II

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Acordamos abraçadas, eu sempre acordava muito cedo para aproveitar o dia e naquele dia tínhamos que chegar cedo à faculdade, mas fiquei observando-a dormir, até que beijei seu rosto e a vi acordar.

— Bom dia! — desejei e a senti se aninhar em mim. — Precisamos ir, preguiçosa.

Ela encheu o meu rosto de beijos e me beijou na boca de novo, eu a correspondia e mesmo inebriada por tamanho prazer, ouvi passos no corredor e a afastei de mim.

Era Dominica, minha babá, que se tornou governanta da casa depois que eu cresci.

— Simone, está na hora de acordar, menina! — Ela disse e entrou no quarto, nos viu na cama.

— Já estamos indo, Dominica.

Dominica nos olhou e assentiu, saindo do quarto. Nós nos arrumamos e fomos tomar café da manhã.

— Passei no quarto de hóspedes e não a vi, Marisa! — A minha mãe comentou.

— Ela acordou com as galinhas, quando entrei no quarto da Simone já estava arrumada esperando por ela... — Dominica se adiantou e respondeu.

A partir daquele dia, Dominica passou a nos ajudar. Ela notou que tínhamos algo além da amizade.

— Eu a amo como a uma filha, Simone, quero que seja feliz, mas logo chegará o dia do seu casamento.

— Eu não vou me casar, Nica. — respondi quando ficamos sozinhas em casa. — Eu amo a Marisa, não consigo nem me imaginar sem ela, ela também me ama.

— Você sabe que o seus pais jamais a apoiarão nisso, não sabe?

— Eu sei, Nica, mas eu não quero ficar sem ela. Vou enlouquecer se nos separarmos.

— Então seja forte, minha filha. É o tipo de relacionamento que não é bem visto pela sociedade e a sua religião abomina.

Lágrimas desceram por meu rosto, ficar sem Marisa seria o fim da minha vida.

A data do meu maldito casamento estava marcada para dali quatro meses.

— Hoje você precisa vir direto para casa para irmos provar seu vestido. — lembrou minha mãe quando eu estava saindo de casa.

Naquele dia a aula terminou e voltei para casa, escrevi um bilhete num papel bonito e pedi para um garoto que engraxava sapatos entregar para Marisa.

O vestido era muito bonito, mas eu estava infeliz. Minha mãe notou e quis saber o motivo.

— Não estou triste, mamãe, apenas cansada. — menti para que ela não fosse adiante com aquele assunto.

Sentei-me no banco detrás do carro quando voltamos para casa e não consegui conter minhas lágrimas. Tentei secá-las para que não fossem notadas pela minha mãe, mas não consegui.

— Simone, quando eu me casei com o seu pai eu nem tive tempo de sequer conversar com ele, já fomos assinar os papeis, morar juntos, já tive que ser a mulher dele e eu era apenas uma menina de doze anos. Adoeci, levei muito tempo para engravidar e dar o tão sonhado filho ao seu pai. Você consegue imaginar o meu sofrimento? Quando finalmente engravidei, já com quase vinte anos, estava exausta de tantas humilhações. Mas aí você nasceu e para a minha surpresa o seu pai a aceitou de bom grado. Ficou muito feliz apesar de ter sonhado com um filho homem.

Eu engoli saliva, em lágrimas. Eu sabia que ela havia se casado muito cedo, mas não sabia de nada do que ela estava me contando.

— Eu entendo exatamente o que está passando. Mas peço que aceite para o seu bem. Não seria nada fácil para você se perdesse esse casamento. — Ela me disse aquilo e não consegui enxergar além.

Naquele dia eu avisei que estudaria com Marisa na casa dela, mas não tínhamos nada importante para fazer.

Só queríamos namorar mesmo, e foi naquele dia que fizemos amor pela primeira vez.

Marisa sempre se mostrou a frente de seu tempo, do nosso tempo. Ela fez o tempo certo dela, aquilo me fazia vibrar ainda mais por ela e a amá-la ainda mais.

— Quero conhecer Paris com você! Jura que vai comigo, por favor.

— Juro! Claro que sim. Não quero ficar longe de você nunca...

O dia do meu casamento chegou. Dominica me ajudava com o penteado.

— Você pode ainda mudar tudo isso, minha filha! — Ela disse por entre os dentes, quase inaudível.

Marisa chorou quando eu disse sim ao Abílio naquele altar. Eu também chorava, mas não sabia o que fazer.

Ela não quis me ver no dia seguinte à cerimonia, cheguei à faculdade e não a vi, quando a vi ela simplesmente foi embora.

Precisei de um bom tempo implorando para conversar com ela para que aceitasse.

— Eu te amo! — gritou chorando agarrada em mim. Caí em prantos também.

— Eu também te amo! Me perdoa, por favor.

Depois de muito choro e pedidos de perdão, nos beijamos e nos amamos como sempre, melhor que sempre.

Passamos dois anos naquele relacionamento, até que Abílio descobriu, depois de dar ouvidos aos colegas de seu irmão, que nos viu.

Fui hostilizada por minha família e pela família dele. Fui proibida de sair de casa, me obrigaram a parar de estudar.

Marisa sumiu, não soube dela de jeito nenhum mais. Sofri muito e pensei até em tentar contra a minha própria vida.

Mas mais uma vez cedi ao casamento e me deixei viver aquela vida sem amor e infeliz.

A família da Marisa se mudou daquela casa e eu não soube mais nada dela.

Invisível Aos OlhosOnde histórias criam vida. Descubra agora