Vigésimo Segundo Capítulo

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Fomos o restaurante mais visitado da noite. Pelo telefone, Sr. Takafumi já marcava uma entrevista com um canal de televisão para contar sobre como foi a experiência de ser O Restaurante #1 No Coração Dos Namorados Da Cidade. Escutei Rita dizer que viu Sauron andando pelo estacionamento com uma viga de ferro, mas era só um morador de rua esperando as sobras daquela noite de trabalho duro.

Eu não voltei pra cozinha até dar onze da noite. O banheiro dos funcionários era a parte mais inútil do restaurante e mais vazia, fiquei sentada no chão dali. Até acordar com o barulho de passos indo de lá e pra cá. Todos pareciam exaustos, mas com sorrisos vitoriosos nos rostos. Os sushimans faziam brindes com molho de pimenta e até Sr. Takafumi virou alguns goles.

Não vi Isac.

E pra falar a verdade, nem o procurei. Meus olhos estavam cansados. Amber me parou quando passei tirando o avental e perguntou se eu estava bem.

– Estou sim. Apenas emocionada pelo restaurante – eu falei, forçando um sorriso.

Arrumei as minhas coisas tentando compartilhar da mesma energia contagiante quando alguém vinha pegar a mochila e dizia: ''nós conseguimos!'' ou ''Sr. Takafumi está tão feliz. ele merece tanto. nos merecemos!''

Vocês mereciam. Eu não.

Eu não falava isso. Então, apenas acenava.

Alex, Rita e Patrick estavam no estacionamento conversando animados. Algo fazia-os rir. Quando chamaram meu nome para que eu me aproximasse, apenas abanei a cabeça e coloquei a bolsa nas costas e parti de bicicleta pela rua escura.

– Ei, Rachel.

É.

                 Já se imagina quem é.
A vida pode não ser um filme ou os cupidos podem não existir, porém quando quer, a vida joga o drama e clichê pela sua boca como se você fosse um bebê engolindo remédio pela primeira vez.

– Oi, Frank. – falei me virando e esperando ele chegar até mim, correndo.

– Caramba, achei que não ia te alcançar.

Desci da bicicleta e andamos lado a lado por meia quadra, até Frank começar a tagarelar:

– Você falou pra Takafumi? Sobre, você sabe... Isac.

se ele me contar a verdade agora, eu paro com isso. me rendo

– Não. Decidi não acabar com a animação de ninguém.

– Sobre isso...

– E Clarissa? Ela se recuperou do pedido? – perguntei cortando o assunto.

– Ah, sim. Chorou por uns cinco minutos, mas sim. Ela vai fazer uma festinha agora na casa dela. Poucas pessoas. O pessoal do restaurante vai e eu ia te convidar também, mas não te achei durante o resto do expediente. Onde você estava?

Arrastei a bicicleta perto do meu corpo. Estava frio.

– Eu estava beijando Isac no vestiário. – falei sem olhá-lo.

– Quê? – Frank disse e parou de andar. Parei um pouco mais na sua frente. – Como assim, beijando Isac, você está brava com ele... Isac namora... Rachel, tá tudo bem?

Eu estava tão cansada.
                  tão alheia.
                  tão nem aí pra Frank
      que pela primeira vez, me senti bem em não ser a protagonista da vida dele.

Voltei até onde ele estava. Seu rosto foi sempre tão claro. As luzes do poste ajudavam em deixar seus olhos mais luminosos e quentes até mim.
           mas eu estava cansada pra reparar no cenário do meu roteirista.
        e falei:

– Gabe. Eu ajudei ela ir embora.

Frank não demostrou reação. Como se na sua cabeça, estivesse a vasculhar quem era Gabe e o que isso tinha relação comigo. Com nós dois. Continue a dizer:

– Há um ano, ela apareceu na porta da minha casa com o cabelo raspado e pedindo socorro para ir embora. Eu não entendi de começo, mas logo eu já estava invadindo a casa do pai dela para pegarmos dinheiro pra sua viagem. Levei ela até a rodoviária. Mesmo eu pedindo para que ela ficasse, ela não ficou. Falei pra pensar em você. Mas Gabe embarcou no ônibus mesmo assim.

Meus olhos estavam turvos. Ele devia estar me odiando, mas não parei de falar:

– Como pôde ter arriscado a segurança de Gabe, indo até a casa dela feito um lunático? E se o pai dela estivesse em casa? E se... Meu Deus, Frank! Gabe queria anonimato e nem isso você conseguiu respeitar mesmo sendo apaixonado por ela.

– Como sabe? – ele murmurou.

– Talvez eu entenda o motivo dela ter ido embora. – balancei a cabeça com raiva. – Você precisava de um namoro público. E ela só queria uma nova vida. Talvez ela tenha agora. E você tem a sua. Com Clarissa e tudo mais. Mas no fundo, eu fico me perguntando, o que te fez ficar assim? Gabe, Clarissa ou ego.

As palavras. As pessoas não são cruéis. As palavras sim.

– Você sabia esse tempo todo... – Frank estava furioso.

– Você sempre esteve procurando ela pelas as minhas costas!

– EGOÍSTA! É ISSO QUE VOCÊ É! E SE ALGO TIVER ACONTECIDO COM ELA? VOCÊ NÃO PENSOU NISSO?

– E VOCÊ PENSOU EM TAKAFUMI? VOCÊ PENSOU NO QUE VOCÊ ESTAVA FAZENDO?

– EU DURMO TODAS AS NOITES PREOCUPADO COM GABE, PORQUE EU VI ELA MACHUCADA. FUI EU QUE VI ELA JOGADA NUM SOFÁ DESCONHECIDO SEM NINGUÉM!

               PORQUE ELA É MINHA AMIGA

        EU PROTEGERIA ELA DE QUALQUER COISA

                            E EU FIZ ESSA PROMESSA A ELA. – ele gritou.

Eu ri. Não foi uma reação involuntária. Eu realmente deixei uma gargalhada alta sair.

                    mas, logo, vieram as lágrimas

– eu tentei proteger você.

– Não era eu que precisava de proteção.

A rua voltou a ficar silenciosa.                         

Frank não tinha vergonha de chorar e foi isso que fez. Na minha frente. Eu devia tê-lo abraçado. Como eu teria feito em qualquer outro dia. Mas não o fiz. Não dava pra mim.

Subi na bicicleta e fui embora.

                                            sem esperança nenhuma de me sentir bem.
                 

capítulo final: amanhã.

As Piores Tentativas ao TentarOnde histórias criam vida. Descubra agora