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Cheguei na porta e já a distância pude ouvir os passos pesados do meu pai, coloquei a chave na fechadura, virei o pedaço de metal e quando a porta se abriu meus olhos pairaram na sala, onde havia um homem que não aparentava nem um pouco de satisfação em seu rosto, esse homem era o meu pai se preparando para soltar as palavras exatas para um sermão gigante.

"Boa noite pra você também Even" Seu tom de voz de descontentamento comigo me fez sentir um tremor por toda a minha coluna.

"Boa noite"

"Onde esteve a tarde inteira que não estava em casa, não atendia as minhas ligações e não retornava minhas mensagens? O que era tão importante assim para ignorar seu pai?" Minha mente estava formulando a melhor desculpa que eu conseguiria dizer a ele, meu pai não aceitaria muito bem e nem facilmente a verdade.

"Saí com os meus amigos" Dei de ombros.

"Que amigos?" Sua fala sai irritada e impaciente.

"Thomas, Petter e Erik"

"Engraçado, se não me engano esse tal de Petter apareceu aqui à tarde perguntando de você" Ele estava muito irônico e não aceitaria facilmente a minha mentira.

"Eu não estava conseguindo falar com ele, então ele veio até aqui, mas eu já havia saído com Thomas e Erik antes, fomos a casa de Petter depois e passamos a tarde jogando videogame" Tento a minha melhor desculpa que penso na hora.

"Não sabia que você andava jogando videogame por ai e que era mais importante que o seu pai"

"Pai! Pelo amor de Deus! Eu não tinha internet nem muito menos crédito para responder as suas ligações e mensagens, é sério, me desculpa" Começo a me exaltar mesmo sabendo que isso não terminaria bem.

"Então é isso, você vai continuar mentindo pra mim? Eu e sua mãe não o criamos dessa forma" Ele eleva o tom de voz para mostrar quem estava no comando da conversa, daqui pra frente muito provável que ele não acreditaria em uma palavra do que eu dissesse, ele tinha um sentido aguçado para mentiras mas eu continuava insistindo em tentar mesmo assim.

"Você se separou da minha mãe poucos anos depois de que eu nasci, ela te largou porque não aguentou mais passar um segundo com um cara de merda como você. Ela me amava, você nunca nem cuidou direito de mim, a empresa e trabalho sempre em primeiro lugar depois o filho, que aliás arrancou da minha mãe com esse seu dinheiro sujo para pagar um advogado famosinho e tomar a minha guarda" As palavras saem tão rápido da minha boca que eu nem tenho tempo direito de raciocinar, eu estava me segurando para não ter um surto agora mesmo.

"Olha a boca pra falar de mim, tudo que fiz foi para o seu bem" Ele para, respira e olha fundo nos meus olhos enquanto sibila "Ingrato"

"Então muito obrigado por nada"

"Eu não queria fazer o que vou fazer agora mas você está me obrigando" Seus olhos semi cerrados continuam a me encarar como quem estivesse tentando arrancar a verdade.

"Você não vai fazer nada, vou sair daqui agora!" Eu não aguentaria mais nenhum segundo com aquele cara ali, sai de casa apenas com o que continha nos meus bolsos, meu celular, carteira, chave e cigarros, ótimo vou morrer de hipotermia aqui fora.

Não sabia para onde ir, mas tomei o caminho do sul sem nenhum rumo exato. Pego o maço de Marlboro, apressadamente arranco um cigarro e no outro bolso pego o isqueiro. Acendo aquela merda que um dia acabaria com os meus pulmões, mas pelo menos levaria meus pensamentos rápidos e acelerados bem longe daquele lugar que não quero voltar tão cedo.

A rua estava deserta, eu não sabia nem que horas eram, chequei no celular e 20:34 estava brilhando no ecrã juntamente com o plano de fundo do The Neighbourhood. Passei a maior parte do dia fora realmente, mas achei que o meu pai continuaria a trabalhar por muito mais tempo. A vizinhança estava iluminada apenas pelos postes da rua, continuei a andar sem saber para onde ir quando me lembro de um parque próximo dali que tinha uma visão ótima para a cidade.

Se não estou errado esse parque não fica muito longe de onde eu estava, que já era duas quadras distantes da minha casa, mais duas ou três e eu estaria lá. Tento andar mais rápido para me aquecer.

Depois de três quarteirões andados meus pés começam a doer da longa caminhada e pedem um descanso. Encontro um banco já dentro do parque, onde sento para o meu alívio. Pego o celular e vejo todas as mensagens desesperadas recebidas horas atrás. Ignoro. Uma notificação mais recente me pega de surpresa quando o nome Isak aparece na tela com um mensagem dizendo "Chegou bem em casa? :)" Bem nem em casa estou mais, mas sou tomado pelo ímpeto de responde-lo.

Você: Não muito bem, mas não estou mais em casa

Guardo o celular no bolso e pego outro cigarro para tentar me acalmar. Trago a fumaça tóxica para os meus pulmões e solto depois. Continuo esse processo até chegar quase no final do cigarro e quando meu celular volta a vibrar. Isak novamente.

Isak: O que houve? Por que você não está em casa?

Eu não deveria preocupá-lo com meus problemas, mas ele é a única pessoa que tenho agora

Você: Tive uma briga com meu pai, estou naquele parque Frogner passando frio

Isak: Está muito frio ai fora, volte pra casa. Não quero notícias de um tal de Even Bech congelado na praçinha da cidade

Você: Ei, isso é um parque e muito bonito por sinal. Eu aproveitaria mais a vista se não estivesse tremendo tanto

Isak: Não quero te ver mal :(

Você: Não precisa se preocupar comigo, ficarei bem e desculpe te incomodar com os meus problemas.

Isak: De maneira alguma babe. Sempre que precisar estaria aqui

Você: Obrigado :)

Isak: Ei, já sei, aguenta ai um pouquinho tá?

Você: Já disse para não se preocupar comigo

Você: Mas okay

Espero alguns minutos mas nada acontece, mais nenhuma mensagem nem muito menos ligação. Minhas pálpebras começam a pesar, reluto em manter os olhos abertos mas o sono ou o cansaço tomam conta de mim, tenho me encolher no banco em uma tentativa falha de me aquecer, porém o vento frio me encobre e quando percebo estou tremendo tanto que parece que adquiri Mal de Parkinson, minhas mãos estão arroxeadas quando abro os olhos e depois os fechos de novo. Tudo é tão escuro , frio e solitário.

Algum tempo depois uma mão quente e pequena é colocada sob o meu ombro.

''Oh meu Deus, Even!''

A voz é conhecida mas não identifico quem seja porque caio na escuridão novamente.

letter by mistake | evakOnde histórias criam vida. Descubra agora