Terceira Lição

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O intervencionismo
p. 45-60

Diz uma frase famosa, muito citada: "O melhor governo é o que menos governa". Esta não me parece uma caracterização adequada das funções de um bom governo. Compete a ele fazer todas as coisas para as quais ele é necessário e para as quais foi instituído. Tem o dever de proteger as pessoas dentro do país contra as investidas violentas e fraudulentas de bandidos, bem como de defender o país contra inimigos externos. São estas as funções do governo num sistema livre, no sistema da economia de mercado.

No socialismo, obviamente, o governo é totalitário, nada escapando à sua esfera e sua jurisdição. Mas na economia de mercado, a principal incumbência do governo é proteger o funcionamento harmônico desta economia contra a fraude ou a violência originadas dentro ou fora do país. Os que discordam desta definição das funções do governo poderão dizer: "Este homem abomina o governo". Nada poderia estar mais longe da verdade. Se digo que a gasolina é um líquido de grande serventia, útil para muitos propósitos, mas que, não obstante, eu não a beberia, por não me parecer esse o uso próprio para o produto, não me converto por isso num inimigo da gasolina, nem se poderia dizer que odeio a gasolina. Digo apenas que ela é muito útil para determinados fins, mas inadequada para outros. Se digo que é dever do governo prender assassinos e demais criminosos, mas que não é seu dever abrir estradas ou gastar dinheiro em inutilidades, não quer dizer que eu odeie o governo apenas por afirmar que ele está qualificado para fazer determinadas coisas, mas não o está para outras.

Já se disse que, nas condições atuais, não temos mais uma economia de mercado livre. O que temos nas condições presentes é algo a que se dá o nome de "economia mista". E como provas da efetividade dessa nossa "economia mista", apontam-se as muitas empresas de que o governo é proprietário e gestor. A economia é mista, diz-se, porque, em muitos países, determinadas instituições - como as companhias de telefone e telégrafo, as estradas de ferro - são de posse do governo e administradas por ele. Não há dúvida de que algumas dessas instituições e empresas são geridas pelo governo. Mas esse fato não é suficiente para alterar o caráter do nosso sistema econômico. Nem sequer significa que se tenha instalado um "pequeno socialismo" no âmago do que seria - não fosse a intrusão dessas empresas de gestão governamental - a economia de mercado livre e não socialista. Isto porque o governo, ao dirigir essas empresas, está subordinado à supremacia do mercado, o que significa que está subordinado à supremacia dos consumidores.

Ao administrar, digamos, o correio ou as estradas de ferro, ele é obrigado a contratar pessoal para trabalhar nessas empresas. Precisa também comprar as matérias-primas e os demais produtos necessários à operação das mesmas. E, por outro lado, o governo "vende" esses serviços e mercadorias para o público. Todavia, embora administre essas instituições utilizando os métodos do sistema econômico livre, o resultado, via de regra, é um déficit. O governo, contudo, tem condições de financiar esse déficit - pelo menos é esta a firme convicção não só dos seus integrantes como também dos que se ligam ao partido no poder.

A situação do indivíduo é bem diversa. Sua capacidade de gerir um empreendimento deficitário é muito restrita. Se o déficit não for logo eliminado, e se a empresa não se tomar lucrativa (ou pelo menos dar mostras de que não está incorrendo em déficits ou prejuízos adicionais), o indivíduo vai à falência e a empresa acaba. Já o governo goza de condições diferentes. Pode ir em frente com um déficit, porque tem o poder de impor tributos à população. E se os contribuintes se dispuserem a pagar impostos mais elevados para permitir ao governo administrar uma empresa deficitária - isto é, administrar com menos eficiência do que o faria uma instituição privada -, ou seja, se o público tolerar esse prejuízo, então obviamente a empresa se manterá em atividade. Nos últimos anos,
na maioria dos países, procedeu-se à estatização de um número crescente de instituições e empresas, a tal ponto que os déficits cresceram muito além do montante possível de ser arrecadado dos cidadãos através de impostos. O que acontece nesse caso não é o tema da palestra de hoje. A consequência é a inflação, assunto que devo abordar amanhã. Mencionei isso apenas porque a economia mista não deve ser confundida com o problema do intervencionismo, sobre o qual quero falar esta noite.

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