O professor Alexander Fletcher estava revisando os papeis sobre a mesa pela vigésima vez. Tinha de haver uma forma de reverter aquele processo. Essa era a premissa natural de todas as coisas, tudo que era feito podia ser desfeito também. O ciclo eterno que refletia em opostos como luz e sombras, bem e mal, vida e morte. Ele precisava descobrir como fazê-lo, mas só conhecia um homem com tal conhecimento. Seu mentor e amigo, Robert Brandford.
No outro lado da grande sala estava Robert, sentado na cadeira diante da enorme mesa cheia de frascos, anotações e livros. Usava o habitual jaleco branco, tinha a barba por fazer há vários dias, as olheiras roxas indicavam as muitas noites mal dormidas e o cabelo estava todo desgrenhado, fazendo as fotos de Einstein parecer as de um modelo perto dele agora.
—Eu a vi de novo – disse Robert cobrindo a boca com uma das mãos – Margareth está aqui, conosco, não apenas ela, mas muitos outros que se mudaram para cá com ela também. Mas nenhum deles me responde, preciso encontrar a solução para isso, preciso descobrir como me comunicar com eles.
Erguera os olhos fixando sua atenção em um calendário sujo pregado na parede, os números estavam embaçados e quase não conseguia enxergá-los. Dois anos haviam se passado, dois anos aplicados naquela pesquisa. No início ninguém acreditara nele, mas obtivera resultados, provara sua tese e agora teria mais ajuda. Margareth estava orgulhosa – pensou – seu aniversário estava chegando. Esse ano ele deixaria o trabalho de lado para jantar com ela. E daria uma festa um mês depois para comemorar o aniversário de casamento.
* * *
Robert Brandford fora o terceiro filho de uma família muito rica da Nova Inglaterra. Em 1945 formara-se como Cirurgião Geral. Todos os homens e algumas mulheres na família já vinham exercendo a medicina há várias gerações e sempre ocupavam altos cargos em grandes hospitais de renome no país e no exterior. Para o desgosto do pai, Robert mudara-se para Jersey, a fim de trabalhar como legista em uma universidade, uma posição bastante inferior à que seus irmãos tinham em hospitais renomados.
Desde pequeno, Robert sempre tivera fascínio pela fisiologia humana e em nenhum lugar teria tanto acesso à corpos para cortar e entender à vontade quanto fazendo autopsias. Alheio ao conhecimento do Reitor e de outros funcionários, Robert vivia fazendo pesquisas nos corpos, estudando os órgãos e os tecidos detalhadamente, aplicando eletrochoques e algumas drogas com a intenção de obter alguma reação. Em sua mente, ele se via como um Dr. Frankenstein dos tempos modernos e seu ego dizia que era de homens como ele que a ciência e a medicina precisavam, não de médicos que existiam para ostentar diplomas e condecorações, como seu pai e seus irmãos.
Eventualmente Robert acabava conhecendo parentes de vários falecidos cujos corpos eram levados para autopsia. Em alguns casos, ele acabava indo ao enterro ou se tornando amigo das famílias. Fora dessa forma que em 1955 conhecera Margareth Montgomery, a mulher com quem se casaria no mesmo ano. Após o casamento, Robert comprara a Mansão Zuflucht, um casarão enorme, com mais de cem cômodos na floresta de Pine Barrens, ao sul da cidade. A floresta era famosa por ser assombrada, o lar de criaturas de lendas locais como o famoso Demônio de Jersey e também por abrigar uma área usada como cemitério indígena.
Isso tudo pouco importava para o médico e cientista. A mansão, que já fora utilizada como manicômio, era perfeita para ele, que pretendia constituir uma grande família e continuar suas pesquisas. Robert parara de trabalhar para a universidade, passando a atuar como legista forense, fazendo autopsias em corpos de criminosos e policiais para as delegacias da cidade e ficara conhecido por sua habilidade extrema em detectar até os mínimos detalhes que ninguém mais via. A obscura mansão onde morava, era assombrada pelas lendas da floresta, assim como pelas novas lendas que surgiam acerca das autopsias e pesquisas que realizava.
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Os fantasmas de Zuflucht
Misterio / Suspenso[ CONTO COMPLETO - BOA LEITURA ] A gigantesca Mansão Zuflucht, construída nos pântanos ao sul de Jersey, fora no passado um manicômio, posteriormente abandonada e finalmente comprada pelo brilhante jovem médico, Dr. Robert Bradford. Entre suas pared...