Capítulo 0.5' - IMPOSSÍVEL.

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0.5. IMPOSSÍVEL.

Eu cogitei voltar por um tempo,  depois de ver minha prima passeando com minha irmã, saindo de uma sorveteria no centro. Mas resolvi que poderia esperar mais um pouco. Continuei minha vida, ridícula, ignorando ainda todas as coisas que eu poderia atingir com uma partida repentina.

Menos uma. Era impossível a evitar.

E é como sempre dizem: tudo que é bom, dura pouco. Mas eu não esperava que fosse exatamente naquele momento.

Amanheceu como um dia qualquer de sol. Bonito e ensolarado. Perfeito para ir a praia. Porém, mudou, de maneira repentina. De repente, uma tempestade surpresa caiu sobre Miami. Uma tempestade que não havia visto em 20 anos ou em qualquer notícia antes.

E eu a culpei mais do que o maldito motorista desmaiado contra o volante e a cabeça sangrando.

Eu reconheceria aquele elástico de cabelo no pulso em qualquer lugar. Não foi difícil ter certeza quando a imagem passou na TV e a voz do âncora retumbou entre as paredes morfadas.

'Lauren Michelle Jauregui' - era o que constava.

Eu nem esperei a água que caia parar para sair em disparada pela cidade em meu carro velho. Algumas ruas estavam totalmente fechadas. Sem previsão. Eu fiquei presa na merda do trânsito e saí do carro, partindo em uma caminhada longa. Alternando entre passadas rápidas e uma corrida vez ou outra.

Mas eu sabia que meu corpo não me ajudaria mais.

Afinal, faltavam dois meses para a data me dada. As tonturas vinham a cada dia mais fortes e dolorosas, os enjôos por tudo e qualquer coisa. Esforço demais era pedir para desmaiar.

E ela descobriu. Não exatamente, mas tive que contar.

Com nossos encontros constantes e suas vindas até mim, eu pensei que eventualmente ela descobriria e eu teria de lhe dizer a verdade. Honestidade sempre nos cabiu desde o começo.

Quando cheguei, implorei ao balconista que me deixasse ficar mesmo ensopada pela chuva. E fui obrigada a tomar alguma porcaria para evitar ficar gripada, eu esperaria pela enfermeira trazer roupas secas, mas não estava afim de andar pelo prédio com a bunda de fora. Fugi assim que ela saiu e procurei por algum médico, mas o dia estava do avesso. Então, um enfermeiro resolveu que mesmo em meio ao caos seria bom flertar com uma pobre moça desesperada. Não dei tempo a nada além de encurrala-lo a parede e arrancar algo sobre Lauren.

Foi um baque. E ela esteve em coma induzido por um par de dias, talvez semanas. Eu preferi não contar. Quando acordou, a respiração de alívio ficou presa em minha garganta. Pois veio uma convulsão seguida de ataque cardíaco e, então, as complicações.

Eu lembro de receber a notícia junto de seus pais e ir ao banheiro. Acordei no dia seguinte, com a explicação de que vomitei até o que não comia e desmaiar.

Com o corpo paralisado e as mãos no colo, percebi o quanto odiava branco. Pois branco me traziam as lembranças do dia da pior noticia que alguém poderia receber - ou era o que eu pensava - e agora, essa mesma cor, me trouxe outra ainda pior.

Foquei os olhos novamente, olhando para o homem de jaleco branco e estetoscópio pendurado no pescoço. Pacientemente esperando uma resposta, esta que nem pensei para dar.

Eu vou fazer.

E eu não me arrependia. Eu avisei a todos para não me esperarem. Mas esqueci de me avisar para não esperar o impossível.

O esperado e impossível para sempre.

O que Me RestaOnde histórias criam vida. Descubra agora