Ele andou alguns passos. Já havia andado tanto. Sua busca ainda estava em pleno auge. Ele a viu, e tão instantaneamente percebeu que ela era como um tsunami, abalando os alicerces de suas certezas, devastando seu coração. Sentiu que aquilo era bom. Precisava se refazer, se reconstruir e só seria possível quando dentro de si, tudo de antes tivesse ido embora.
Olhou para ela fixamente, havia um toque de magia em seu sorriso. Seus olhos tinham um brilho comum, semelhante ao de estrelas em uma noite escura. Eram tão claros. Seus cabelos dourados eram arrastados pelo vento, fazendo-o sentir-se embalado neles. Não podia ser, ele estava enfeitiçado! Pobre mortal, seria arrasado pela fúria da paixão. Mas, não se importava. Ela valeria cada golpe. Os dias foram passando e ele se apaixonando cada vez mais. Um passarinho ganhando asas para tocar o infinito. Não sabia ainda, mas seu voo seria alto de mais. Logo veio o tombo, a tumba, a queda. Descobriu que ela jamais poderia ser sua, já pertencia a outro. Viu-se despedaçado, abatido, agonizando após o tiro certeiro do caçador! Entretanto, nada entre eles diminuíra, pelo contrário, aumentava cada dia mais. Estava entorpecido, e sabia que no fundo, de alguma maneira que não conhecia ao certo, ela lhe pertencia. Por algum momento, ela era dele, ao menos em sua imaginação. E isso já era o bastante. Os dias foram se substituindo, estava perto sua partida. Estava pra ir embora, mas sabia que de certo modo iria permanecer ali. Iria deixá-la, mas sabia que ela permaneceria com ele, num lugar onde ninguém jamais poderia levá-la: dentro dele mesmo. Certa noite, a viu mais uma penúltima vez e ela estava encharcada pela mesma beleza tão incomum. Seu vestido branco florido lhe dava uma aparência de bonequinha. Ele, que nunca havia brincado de boneca, queria agora guardá-la pra si. Admirou-a por longos instantes e antes que a noite pudesse dar o seu adeus, declarou-se com toda intensidade de seu coração. A sorte estava lançada, a roleta agora girava, o destino passeava entre as fichas. Ela, sentiu-se rodopiando num mar de confusões. Sua muralha de certezas, de repente, tornou-se tão incerta. Olhou para ele e viu ali, um possível ninho onde se abrigar, agora era também passarinho, fugindo das investidas da paixão. Para ela, havia tantas coisas envolvidas. Sua vida, outras vidas, outros planos. O dia declinou, fez-se anunciar. Estavam distantes, reféns de uma proximidade perturbadora. Enfim, último dia para o amor. A roleta continuava girando. Era uma questão de tempo para que surgissem os perdedores. Ele a esperou, precisava olhar nos seus olhos uma última vez, dar-lhe alguma garantia de que o que sentia era verdadeiro. Esperou. Ela, por sua vez, adiou a despedida. E, quando o coração dele se preparava para decretar a desistência da espera, ela apareceu! Ao longe, correndo, fora de si, só lhe foi permitido abraça-la e vê-la tão logo partir. Ele, que nunca fora um rapaz de sorte, aceitava agora a sorte de perdê-la. Chorou. Foi embora, querendo ficar. Ela permanecia com ele e a presença de sua ausência era o que mais lhe doía. Fechou os olhos. Adormeceu. Talvez tudo tivesse sido apenas um sonho. Talvez o novo sol lhe trouxesse nova vida. Estava perdido, mesmo sabendo bem onde deveria estar.