Remember of me

250 32 70
                                    

[15-04-2015]

Arietta era bonita. Muito bonita. Eu nunca conheci outra mais bonita. Seus olhos castanhos sempre me cativaram desde que a vi dançar pela primeira vez naquele palco.
Arietta era dançarina e prostituta numa casa de show da cidade. Possuía as melhores curvas. Os cabelos lisos e negros contrastavam com sua pele alva, que por diversas vezes escondia marcas de outros homens sob sua maquiagem.
Arietta tinha cheiro de verão e lembranças boas. Tinha cheiro de noite fria acompanhada de uma lareira e biscoitos. Era doce, calma e extremamente sensual.
Seu sorriso causava em mim as mais diversas sensações.
Ela nunca foi de falar muito, mas uma única palavra sua fazia-me juntar-se ao seu vazio de diálogos, me deixando sem jeito e bobo em segundos.
Gostava de vê-la pedalar em meu quintal. E sorrir como criança que aprende a andar numa bicicleta. Ou quando ela dançava pra mim ao som de músicas sofisticadas de piano que ela insistia que eu tocasse. Desde Clyde à Beethoven.
Sua preferida era a nona sinfonia deste último citado.

[04-05-2015]

Ela tinha medo de trovões e grandes tempestades. Seus pelos dos braços se eriçavam ao sentir o vento gelado que vinha da janela aberta. Mas nunca foi inimiga do frio. Pelo contrário, gostava de como a neve dançava ao cair sobre o chão e os telhados das casas da cidade.
Arietta era como Lá sétima e as vezes uma oitava a baixo. Era Si Bemol e Dó e meio.
Peter Pan era uma de suas historias favoritas. Ela dizia que se pudesse voltaria ao seu tempo de criança e pararia lá, para que nunca mais crescesse e precisasse se preocupar com coisas banais da vida.
Dizia que a simplicidade era uma das coisas mais belas. Valorizava as coisas simples e bobas que muitos deixavam de lado.

[29-06-2015]

Arietta tinha gosto de algodão doce e alcaçuz. Era o açúcar em minha vida.
Ela apreciava minha comida, mas as coisas que ela me oferecia, ah, isso sim era o que eu apreciava.
O prazer quando nos amávamos abaixo da lua que sempre nos testemunhou. O sabor dos seus beijos e seu cafuné ao cair das tardes.
Dormir em seu colo era uma das coisas que eu mais gostava desde fazer amor consigo e beijar os nós de seus dedos.

[07-08-2015]

Eu gostava de quando tomávamos banhos juntos. Quando a água tomava um tom rosado cremoso e sempre combinou com sua pele e seu corpo bem feito.
Éramos feitos um para o outro... Como ela sempre dizia.
Ela dava rodopios pela cozinha até a sala enquanto o jantar era preparado.
Eu gostava quando se colocava entre mim e o balcão roubando-me um beijo breve com gosto dos marshmallow's que ela furtava do potinho colorido no armário.
Ela valorizava detalhes. Costumava me desenhar em cada cena que me lembro até hoje. Como quando eu peguei no sono em seu colo novamente e ela fez questão de desenhar meu rosto, minhas feições e cada traço em meu rosto. Pois ela dizia que memórias deveriam ser eternizadas não é?
E eu concordava.

[18-10-2015]

Ela abandonou seu emprego naquela casa de show onde nos conhecemos e arrumou outro num café no bairro vizinho.
De vez em quando eu a visitava para vê-la dançar e rodopiar pelo local entregando os pratos em sua bandeja nas suas respectivas mesas bem alinhadas.
Eu sempre a buscava ao fim do seu expediente e íamos juntos para nosso lar onde podíamos dormir e descansar em paz.

[21-11-2015]

Nunca foi apenas flores. Arietta não gostava quando eu reclamava de algumas manias suas, como de gritar as vezes sem nem perceber, coisa que não combinava com sua aparência pueril. Ou quando vivia procurando defeitos para me por como o errado de nossas brigas, que normalmente eram causadas por motivos banais.
Ela reclamava quando uma garota que trabalhava comigo na editora dava em cima de mim.
Quase terminamos quando um dia ela chegou no meu trabalho e viu a menina quase se jogar por cima de mim. Ela gritou para que eu ficasse com a garotinha bem sucedida e esquecesse a prostituta que ela sempre foi.
Ela chorou, e as imagens de vê-la chorando me tiram a paz e apertam meu coração.
E gritar no meio da rua que a amava foi mais um motivo para ela entender que sempre foi e sempre será a pessoa que eu amei, independente de a ter conhecido como uma prostituta.

[09-12-2015]

Arietta sempre foi muito feminina e bem afeiçoada. Porém, à noite deixava sua peruca escura de lado e se despia de suas roupas simples e femininas, transformando-se em Byun Baekhyun, meu amado.

