Primeira Lição

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O Capitalismo
p. 13-26

Certas expressões usadas pelo povo são, muitas vezes, inteiramente equivocadas. Assim, atribuem-se a capitães de indústria e a grandes empresários de nossos dias epítetos como "o rei do chocolate", "o rei do algodão" ou "o rei do automóvel". Ao usar essas expressões, o povo demonstra não ver praticamente nenhuma di-
ferença entre os industriais de hoje e os reis, duques ou lordes de outrora. Mas, na realidade, a diferença é enorme, pois um rei do chocolate absolutamente não rege, ele serve. Não reina sobre um território conquistado, independente do mercado, independente de seus compradores. O rei do chocolate - ou do aço, ou do automóvel, ou qualquer outro rei da indústria contemporânea - depende da indústria que administra e dos clientes a quem presta serviços. Esse "rei" precisa se conservar nas boas graças dos seus súditos, os
consumidores: perderá seu "reino" assim que já não tiver condições de prestar aos seus clientes um serviço melhor e de mais baixo custo que o oferecido por seus concorrentes. Duzentos anos atrás, antes do advento do capitalismo, o status social de um homem permanecia inalterado do princípio ao fim de sua existência: era herdado dos seus ancestrais e nunca mudava. Se nascesse pobre, pobre seria para sempre; se rico - lorde ou duque -, manteria seu ducado, e a propriedade que o acompanhava,
pelo resto dos seus dias.
No tocante à manufatura, as primitivas indústrias de beneficiamento da época existiam quase exclusivamente em proveito dos ricos. A grande maioria do povo (90% ou mais da população europeia) trabalhava na terra e não tinha contato com as indústrias de beneficiamento, voltadas para a cidade. Esse rígido sistema da sociedade feudal imperou, por muitos séculos, nas mais desenvol-
vidas regiões da Europa.

Contudo, a população rural se expandiu e passou a haver um excesso de gente no campo. Os membros dessa população excedente,
sem terras herdadas ou bens, careciam de ocupação. Também não lhes era possível trabalhar nas indústrias de beneficiamento, cujo
acesso lhes era vedado pelos reis das cidades. O número desses "párias" crescia incessantemente, sem que todavia ninguém soubesse o que fazer com eles. Eram, no pleno sentido da palavra,
"proletários", e ao governo só restava interná-los em asilos ou casas de correção. Em algumas regiões da Europa, sobretudo nos
Países Baixos e na Inglaterra, essa população tornou-se tão numerosa que, no século XVIII, constituía uma verdadeira ameaça à
preservação do sistema social vigente.
Hoje, ao discutir questões análogas em lugares como a Índia ou outros países em desenvolvimento, não devemos esquecer que, na
Inglaterra do século XVIII, as condições eram muito piores. Naquele tempo, a Inglaterra tinha uma população de seis ou sete milhões de habitantes, dos quais mais de um milhão - provavelmente
dois - não passavam de indigentes a quem o sistema social em vigor
nada proporcionava. As medidas a tomar com relação a esses deserdados constituíam um dos maiores problemas da Inglaterra.
Outro sério problema era a falta de matérias-primas.

Os ingleses eram obrigados a enfrentar a seguinte questão: que faremos,
no futuro, quando nossas florestas já não nos derem a madeira de que necessitamos para nossas indústrias e para aquecer nossas casas? Para as classes governantes, era uma situação desesperadora.
Os estadistas não sabiam o que fazer e as autoridades em geral não tinham qualquer ideia sobre como melhorar as condições.

Foi dessa grave situação social que emergiram os começos do capitalismo moderno. Dentre aqueles párias, aqueles miseráveis,
surgiram pessoas que tentaram organizar grupos para estabelecer
pequenos negócios, capazes de produzir alguma coisa. Foi uma inovação. Esses inovadores não produziam artigos caros, acessíveis apenas às classes mais altas: produziam bens mais baratos, que pudessem satisfazer as necessidades de todos. E foi essa a origem
do capitalismo tal como hoje funciona. Foi o começo da produção em massa - princípio básico da indústria capitalista. Enquanto
as antigas indústrias de beneficiamento funcionavam a serviço da
gente abastada das cidades, existindo quase que exclusivamente
para corresponder às demandas dessas classes privilegiadas, as no-
vas indústrias capitalistas começaram a produzir artigos acessíveis
a toda a população. Era a produção em massa, para satisfazer às
necessidades das massas.

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