Único

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Fora na livraria, onde vi tua primeira curva

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Fora na livraria, onde vi tua primeira curva.

Olhava-me de relance, a encarar alguns de meus fios avermelhados. Carregava consigo Macário na mão esquerda, e na direita, algumas sacolas. Era uma fila curta e, felizmente, os que se punham frente a mim eram baixos o suficiente para ver-te. A curva que seu olhar fazia, causava-me arrepios pelo corpo.

Tua segunda curva exigiu pouca observação, mas se pôs marcante, na floricultura da rua de baixo de sua casa.

Eu trabalhei por ali, por muitos anos. O aroma das flores primaveris se misturava com o cheiro de madeira antiga dali. O café ao lado funcionava, as chaminés do fogão de lenha, que assava deliciosos pães e aquecia a água das bebidas, mandava aos céus uma fumaça branda. Quando entraste, teus olhos fizeram curva novamente e se encontraram com os meus. Teus cabelos escuros cobriam parte do rosto, mas nem as flores foram capazes de camuflar teu perfume. Diferente do aroma suave e doce das pétalas, teu corpo exalava uma essência forte e marcante, diferente de tudo o que eu já havia presenciado. Por segundos, admirou um grande vaso de príncipes negros, e, tomando um deles em mãos, absorveu todo aquele aroma marcante como o teu. Fora ali, na curva dos teus dedos, que senti sem sentir o toque mais delicado que fazia-me derreter.

Tua terceira curva era suave, mas pouco se mostrava em dias calmos, diferente do dia invernal em que vi-te na praça.

As crianças brincavam na neve, apalpando-a nas mãos até que se formem pequenas esferas, que não tardavam em acertar corpos alheios. Você residia em um banco escuro, no meio da neve, como teus cabelos. Hesitei-me em sentar ao teu lado, mas acabei cedendo, quando um fotógrafo pediu-me para lhe servir como modelo. Estávamos lado a lado, tão próximos, mas tão distantes. Você observava algo ao longe, sem notar minha simples presença ali. Quando o flash iluminou um pouco mais aquela manhã, os ventos nos vieram agraciar. E na dança dos flocos de neve, teus cabelos desprovidos de proteção foram ao ar, permitindo-me ver as curvas negras a se libertarem, fio por fio.

Tua quarta curva foi uma graça, quando saímos pela primeira vez após notar-me sempre buscar saber mais sobre tua figura tão misteriosa.

Fomo-nos ao café, ao lado de minha floricultura. Usavas uma camisa branca, de gola alta, quase a esconder-te os lábios. O café cheirava à infância. A parte interna era aquecida naquele dia de outono, e falávamos de poesias e discos de vinil. Suas mãos deslizavam ágeis para as xícaras grandes que nos foram servidas com chocolate quente, quase a fervura. Fora a primeira vez que arrisquei-me a elogiar-te.

– Teus olhos são encantadores.

Simplório e envergonhado, você mostrou-me mais uma curva. E delas, a mais bela: a curva do teu sorriso.

Você encantou-me com todas as suas curvas, não somente as quatro primeiras. Com o tempo, te acostumou com minha presença, e também com minhas. Acabamo-nos por amar um ao outro, não somente pelas tais.

Juntos, mesclamos nossas curvas inúmeras vezes. Contudo, me marcaste com algo muito mais intenso que as tuas curvas no olhar, dedos ou sorriso:

– Amo-te, Rin.

E recebeste de mim um beijo feliz. Um beijo grato por depositar em mim algo tão belo.

– Amo-te mais ainda, Haru.

Tuas curvasWhere stories live. Discover now