Capítulo 10 - Melinda

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Nos últimos dias, eu tentei mil e uma formas diferentes de me fazer lembrar do quanto era estúpido me deixar envolver por Robert Blackwell. O problema era que eu já estava envolvida, mas era orgulhosa demais para admitir algo assim.

Durante anos, eu me resguardei para que nenhum tipo de rejeição voltasse a tocar minha vida, e os únicos que realmente se aproximaram de mim foram Javier e Eva. Mas eles eram diferentes de tudo e todos que já conheci. De alguma forma, eu sempre soube que poderia confiar neles. Não sou expert no quesito pessoas e suas interações, mas desde o primeiro momento em que pus meus olhos na família González, soube que poderia confiar neles.

A forma como Javier e Eva tratavam um ao outro, os olhares calorosos que me lançavam, o modo como sempre falavam me olhando nos olhos... Isso tudo me passava tanta segurança, que foi impossível não me apegar a eles.

O fato de Javier ter confiado a mim a triste história de como perdeu seus pais só fez com que nos aproximássemos ainda mais.

Javier era capaz de entender, porque como eu, ele também queria esquecer as marcas do passado.

As coisas não eram assim tão simples, contudo.

Por mais que eu tenha conseguido erradicar os pesadelos que me perseguiam, causados pela fatídica noite em que quase fui violentada, ainda havia muitos medos a serem superados. A rejeição era um deles.

As coisas estavam melhores desde a chegada dos González, porque foi como se eu tivesse ganhado uma família, e a sensação era incrível. Mas eu queria mais, mesmo que isso pudesse soar egoísta.

Eu queria ter o meu próprio lar, e não apenas uma casa para onde voltar após o expediente. Queria que houvesse alguém me esperando, ou queria poder esperar alguém, não faria diferença para mim. Mas como isso seria possível, se a simples ideia de ter um homem me tocando intimamente se tornou tão asquerosa depois daquela noite de tormento?

Eu não me sentia à vontade com ninguém além de Javier e, mesmo assim, ele era o irmão que eu não tive. Além dele... bom, além dele havia apenas uma pessoa.

Foi olhando sob essa nova ótica que descobri que amar Robert não era o problema, porque eu já tinha aprendido a conviver com esse sentimento. O problema residia no fato de ele ter me notado e, sem um motivo aparente, querer estar perto de mim. Não era fácil entender algo assim, como, do nada, eu me tornei o objeto de desejo do homem que eu amava às escondidas desde a adolescência.

Eu até poderia conversar com Christine sobre isso, mas quão ridícula uma pessoa pode parecer ao confessar que se apaixonou perdidamente aos dezessete anos, graças a uma ação generosa e a um recorte de jornal? Eu mesma não exteriorizava esses pensamentos, eles soavam estranhos até para mim, a rainha da estranheza.

Talvez se eu tivesse superado tudo isso, se não tivesse trazido esses sentimentos para minha vida adulta e... Argh! A quem eu queria enganar? Sentimentos não se ligam e desligam, é mais complicado do que isso.

E agora, por mais que eu ainda conseguisse lembrar as palavras de Christine, que insistia em me dizer que eu era apenas um passatempo para Robert, era só na voz dele que eu conseguia pensar, dizendo que precisava de mim. Se ele ao menos soubesse o quanto eu precisava dele...

***

— Nada? — eu inquiri a Javier cautelosamente enquanto ele desabava no sofá de seu apartamento.

— Nada — respondeu num suspiro que expressava fadiga e indignação.

— Não fique assim, Javier — disse-lhe num tom condescendente, acomodando-me ao lado dele. — Você vai ver como as coisas vão se acertar logo, logo... — articulei, tentando confortá-lo, com uma mão pousada em seu ombro.

Doce Amargo - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora