Os Judeus

Ultima Vez

 Meus dedos se mantinham em seus castanhos fios,dei a ela um pedaço de meu coração,cujo ela guardou com amor. Nossas bocas se tocaram pela ultima vez,não tinha certeza de minha partida,mas sabia que era preciso,como presente pedi que com afeto ela guardasse minha alma em seu peito e que nem a morte tirasse isso de nós.

Ela me olhou tristemente,me encarou como a tristeza,me beijou como a despedida,mas naquele instante me senti como sempre ficávamos aos domingos,sentados na ponte,a vitrola tocava Barcarolle as 15 horas,neste momento ignorei as bombas,os fuzis,os alemães e a guerra.

No fundo de nossos corações os sentimentos se confundiam com o medo e o desespero da breve perda,de nossos homens,crianças e mulheres. Todos nós já sabíamos de nossa passagem de somente ida para morte certa,mas o que faríamos? com que armas defenderíamos nossos filhos de tal ameaça? A unica coisa que nos restava era a guerra,e talvez fosse exatamente isto que nos torturava por dentro,corroendo nossas esperanças,nos matava aos poucos internamente.

O Sino bateu exatamente as 14 horas,esfreguei meus dedos em seu vestido florido e virei-me dando meu ultimo sorriso para Judia que eu mais amei nessa vida,segurei firmemente em minhas malas e senti uma lagrima contornar meu rosto tomado pela terra.

Me afasto ao som da triste melodia de seus gritos de extrema tristeza,os berros cadenciados dos meninos que insistiam que seus irmãos e pais ficassem,nunca imaginei ver um rosto tão bem desenhado ser tomado pela tristeza,seus lábios tão delicados virarem o cemitério de palavras alegres,uma voz tão bela ser transformada em gritos que pediam para que o caminhão não partisse. O Caminhão se afasta lentamente,juntamente com as ultimas imagens que teria de minha esposa,a qual chamava de princesa todos os dias os quais o sol nascia.

Quando sua imagem desaparece pois já foi totalmente tomada pela fumaça que o caminhão deixava por onde passava,apoio minha cabeça nas madeiras,fecho meus olhos e naquele momento voltei no passado,tempo que tinha apenas 8 anos e chorava por atenção,por dor,pela alegria,pelo medo. Todos os homens abraçados com seus fuzis viraram garotos,os quais só sabiam chorar e gemer de saudade.