ela respondeu, num tom tão contemplativo que eu não pude evitar soltar um gracejo.  

  "Claro," concordei, enquanto entrávamos no escritório, "isso é o que o meu fornecedor me diz."

A estupidez da minha piada me fez contorcer por dentro, mas eu podia jurar que a vi resfolegar atrás de mim. 



A SECRETÁRIA - Adaptação Camren (Intersexual)Onde histórias criam vida. Descubra agora