Ei, você disse que eu podia ligar | ✓

A AVENIDA

A chuva é tão forte que eles conseguem apenas deixar a pizzaria e entrar no carro. Ele se ajeita no banco do motorista, mas não gira a chave. A garota está encharcada, mas ela não liga se ficará doente no dia seguinte. Há poucas coisas com as quais ela se importa a ponto de deixá-las fazerem parte da sua mente.

- Eu odeio esse lugar - ela declara e o silêncio se desfaz.

- Por quê? - ele pergunta sabendo a resposta.

- Nós não podemos ser felizes aqui. Não importa a família, a casa, o relacionamento, o trabalho. Nós sempre estamos fadados ao vazio interior.

- Você se sente vazia, mas já fez algo para se preencher?

- Eu odeio relacionamentos.

- Você nunca tentou.

- Eu nunca te contei que tentei.

A primeira mentira. Ele sabia todos os segredos dela. Menos esse. Talvez outros mais. Ele queria descobrir.

- Ele quebrou o seu coração? - ele se sente um idiota por falar desse jeito.

- Muito. Ele destruiu o que restava em mim. Ele era tóxico. Eu estava ali por ele, lutando as minhas batalhas para conseguir ser feliz com ele. Mas ele me sugava todas as energias. - As mãos dela se embolam nas mangas longas do casaco. - Ele não era você.

- Como assim?

- Esquece - ela balança a cabeça para fugir do assunto, uma prática tão antiga que ele reconhece. - Aonde nós vamos?

- Vamos esperar a chuva passar. - Ele relaxa as mãos sobre o volante. - Não consigo dirigir com essa chuva.

- Tudo bem - ela dá de ombros. - Kean, eu sinto muito.

Ele a encara. As gotas de chuva se transformam em pequenas luzes ao redor dela. Uma pintura melancólica que o destino gostava de colocar perto dele. Uma obra que ele não compreendia completamente, mas se esforçava.

Ele não sabia se as lágrimas eram chuva ou o contrário. Ela era pura tempestade.

- Kean - ela sussurra e ele se dá conta de que está tocando o rosto dela gentilmente.

- Não sinta, Lisa. Apenas não se lamente por algo que você não tem controle.

Ela era a tempestade silenciosa. E ele estava com medo do que aconteceria.