Se entregava pra mim como se fosse refém de meus toques, embora eu fosse a vítima de cada gemido e arfar seu.
Gostava quando eu dedilhava seu corpo como se tocasse um piano. Eu tocava Arietta de Beethoven, nossa música favorita.
Ia de suas coxas fartas a cada curva de sua cintura e abdômen. Os dedos de suas mãos se entrelaçavam aos meus na tentativa de se aconchegar mais a mim e nos sentirmos mais próximos um do outro.
Era como se fossemos um quebra-cabeça sem fim, mas que cada peça se encaixava e éramos assim infinitamente. Mesmo que eu não suportasse suspense, Arietta, ou melhor, Baekkie sempre foi um enigma. O único que eu teria o prazer de desvendar todos os dias da minha vida.

[08-01-2016]

Era um dos dias mais felizes da minha vida. Eu estava prestes a subir de nível na editora que eu trabalhava, seria agora gerente.
Eu estava imensamente feliz.
Ao contar para Byun, ele sorriu e me abraçou logo me dando um beijo lembrando-me do doce sabor de seus lábios. 
Tínhamos acabado de acordar e me puxou para a cama e transamos novamente como nunca tínhamos feito outra vez.
Era um sexo transbordando de alegria, prazer e puro amor.
Naquele dia deixei Arietta sozinha em casa. Ela estava de folga e eu tinha que ir numa reunião onde seria me dada a posse do cargo de gerente.
Eu a beijei e sorri para a mesma antes de fechar a porta vendo-a me corresponder com um sorriso singelo e uma frase breve.
A reunião foi maravilhosa e tudo parecia estar ótimo. Quando eu chego em frente aquele nosso prédio onde se encontrava nosso apartamento.
Um fósforo, uma única chama...
Uma explosão...

Foi tudo tão de repente que eu não sabia como agir. Em um segundo minha amada Arietta deu seu último suspiro de vida.
Os bombeiros tentaram apagar o fogo, mas quando conseguiram, Arietta já estava morta, queimada e em cinzas, junto com nossas lembranças naquele apartamento.
Num piscar de olhos meu mundo caiu. Meus olhos marejaram e eu sentia as lágrimas caírem como se não houvesse amanhã.
Tudo que eu tinha, a única coisa de mais valiosa que eu possuía... Sumiu de minhas mãos.
Como uma pomba, Arietta se despediu de mim deixando apenas nossas lembranças pintadas de cinza num passado onde ela ainda sorria.
Como numa última brisa, Baekkie se despediu de mim e vôou. Sua alma sempre foi livre. Mas eu nunca quis que a mesma voasse sem mim em um céu vazio e sem fim.

[08-01-2017]

Hoje faz um ano que ela voou; bateu as asas e se desfez junto ao vento e só deixou o vazio em meu guarda-roupa (único bem que se salvou do incêndio) impregnado com o cheiro do perfume que a mesma usava.

No fim das contas a historia acabou triste. Mas é como ela sempre dizia: "As melhores canções sempre terminam em Dó."
Me despedi do cafuné aos fins de tarde. Me despedi dos beijos com gosto de marshmallow's. Dos pezinhos de meias que rodopiavam pela sala ao som de Beethoven. Me despedi do dedilhado comum em seu corpo.
E principamente da sua voz, que poucas vezes se pronunciava, mas ao se professar revelava segredos e enigmas em forma de frases que decifravam mais e mais o mistério que ela era.
Os cabelos negros e a pele alva apenas com minhas marcas. Os lábios bem desenhados que faziam um som bonito ao proferir meu nome. Os beijos em seus nós dos dedos. A trilha de selares que eu fazia em seu corpo. A água rosa cremosa perfumada. Os beijos fiéis, abraços e laços.
Tudo continua comigo. Nos corredores de minha memória fotográfica. Nos vácuos de minha alma.
Nunca me entreguei a mais ninguém, por mergulhar tão fundo nas profundezas de sua alma que embora fossem cheios de enigmas, nunca me impediram de desvendar os mais incríveis pensamentos que rondavam a mente do mesmo.
Em seu enterro, percebi o quanto uma de suas frases fez sentido.
Arietta nunca se fez tão clara e simples.

Era como se a mesma já estivesse preparada para o que aconteceria.
Como se quisesse me preparar de uma dor maior.
Nunca me senti tão bem com outra pessoa como eu me sentia com Arietta.
Byun Baekhyun era cheio de charadas, enigmas e filosofias, mas era simples...
Era feito de amor. Era feito de laços. E a cada laço nosso, um laço seu era desfeito. E como sempre foi um mistério, o destino achou por bem tira-lo de mim, pois eu o havia desvendado.
Mesmo um dia prostituta, ainda era uma ironia...

Pois Arietta não tinha preço.

Byun Baekhyun nunca teve uma etiqueta.

Arietta nunca precisou de uma máscara.

Byun Baekhyun era transparente, mas escuro em todos os seus ângulos.

Foi aí que me lembrei de sua ultima frase antes que eu fechasse a porta.

–No fim o que valerá não será o preço, mas sim o valor.

AriettaOnde histórias criam vida. Descubra agora